
Mas o que parece tornar este assunto mais interessante é o padrão com que os cristãos se distribuem regionalmente, onde há aspectos que se poderão vir a tornar-se importantes numa evolução futura do subcontinente. Sinteticamente, pode dizer-se que há duas grandes regiões na Índia onde os cristãos são significativamente minoritários: ao Sul, junto à costa do Malabar – a região dos cristãos velhos – e no Nordeste – a dos cristãos novos.
Costuma atribuir-se a Vasco da Gama uma versão (provavelmente apócrifa) sintetizada do programa de acção da sua expedição: haviam ali chegado em busca de cristãos e pimenta… Conforme nos era ensinado, se de pimenta a encontrara aos montes, dos cristãos nada se dizia, até Afonso de Albuquerque converter manu militari os locais depois da conquista de Goa. A omissão é grave. Vasco da Gama encontrou pimenta e também cristãos (como os retratados abaixo)…

Um dos problemas que essas igrejas orientais sempre mostraram foi a falta de unidade hierárquica e doutrinária resultando numa propensão para a fácil cisão em várias denominações. A chegada dos portugueses à Índia no Século XVI, acompanhados da muito mais estruturada igreja católica apostólica romana serviu para absorver algumas das correntes existentes na obediência ao Vaticano, mas também serviu de estopim para novas cisões.
Actualmente há, pelo menos, sete denominações distintas de igrejas indianas que se reclamam da herança original de São Tomé – para além dos católicos romanos propriamente ditos… – que se tornam difíceis de distinguir entre si, assim como se torna quase impossível avaliar de uma forma autónoma qual poderá ter sido o impacto no aumento do número de fiéis resultante da evangelização desencadeada pelos missionários portugueses depois da sua chegada à Índia.

Num outro extremo do país, está a ocorrer um fenómeno curioso, envolvendo também o cristianismo, nos pequenos estados do nordeste da Índia. São estados minúsculos (o maior deles tem um pouco mais de 3 milhões de habitantes), para mais quando se tem em conta a escala demográfica da Índia, mas as populações destas regiões acidentadas não tem quaisquer laços de parentesco culturais ou étnicos com as populações indianas das planícies fluviais adjacentes (ver abaixo, guerreiros nagas).
Nem com as dos outros grandes estados vizinhos, decerto, como os chineses e os birmaneses. Esquecida, a região só se tornou importante quando foi teatro de operações para a defesa da Índia da invasão japonesa durante a Segunda Guerra Mundial (1942-45). Mas parece ter sido só depois da independência da Índia e do Paquistão (1947) que as populações locais se deram conta da importância do factor religioso como forma de afirmar uma identidade distinta*.

Contudo, no censo de 2001, cerca de 45% (um pouco mais de 5 milhões) da população total dos seis pequenos estados fronteiriços daquela região do Nordeste da Índia** (contando quase 12 milhões de habitantes) confessava-se cristã, e em três desses estados os cristãos chegavam mesmo a representar maiorias muito significativas: eles constituíam 90% da população em Nagaland (sobretudo baptistas), 87% em Mizoram (sobretudo presbiterianos) e 70% em Meghalaya...
Muito menos conhecido que o problema de Caxemira (onde os muçulmanos estão em maioria) e do que o do Pundjabe indiano (onde a maioria é sikh), dois estados problemáticos porque estão localizados junto à fronteira da Índia com o Paquistão, o problema da fronteira nordeste da Índia e das suas populações cristãs, é de igual importância, dada a relevância estratégica da sua localização, corroborada pelos acontecimentos do passado recente da Segunda Guerra Mundial.

* Como aconteceu com Timor-Leste, cuja população se tornou quase universalmente católica depois da saída dos portugueses e depois da ocupação indonésia…
** Arunachal Pradesh, Manipur, Meghalaya, Mizoram, Nagaland e Tripura. O mapa inclui também o estado de Assam, muito mais povoado mas completamente distinto dos demais e que acompanha a planície sedimentar do rio Bramaputra.
Nota: O mapa inicial do poste foi traçado usando os resultados do censo indiano de 1981, onde os resultados das preferências religiosas são ligeiramente diferentes dos obtidos em 2001 que são usados no texto.
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