07 fevereiro 2007

O XII FESTIVAL RTP DA CANÇÃO

O título deste poste deve ser lido com a mesma ênfase com que se diz XII Congresso de um Partido Comunista Qualquer, porque militância revolucionária foi do que mais houve nesse hoje injustamente esquecido Festival da Canção de 1975, a começar pela apresentação, a cargo de José Nuno Martins e Maria Elisa, conforme documenta a fotografia abaixo (a Maria Elisa é a mesma que hoje apresenta os Grandes Portugueses – está um bocadinho mudada de estilo, não está? Os anos não perdoam…)
Com canções com nomes tão castiços como O Pecado Capital, Alerta!, A Boca do Lobo, Com uma arma, com uma flor ou Batalha-Povo, ainda não foi daquela vez que o dito povo participou nas escolhas das canções mas antes – num verdadeiro assomo do leninismo tão na moda na altura - uma vanguarda esclarecida da classe dos espectadores, composta pelos autores da música e letra das canções concorrentes que votaram entre si democraticamente a escolha da canção vencedora.

E tiveram bom gosto, porque escolheram uma canção, Madrugada, cantada por Duarte Mendes (na gravura (*) do início do poste), que considero a canção mais bonita de entre todas as que ganharam os festivais da canção enquanto prestei atenção ao evento. Contudo, a canção que eu pretendo evocar é uma outra, Alerta!, cantada por José Mário Branco (abaixo), com um ritmo típico de PREC, que, quem dela se lembra, com certeza já esqueceu do risco que se correu que essa mesma canção representasse Portugal no Festival da Eurovisão, porque foi neste festival que ela foi lançada…
É que Alerta! ficou em 5º Lugar e, retrospectivamente, julgo que talvez tivesse representado na Eurovisão de forma muito mais fiel, Portugal, os portugueses e o ambiente de manicómio colectivo que por cá grassava (**)… Para quem não conheça a música, aqui deixo a letra (invoca a paz mas inclui ao todo 50 pontos de exclamação(!), que aquela época não se prestava a hesitações ou a terceiras vias... – Vasco Gonçalves dixit!) Fica um pedido final: alguém pode pôr este magnífico Alerta! do José Mário Branco no YouTube?

Adenda de 4 de Julho de 2009: Cá está ele!

ALERTA! ALERTA!
ÀS ARMAS! ÀS ARMAS!
ALERTA!
PELO PÃO E PELA PAZ
E PELA NOSSA TERRA
PELA INDEPENDÊNCIA
E PELA LIBERDADE
ALERTA! ALERTA!
ÀS ARMAS! ÀS ARMAS!
ALERTA!
PELO PÃO QUE LHES ROUBA A BURGUESIA
QUE OS EXPLORA NOS CAMPOS E NAS FÁBRICAS
OPERÁRIOS, CAMPONESES HÃO-DE UM DIA
ARREBATAR O PODER À BURGUESIA
ABAIXO A EXPLORAÇÃO!
PELO PÃO DE CADA DIA!
POIS CLARO!
PELO PÃO E PELA PAZ
E PELA NOSSA TERRA
PELA INDEPENDÊNCIA
E PELA LIBERDADE
ALERTA! ALERTA!
ÀS ARMAS! ÀS ARMAS!
ALERTA!
SÓ TEREMOS A PAZ DEFINITIVA
QUANDO ACABAR A EXPLORAÇÃO CAPITALISTA
CAMARADA SOLDADO E MARINHEIRO
LUTEMOS JUNTOS PELA PAZ NO MUNDO INTEIRO
SOLDADOS AO LADO DO POVO!
PELA PAZ NUM MUNDO NOVO!
POIS CLARO!
PELO PÃO E PELA PAZ
E PELA NOSSA TERRA
PELA INDEPENDÊNCIA
E PELA LIBERDADE
ALERTA! ALERTA!
ÀS ARMAS! ÀS ARMAS!
ALERTA!
PELA TERRA QUE LHES ROUBA ESSA CANALHA
DOS MONOPÓLIOS E GRANDES PROPRIETÁRIOS
CAMPONESES, LUTAM P'LA REFORMA AGRÁRIA
P'RA DAR A TERRA ÀQUELES QUE A TRABALHAM
REFORMA AGRÁRIA FAREMOS!
A TERRA A QUEM A TRABALHA!
POIS CLARO!
PELO PÃO E PELA PAZ
E PELA NOSSA TERRA
PELA INDEPENDÊNCIA
E PELA LIBERDADE
ALERTA! ALERTA!
ÀS ARMAS! ÀS ARMAS!
ALERTA!
PELA INDEPENDÊNCIA NACIONAL
CONTRA O DOMÍNIO DAS GRANDES POTÊNCIAS
FORA O IMPERIALISMO INTERNACIONAL
QUE TEM NAS MÃOS METADE DE PORTUGAL
ABAIXO O IMPERIALISMO!
INDEPENDÊNCIA NACIONAL!
POIS CLARO!
PELO PÃO E PELA PAZ
E PELA NOSSA TERRA
PELA INDEPENDÊNCIA
E PELA LIBERDADE
ALERTA! ALERTA!
ÀS ARMAS! ÀS ARMAS!
ALERTA!
NÃO HÁ POVO QUE TENHA LIBERDADE
ENQUANTO HOUVER NA SUA TERRA EXPLORAÇÃO
LIBERDADE NÃO SE DÁ SÓ SE CONQUISTA
NÃO HÁ REFORMA BURGUESA QUE RESISTA
DEMOCRACIA POPULAR!
E DITADURA PROLETÁRIA!
POIS CLARO!
PELO PÃO E PELA PAZ
E PELA NOSSA TERRA
PELA INDEPENDÊNCIA
E PELA LIBERDADE
ALERTA! ALERTA!
ÀS ARMAS! ÀS ARMAS!
ALERTA!
(*) As fotografias são todas a preto e branco para não haver cedências à superficialidade da estética burguesa...
(**) E ficar igualmente num daqueles três lugares do fim, como de costume...

6 comentários:

  1. É engraçado ver como os extremos se tocam!
    “Alerta” contém reminiscências fascistas: o hino da MP também tinha o mesmo grito...
    Coincidências que a História proporciona!

    E consegui escrever isto com (apenas) três pontos de exclamação – três!

    ResponderEliminar
  2. Absolutamente fantástico! Só não me lembrava que esta canção tinha concorrido ao FESTIVAL!! Essa mnifestação totalmente burguesa, conquistada pelo proletariado e pela vanguarda unitária POVO/MFA!

    ResponderEliminar
  3. Estes admiráveis alertadores são portadores da matriz dos verdadeiramente GRANDES Portugueses.
    Foi pena que os rapazes não tenham podido levar por diante tão belos
    desígnios, como o enternecedor sonho do humanista Otelo que, em 25 de Dezembro, viu abortar (que palavra horrorosa) o seu projecto de uma sociedade socialista à sua maneira, à sua imagem, saída por encomenda daquela poética cabecinha.
    Malandros do Eanes e Jaime Neves!!
    Sentinela alerta! Alerta está!

    ResponderEliminar
  4. 25 de Novembro, claro !
    Embora tão piedosas intenções do amorável Otelo evoquem no nosso espírito toda a fraternidade natalícia...

    ResponderEliminar
  5. Como não te lembravas do Alerta do José Mário Branco no festival, Sofia?
    ;)
    E concordo absolutamente contigo, A. Teixeira, a canção vencedora é na verdade, uma das mais bonitas dos festivais portugueses. Gosto muito de Madrugada :)
    Ah! E adorava ver Alerta no Youtube ;)

    Beijinhos :)

    ResponderEliminar
  6. Esqueci-me no poste de adicionar alguns esclarecimentos da ficha técnica do Alerta!

    INTÉRPRETE: JOSÉ MÁRIO BRANCO E CORO (neste ano, fruto do fim da discriminação e da exploração do homem pelo homem, a malta do coro tinha direito a ser considerada intérprete)

    MÚSICA: JOSÉ MÁRIO BRANCO

    LETRA: GRUPO DE ACÇÃO CULTURAL - VOZES NA LUTA (nesta época tudo lutava, até as vozes, até um espirro era uma denúncia contra o conformismo burguês)

    ORQUESTRAÇÃO: LUÍS PEDRO

    DIRECÇÃO DE ORQUESTRA: LUÍS PEDRO (Luís Pedro não estava lá para dirigir a orquestra, isso era fascismo, era mais um camarada que dava orientações sobre a melhor forma dos músicos lidarem com os instrumentos)

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.