(Republicação)
Existem vários livros e filmes contando os dias quentes do Outono de 1962 em que, por causa da colocação dos mísseis soviéticos em Cuba, Kennedy e Khrushchev (os dois Ks), os Estados Unidos e a União Soviética estiveram à beira de uma Guerra Mundial que provavelmente degeneraria num conflito nuclear. Em contraste, quase ninguém terá ouvido falar do Tenente-Coronel Stanislav Petrov, um oficial do Ramo da Defesa Aérea soviética (ПВО) que evitou que aquelas mesmas duas superpotências se tivessem envolvido acidentalmente num outro conflito nuclear em 26 de Setembro de 1983…
Este outro Outono quente de 1983 começara a aquecer a 1 de Setembro em consequência do episódio em que interceptores soviéticos haviam abatido um Boeing 747 da companhia aérea sul-coreana que, vindo dos Estados Unidos para a Coreia, se desviara da rota, o que causou a morte das 269 pessoas que seguiam a bordo (23% eram norte-americanas). É fácil imaginar quais as consequências que este acontecimento provocou nas relações – sempre tensas! – entre os dois países e a tensão acrescida que ainda pairaria no ar na noite de 25 para 26 de Setembro de 1983, quando o tenente-coronel Petrov entrou de serviço.
Costuma ser assim: muitas vezes, os acontecimentos importantes são condicionados por pormenores irrelevantes: Petrov não devia ali estar, mas fora convocado à última da hora para substituir um camarada que adoecera. As suas funções, enquanto estava de turno, eram vigiar uma panóplia de ecrãs mostrando imagens em directo (via satélite) das regiões do Midwest dos Estados Unidos onde estavam localizados os silos com os mísseis transportando as armas nucleares do inimigo e reportar mal acontecesse alguma anomalia: o tempo que medeia entre a descolagem e o impacto no destino ronda os 12 minutos!
Meia hora depois da meia-noite, aquilo que se imagina que os profissionais do ramo mais devem temer aconteceu mesmo: um aviso luminoso vermelho a piscar conjugado com um ensurdecedor sinal sonoro! O computador acabara de o informar que, de acordo com as informações disponíveis, nos Estados Unidos tinham acabado de lançar um ICBM¹. Ainda Petrov, tão assustado quanto intrigado (parecia haver algo de errado nas imagens que lhe chegavam via satélite), avaliava a situação e já dois, três, quatro, cinco avisos disparavam por sua vez, correspondentes à saída de outros tantos ICBMs.
O que estava a faltar na colecção de sinais dos outros monitores diante de Petrov eram as imagens térmicas que assinalariam a combustão dos mísseis recém-lançados… Ou seja, os outros indicadores à sua disposição estavam a mostrar que nada acontecera... Por outro lado, os segundos continuavam a passar e os americanos não haviam lançado mais nenhum ICBM para além dos cinco assinalados, o que contrariava todos os preceitos que haviam ensinado a Petrov no caso de haver um primeiro ataque nuclear: o atacante iria empregar todos os meios que pudesse, antes que eles fossem sujeitos a retaliação.
Se os Estados Unidos tinham centenas de mísseis, porque iriam começar uma Guerra lançando apenas cinco? – perguntou-se. Numa sociedade que em nada encorajava a tomada de decisões e num regime famoso por executar quem as tomava erradas, há algo de milagroso na decisão rápida do Tenente-Coronel Stanislav Petrov, considerando que o incidente não passava de um falso alarme do sistema de alerta nuclear soviético. As dúvidas tiraram-se dez minutos depois e, mais do que os imaginar, é possível ver uma réplica de como eles poderão decorrido, a partir da cena abaixo, retirada do filme WarGames...
Trata-se de uma coincidência mas, nesse mesmo Outono de 1983 estava a ser lançado o filme WarGames onde o enredo gira precisamente à volta dos problemas de um sistema de alerta nuclear norte-americano... Como é tradicional nos filmes de Hollywood, o filme acaba bem. A carreira do tenente-coronel Petrov é que nem por isso: veio a aposentar-se prematuramente. E o Outono de 1983 manteve-se quente até ao fim, até à realização dos exercícios Able Archer 83 pela NATO, que simulavam precisamente um engajamento nuclear, e se desenrolaram perante membros do Pacto de Varsóvia de sobrolho franzido.
¹ Acrónimo em inglês para Míssil Balístico InterContinental.
Este outro Outono quente de 1983 começara a aquecer a 1 de Setembro em consequência do episódio em que interceptores soviéticos haviam abatido um Boeing 747 da companhia aérea sul-coreana que, vindo dos Estados Unidos para a Coreia, se desviara da rota, o que causou a morte das 269 pessoas que seguiam a bordo (23% eram norte-americanas). É fácil imaginar quais as consequências que este acontecimento provocou nas relações – sempre tensas! – entre os dois países e a tensão acrescida que ainda pairaria no ar na noite de 25 para 26 de Setembro de 1983, quando o tenente-coronel Petrov entrou de serviço.
Costuma ser assim: muitas vezes, os acontecimentos importantes são condicionados por pormenores irrelevantes: Petrov não devia ali estar, mas fora convocado à última da hora para substituir um camarada que adoecera. As suas funções, enquanto estava de turno, eram vigiar uma panóplia de ecrãs mostrando imagens em directo (via satélite) das regiões do Midwest dos Estados Unidos onde estavam localizados os silos com os mísseis transportando as armas nucleares do inimigo e reportar mal acontecesse alguma anomalia: o tempo que medeia entre a descolagem e o impacto no destino ronda os 12 minutos!
Meia hora depois da meia-noite, aquilo que se imagina que os profissionais do ramo mais devem temer aconteceu mesmo: um aviso luminoso vermelho a piscar conjugado com um ensurdecedor sinal sonoro! O computador acabara de o informar que, de acordo com as informações disponíveis, nos Estados Unidos tinham acabado de lançar um ICBM¹. Ainda Petrov, tão assustado quanto intrigado (parecia haver algo de errado nas imagens que lhe chegavam via satélite), avaliava a situação e já dois, três, quatro, cinco avisos disparavam por sua vez, correspondentes à saída de outros tantos ICBMs.
O que estava a faltar na colecção de sinais dos outros monitores diante de Petrov eram as imagens térmicas que assinalariam a combustão dos mísseis recém-lançados… Ou seja, os outros indicadores à sua disposição estavam a mostrar que nada acontecera... Por outro lado, os segundos continuavam a passar e os americanos não haviam lançado mais nenhum ICBM para além dos cinco assinalados, o que contrariava todos os preceitos que haviam ensinado a Petrov no caso de haver um primeiro ataque nuclear: o atacante iria empregar todos os meios que pudesse, antes que eles fossem sujeitos a retaliação.
Se os Estados Unidos tinham centenas de mísseis, porque iriam começar uma Guerra lançando apenas cinco? – perguntou-se. Numa sociedade que em nada encorajava a tomada de decisões e num regime famoso por executar quem as tomava erradas, há algo de milagroso na decisão rápida do Tenente-Coronel Stanislav Petrov, considerando que o incidente não passava de um falso alarme do sistema de alerta nuclear soviético. As dúvidas tiraram-se dez minutos depois e, mais do que os imaginar, é possível ver uma réplica de como eles poderão decorrido, a partir da cena abaixo, retirada do filme WarGames...
¹ Acrónimo em inglês para Míssil Balístico InterContinental.
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