16 fevereiro 2007

QUE NÃO SABIA NADA DE FINANÇAS…


Não lhe dei destaque na altura devida, mas impressionou-me pela imaginação e por uma outra causa o título de há uns dias onde se anunciava que A Cocaína Apreendida em 2006 dá para meio aeroporto da Ota. Não sei quem se terá lembrado de fazer assim a equivalência entre as apreensões de cocaína durante um ano, apreçada pelo valor ao consumidor final, com as estimativas de construção de um aeroporto.

Possivelmente, a ideia poderá ter saído de dentro da própria Polícia Judiciária, note-se a coincidência da redacção da notícia em dois órgãos tão insuspeitos de sinergias como O Sol e a SIC. Onde parece haver sinergias negativas é na incapacidade de qualquer dos dois órgãos em se aperceberem do erro grosseiro contido no título em termos de lógica económica, onde se comparam e confundem valores de uma natureza muito diferente.

Sem querer ser muito específico, creio que é fácil compreender a diferença entre o valor de cotação e o valor de transacção de um bem. O da cocaína, naquela notícia, é de uma cotação de preço ao público estimada pela PJ. Onde não existe qualquer rigor. Aliás, se toda aquela cocaína tivesse sido realmente transaccionada, o excesso de cocaína à disposição dos clientes teria feito baixar-lhe a cotação e, consequentemente, o valor de realização total da mercadoria apreendida seria muito inferior…

Se o valor dado pela PJ à cocaína se mostrava sobrestimado para poder pagar metade do aeroporto da Ota, a notícia da capa do Público de hoje aborda um caso inverso em que, pelo contrário, o preço de cotação estava obviamente subestimado: Sonaecom sobe o preço da OPA para cativar accionistas da PT. Ou seja, depois de uma conferência de imprensa tentando convencer a opinião pública do contrário, Belmiro de Azevedo acaba por ter de dar o braço a torcer.
Hoje é um dos raros dias em que o Público se assume claramente como o jornal do seu dono, tentando transformar em grande feito de armas – Paulo de Azevedo tem até direito a destaque especial a subir nos Sobe e Desce da última página… - aquilo que, de há muito, já se havia tornado óbvio: a cotação atribuída pela Sonae às acções da PT era um verdadeiro disparate, incapaz de motivar os seus detentores a vendê-las!

Resulta daqui que nos fica uma enorme suspeita que os editores responsáveis por todos estes títulos galhardos que aparecem na imprensa sejam tal qual o Jesus Cristo do poema* de Fernando Pessoa, que não percebia nada de finanças nem consta que tivesse biblioteca… Mas Jesus Cristo era de um outro ramo, e portanto convinha que os editores, não sabendo, arranjassem alguém que soubesse e a quem pudessem perguntar…

* Liberdade, de Fernando Pessoa que termina:

O mais do que isto
É Jesus Cristo
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca…

1 comentário:

  1. Ó pá!
    Parece a conjugação (no presente!) daquele verbo que começa assim:
    Eu barão, tu barão... e ele que se lixe!

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