22 março 2006

CORRESPONDENTES

As intervenções dos correspondentes nos programas de informação sempre foi importante, tanto mais que, quando ele é bom, o espectador tende a associar a imagem e o discurso do correspondente ao país onde está destacado.

É sempre um desafio para o próprio perder a imagem de marca do país de origem quando muda de colocação e é um desafio para o seu sucessor ficar com ela para si. Às vezes, essa imagem nascia até de pontos fracos do correspondente: Vasco Lourinho, que foi correspondente em Madrid, falava o português nas suas crónicas com toda a musicalidade e a entoação do castelhano madrileno.

É de dar todo o crédito a Carlos Fino, correspondente em Moscovo anos a fio, que se tenha conseguido desgrudar da imagem do chapéu de peles e do bafo gelado de uma substancial parte das suas crónicas enviadas da União Soviética.

É um paradoxo que a sua imagem de marca actual não seja culpa sua: é de um José Rodrigues dos Santos interrompendo desastradamente o convidado em estúdio para lançar avisos em tom angustiante: “Carlos Fino! Carlos Fino! Sirenes em Bagdad! Sirenes em Bagdad!” – e o bom do Carlos Fino sem nada para dizer, a não ser o óbvio: que se ouviam sirenes em Bagdad…

É também um dos aspectos em que a concorrência entre estações de TV poderia ter estimulado a competição mas onde os resultados são confusamente mistos. Assim, por exemplo, nos Estados Unidos a vantagem vai inteirinha para Luís Costa Ribas da SIC, havia uma vantagem RTP nítida em Espanha (Cesário Borga) que se perdeu, empates de alta qualidade na Rússia (José Milhazes e Evgueni Mouravitch) e de menos alta em Bruxelas (António Esteves Martins e Fernando de Sousa) e nem sei se António Mateus chega a ter concorrência ao seu (bom) trabalho na África do Sul.

Mas é sobre José Milhazes (na imagem) que pretendo falar, porque conseguiu apagar a imagem da Rússia de Carlos Fino, envergando aquela barba e aquele aspecto de monge de mosteiro ortodoxo russo e mais a capacidade de pronunciar Yeltsin como só ele o sabe fazer – Mouravitch evidentemente fá-lo, mas é um local.

Ontem, Milhazes esteve em estúdio, na SIC Notícias, para analisar as eleições na Bielorússia com Mário Crespo. Tirando a galgada deste último, que confundiu a Rússia Branca (Bielorússia) com os russos brancos (monárquicos) da guerra civil de 1917-21, o programa mostrou um correspondente profundamente conhecedor da realidade política, económica e social do que reporta, mais do que um correspondente, um verdadeiro analista.

Só não sei para onde poderá ser destacado depois da Rússia. Talvez Luanda – José Milhazes faz lembrar, vagamente, Pepetela.

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