19 janeiro 2016

A DIALÉCTICA DAS EXPECTATIVAS GORADAS DA ECONOMIA SOVIÉTICA, A PROPÓSITO DAS EXPECTATIVAS GORADAS DO PROJECTO EUROPEU.

No quinquénio de 1966 a 1970 a economia soviética cresceu ao ritmo médio de 4,1% ao ano. No que se lhe seguiu (1971-1975), esse ritmo decresceu para os 3,2% anuais. E no segundo quinquénio dessa década (1975-1980), a economia soviética, referência económica do campo socialista, acabou por vir a progredir a uma média de crescimento situada à volta de uns medíocres 1,0% anuais. Esta crise da desaceleração do crescimento económico (em 1973, a economia mundial crescera a 6,2%) não era percebida como tal pelo cidadão comum mas era evidente para os economistas soviéticos: o período ficou a ser conhecido pela estagnação brejneviana. Apesar das proclamações dos jornais de cá, a desaceleração do ritmo de crescimento da economia soviética muito antes de ela atingir níveis em que se pudessem equiparar aos níveis registados pela potência rival norte-americana tornava-se um problema preocupante, mais ideológico até do que económico, tanto mais que se entrava pelos anos em que os maiores dirigentes soviéticos do passado (a começar por Nikita Khrushchev) haviam prometido ostensivamente que essa paridade iria ser alcançada e mesmo ultrapassada. Há 40 anos a imprensa portuguesa dominada pelo PCP embarcava acriticamente (mais uma vez...) na promoção dos artigos de propaganda soviética a respeito do milagroso ressurgimento da sua economia para recuperar esse atraso. A edição de 24 de Janeiro de 1976 do Diário de Lisboa antecipava um período de crescimento intensivo da economia soviética, concretizado em crescimentos de 5,4% do rendimento nacional, 43% da produção industrial, 7% da produção agrícola. Infelizmente, como já acontecera no passado e acrescendo à clarividência de quem já conhece a continuação da história(...), todos aqueles números não passaram de piedosas intenções para serem discursadas durante as reuniões do Soviete Supremo.
Mudando substancialmente de assunto e indo consultar a página 54 do Documento de Estratégia Orçamental (DEO) que foi elaborado em Agosto de 2011 para incorporar as previsões dos impactos que viriam a ter na economia e nas contas públicas portuguesas as medidas preconizadas pela troica, dá para perceber como, avaliando os quatro anos e meio passados e os resultados dos défices alcançados e previstos para este ano (a vermelho e laranja no quadro acima), os desvios se assemelharão no rigor ao acompanhamento de um plano quinquenal soviético típico da era Brejnev. Acresce à semelhança que, tal como outrora fizera Khrushchev em relação aos Estados Unidos, também Mário Soares, Cavaco Silva e os líderes políticos que lhes seguiram nos haviam prometido, como consequência da adesão à Europa, uma convergência progressiva com os padrões de vida dos países da União. Os últimos números do Eurostat (abaixo), envolvendo nomeadamente os três anos de aplicação do programa da troica, mostram-nos que isso está cada vez mais longe de acontecer: o PIB português em 2014 ainda foi inferior ao de 2011. Eu bem sei o quando poderá parecer desagradável estar a diagnosticar o mal sem propor soluções alternativas. Há contudo as vantagens de, apresentando o problema como aqui o faço, a) não dar por alternativas soluções que já eram caducas há 40 anos; b) notar que o problema da comunicação social, de quem, nocionalmente, se esperaria uma atitude moderna mais distanciada, permanece essencialmente o mesmo, engajado ideologicamente e afiliado às fontes de poder; e c) dar a possibilidade de chamar a atenção, pela analogia, que de não vale a pena adiar a questão política da União Europeia com tecnicidades: lá chegará o tempo em que a situação se tornará tão insustentável que os candidatos a reformadores - esses hipotéticos Gorbachevs da União Europeia - também já não chegarão a tempo de a salvar da desagregação.

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