14 fevereiro 2007

PHILIPPE LECLERC E AS FORÇAS DA FRANÇA LIVRE

Na biografia de Phillipe Leclerc (1902-1947), incorpora-se uma forma agradável das elites francesas se poderem rever no que teria sido o comportamento correcto perante as vicissitudes por que a França passou – derrota em 1940 e ocupação alemã de 1940 a 1944 – durante a Segunda Guerra Mundial. Na realidade, foram muito poucos os que fizeram como Leclerc, que se juntou à França Livre do General de Gaulle logo em Julho de 1940, mas a grande publicidade feita à volta da sua figura mítica (morreu num acidente com 45 anos), atenua a constatação da rareza do seu gesto.

Philippe Leclerc nasceu Filipe Francisco Maria de Hautecloque, filho do conde desse título, de uma nobreza que ia buscar as suas origens a cavaleiros que participaram nas cruzadas no Século XII. Saiu da Academia de Saint-Cyr como oficial de cavalaria em 1924 e, enquanto subalterno, esteve por duas vezes em Marrocos, onde havia grande actividade de operações de contra-subversão contra os rebeldes marroquinos no Atlas onde se distinguiu. No começo da Segunda Guerra Mundial, era um jovem oficial muito promissor, promovido por distinção, com o curso de Estado-Maior e que já recebera a Legião de Honra.
Em Junho de 1940 decidiu aderir à França Livre e evadiu-se, via Lisboa, para Londres. A França Livre ainda era apenas um ambicioso projecto a que Phillipe de Hautecloque aderiu. Os seus recursos praticamente não existem e é para os aumentar que uma equipa a que ele pertence parte para as colónias da África Equatorial Francesa. Assinalem-se duas novidades: fora promovido por de Gaulle a Comandant (Major) e, para proteger a família que ficara em França (a mulher e seis filhos!) adoptou o pseudónimo – que nunca mais o abandonará – de Leclerc.

A missão de que Leclerc faz parte foi bem sucedida, ganhando a adesão para a causa das administrações das colónias francesas dos Camarões, do Gabão, do Ubangui (actual República Centro Africana), do Congo e do Chade. No meio da grande guerra que se travava, todos os insignificantes feitos das pequenas unidades da França Livre, como os ataques realizados a partir do Chade às guarnições italianas no meio do deserto líbio sob o comando do agora Coronel Leclerc, foram depois desmesuradamente valorizadas pela propaganda gaullista.

O número de combatentes da França Livre era, à escala dos efectivos envolvidos, muito pequeno. Para efeitos de imagem e propaganda as suas unidades ou empolavam as suas designações em relação aos efectivos presentes (a 1ª Brigada da França Livre (BFL), em Bir Hakeim, contava 6 batalhões de infantaria, mas tinha apenas 3.700 efectivos) ou adoptaram outras designações pouco canónicas, como a Força L comandada pelo que agora havia sido promovido a General Leclerc, gesto que tornava difícil estimar a sua força – cerca de 16.000.

Gradualmente, depois dos desembarques aliados nas colónias francesas do Norte de África em Novembro de 1942, pode-se começar a reconstituir as Forças Armadas francesas a partir do núcleo de 60.000 homens das guarnições ali existentes. Recorrendo ao equipamento fornecido pelos norte-americanos ao abrigo da Lend-Lease, e aos recrutas de incorporação local (numa proporção de 1 europeu para 2 muçulmanos) as novas Forças Armadas francesas reapareceram na ordem de batalha. Havia já 100.000 soldados franceses a combater em Itália nos finais de 1943 e os seus efectivos totais foram aumentando até atingirem o milhão no fim da Guerra.
Mas já se tratava de um exército muito distinto das Forças da França Livre iniciais. A esse núcleo duro restava-lhe a consolação de constituírem as suas duas unidades de elite: a 1ª Divisão da França Livre (ex-1ª BFL), comandada pelo General Pierre Koenig (acima) e a 2ª Divisão Blindada (ex-Força L), comandada pelo General Leclerc. O momento de glória de Leclerc e da sua unidade regista-se em Agosto de 1944, com a libertação de Paris, um episódio celebrizado no livro (e filme) Paris já está a arder? de Dominique Lapierre e Larry Collins.

Mas estava a acabar a época para aqueles dois generais, uma espécie de enfants terribles do gaullismo que, por força das circunstâncias, haviam subido demasiado depressa na hierarquia (em 1945, Leclerc tinha 43 anos e Koenig 47 anos) num exército onde o corpo de oficiais acreditava no valor da antiguidade, independentemente da origem do arrivista: aristocrática como Leclerc ou plebeia como Koenig. A geração dos generais retomou as rédeas da situação, os plebeus como Alphonse Juin (de origem argelina europeia, de 57 anos) ou os aristocratas como Jean De Lattre de Tassigny (com 56 anos).
É aliás este último que se vê a representar as Forças Armadas francesas, na Cerimónia da Vitória (na fotografia acima) em Junho de 1945 em Berlim, ao lado de Eisenhower, Zhukov e Montgomery… Quanto a Leclerc de Hautecloque – depois da Guerra ficou preso ao pseudónimo que escolhera e sob o qual tanta popularidade adquirira – tendo morrido cedo, com 45 anos num acidente de aviação, fica-lhe também o mito daquilo que poderia ter feito na Indochina se lhe tivessem dado latitude política para negociar com Hô Chi Min, quando com ele se encontrou em Março de 1946...

3 comentários:

  1. por coincidênica, estive ontem a ver algumas coisas relaccionadas com Leclerc e a sua curta carreira.
    Ao que parece, desconfiou-se dos ingleses quanto às causas da sua morte.

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  2. É verdade que se desconfiou dos britânicos quanto às causas da sua morte, por causa do petróleo da Líbia. Mas a verdade é que há acidentes de avião mesmo quando há pessoas importantes a viajar neles.

    Há outros episódios como o de Phillipe Leclerc em 1947: o de Enrico Mattei (da ENI, sociedade petrolífera italiana) em 1962, o de Sá Carneiro em 1980 ou o de Samora Machel em 1986… E há os que estiveram quase a ser e não foram: Eisenhower aterrou em Casablanca em 1943 de para-quedas às costas…

    Foram todos acidentes? Foram todos atentados? A verdade é que as teses defendendo os segundos são muito mais interessantes… No caso de não o conhecer sugiro-lhe um site defendendo a tese do atentado:

    http://www.witzgilles.com/la_mort_du_general_leclerc.htm

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  3. eu achei mto legal... mas queria saber se vcs sabem os nomes dos 3 paises q a França autorizou anexar ao seu pais??

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