03 julho 2017

VELHO DO RESTELO

Antes que se comecem a ouvir os elogios fúnebres, quantos vezes repletos de hipocrisia, tal o feitio controverso do defunto, permitam-me o lamento de não ver Medina Carreira chegar até ao próximo ano, para ainda assistirmos em conjunto ao colapso do estado social que ele aqui vaticinava em Abril de 2012. Claro que o estado social ainda pode colapsar sem ele, mas a sua ausência tornará o colapso menos colapsante. Ou então, não colapsante, que a verdade é que uma apreciável percentagem dos seus vaticínios distinguiram-se mais por ser bombásticos do que por se virem a confirmar, valeu sempre a falta de memória do auditório. Ser-se Velho do Restelo é uma ocupação antiga e honrada em Portugal; tanto que já Luís de Camões lhe dedicou o seu espaço em Os Lusíadas. Foram mais de 400 anos para descobrir para que servia o pessimismo assertivo: para dar audiências a canais de televisão por cabo.

6 comentários:

  1. Medina Carreira não se dedicou a fazer previsões. Nem se limitou a exprimir desejos mal disfarçados. Com o seu suposto rigor e o seu aparente sentido da realidade, bem embrulhados num ar de avôzinho indignado mas benévolo, o que sempre procurou foi abrir caminho a um projecto político-económico que, esse sim, visava destruir o estado social. Se Passos queria ir para além da troika, Medina queria ir para além de Passos. A morte chega a todos, não só aos funcionários públicos, aos desempregados, aos pobres. É a justiça divina, mesmo que sem Deus. Demos graças.

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  2. "O ESTADO SOCIAL COLAPSA DAQUI A SEIS ANOS"

    «Medina Carreira não se dedicou a fazer previsões.»

    É um comentário que não faz qualquer sentido.

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    1. O que eu quis dizer com a frase retórica inicial compreende-se à luz do resto do comentário. As previsões de Medina Carreira não eram baseadas em análises rigorosas, nem contemplavam múltiplos cenários macro-económicos e políticos. Não eram, portanto, autenticamente, previsões. Eram exercícios de hipocrisia e coacção ideológica. O Avô dos Portugueses profetizava a hecatombe nacional, atribuída ao despesismo estatal (e, para ele, o despesismo era representado em grande medida pelo funcionalismo público e pelo Estado Social...), para nos fazer engolir o remédio das "reformas estruturais" neoliberais.

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    2. Não, não se compreende. A retórica pode ser enfática mas não pode ser falsa. A sua frase inicial é falsa. E o que se lhe segue é um crasso julgamento de intenção.

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  3. Quanto à questão retórica, tomemos o seguinte: "Não sou bonito. Sou deslumbrante." A segunda frase só serve para exponenciar o sentido da primeira, não para o infirmar, apesar do que uma leitura literal assumiria. Mutatis mutandis...
    Quanto à questão terminológica (previsão vs. medinacarreirice): http://www.prof2000.pt/users/praxis/praxiologica/textosapoio/11ano/conh_centifico.htm
    O seu fiel leitor,
    RF

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    1. Forçar a razão fá-lo dar um pontapé na gramática. O seu exemplo contém um erro gramatical. Para a ideia que pretende transmitir deveria ter escrito: "Não sou bonito, sou deslumbrante."

      Agradeço a fidelidade da sua leitura, RF, mas, neste caso, a antipatia comum por Medina Carreira corresponderá a uma irremediável divergência para as razões dessa antipatia.

      Aceitaria uma boa parte das intenções que atribui a Medina Carreira no também já falecido António Borges, mas nunca ao primeiro, por razões que não vale a pena aqui desenvolver.

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