4 de Março de 1980. Tendo tomado posse há cerca de dois meses, o governo da AD, o primeiro governo assumidamente de direita do regime democrático, confrontava-se num verdadeiro braço de ferro político com a esquerda, nomeadamente com os comunistas, que accionaram o seu braço sindical da CGTP para fomentar uma greve simultânea dos transportes públicos urbanos, e assim dar uma demonstração da sua capacidade para conseguir parar o país - em especial a área metropolitana da grande Lisboa. Escalpelizando os detalhes da situação, percebe-se que até poderia ter havido razões de índole verdadeiramente laboral para que os trabalhadores da Rodoviária Nacional recorressem à greve, assim como para que os maquinistas da CP fizessem o mesmo, mas, como se podia ouvir no noticiário da RTP desse dia, os restantes trabalhadores da CP, os da Carris, da Transtejo ou do Metro haviam aderido à paralisação por «solidariedade». A ideia era mesmo a de tentar bloquear os sítios nevrálgicos, para que tudo o resto ficasse bloqueado. Os jornais simpatizantes da causa desse dia, como o Diário de Lisboa acima, não eram propriamente um primor de objectividade. A maior ironia era o assunto aparecer numa página dedicada (supostamente...) ao trabalho, quando as greves eram descaradamente políticas! Do lado governamental, também os jornais mais à direita, como O Dia, A Tarde ou O Diabo, se puseram a desenvolver disparatadas teses conspiratórias, envolvendo conselheiros da revolução, o que provocou uma reacção irritada da presidência, no dia seguinte. Quanto às consequências concretas e visto à distância de quarenta anos, os portugueses desenrascaram-se como puderam, e o episódio terá tido um impacto mais político do que social, com as suas repercussões muito constrictas à capital. O PCP terá ficado agradado com os resultados e voltou a empregar o processo mais algumas vezes, chamando-lhes Greve Geral, mas as greves nunca foram realmente gerais - ao contrário do que aconteceu na Polónia comunista, quando foi paralisada pelo Solidariedade; Portugal era uma verdadeira Democracia e os governos sempre tinham legitimidade democrática, coisa que os comunistas nunca compreenderam (ou, pelo menos, não o compreenderam até 1989...).
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