09 abril 2018

O PRINCÍPIO DA SOBERANIA POPULAR ou O POVO SÓ DEVE SER SOBERANO QUANDO VOTA COMO «NÓS GOSTAMOS»?

Como eu aqui antecipei, se há poucos a pronunciarem-se sobre os terríveis danos causados ao organismo humano pelo estrôncio-90, quase todos se julgam com direito de mandar palpites sobre a política húngara, nem que seja para manifestar a sua antipatia por Viktor Orbán e pelos caminhos que a Hungria tem singrado. Associo-me àqueles, poucos, que cingem as suas opiniões a um desagrado resignado pelos resultados das eleições de ontem - onde se registou uma terceira vitória (vitória no sentido verdadeiro...) do Fidesz que recolheu mais de 48% dos votos. Ou seja, se nós não gostamos do Fidesz e de Orbán, há uma maioria de húngaros que gosta, já que, depois de os elegerem em 2010, os têm reconduzido depois disso em 2014 e agora em 2018. A não ser que se coloque a dúvida se essas eleições que se têm desenrolado na Hungria não tenham sido razoavelmente livres. É verdade que a Hungria teve a sua conta de farçoladas à laia de eleições, aqueles anos felizes em que János Kádár e os seus comunistas eram reconduzidos com 99% dos votos. Contudo, tenho a confiança que, houvesse ali qualquer vaga suspeita sobre a recuperação dessa mesma prática de viciação, e a União Europeia - onde não se gosta, visivelmente, de Orbán - interviria, sancionando e ostracizando o país. O que não tem acontecido. Não o fazendo, só me resta aceitar que a popularidade de Viktor Orbán é legitima, assim como a é a de Isaltino Morais, o presidente aqui do concelho de Oeiras, apesar da estadia deste último na famosa pousada da Carregueira. Vale a pena recordar que - por ordem alfabética e histórica - o comunismo, o fascismo e o nazismo nunca se conseguiram posteriormente legitimar através de eleições livres. Também, se calhar nem o tentaram com um mínimo de seriedade: havia eventos em que os regimes eram aprovados por 99% dos eleitores, resultados tão unânimes quanto inverosímeis e ridículos. O que está a acontecer nos países da Europa de Leste, a Hungria, mas também na Áustria, na Polónia ou ainda na República Checa, por muito que haja quem queira forçar a analogia com os fascismos de entre guerras (curiosamente, há muito menos alusões aos comunismos do pós guerra), são populismos que exibem uma legitimidade popular completamente diferente, em que os seus mandatos renovados regularmente (de quatro em quatro anos na Hungria), conformes as regras da Democracia parlamentar. O que se tem observado para aí, na análise das eleições húngaras é rancor por mau perder, mas isso é atitude que, para conferir seriedade à política, seria melhor guardar para o futebol e para as avaliações das arbitragens do dia seguinte. Vale a pena recordar o que Lincoln disse no discurso de Gettysburg: que a Democracia era o governo do povo, pelo povo e para o povo. E se o povo - neste caso o húngaro - prefere Órban, deve-se tentar perceber porquê, não criticar indiscriminada e não muito inteligentemente eleitores e/ou eleitos, só porque o resultado nos desagrada.

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