16 maio 2008

DA SINCERIDADE (E DO RIGOR…) DE CERTAS ANÁLISES

Esta semana, houve um debate na SIC Noticias com a presença de Manuel Villaverde Cabral, José Manuel Barata Feio, José Medeiros Ferreira e José Adelino Maltez* a propósito dos acontecimentos de França em Maio de 1968. Houve nele um daqueles momentos que considero emblemáticos, que clarificam por si só uma impressão que tinha sobre alguém, que sentia mas que, de alguma forma, tinha dificuldade em explicar. A impressão era difusamente desagradável e quanto ao alguém trata-se de José Medeiros Ferreira.
Nesse debate, e referindo-se a um episódio das vicissitudes de Maio de 68 em que teriam participado Pierre Mendès France (acima) e a François Mitterrand (abaixo), Medeiros Ferreira qualificava-os em termos elogiosos num estilo aproximado ao de duas respeitáveis figuras da esquerda francesa quando um dos outros presentes (já não me lembro qual) lhe observou que, pelo que dele hoje sabemos, o qualificativo de respeitável (ou um outro equivalente que tenha sido usado) dificilmente se poderá aplicar a François Mitterrand…
Embaraçado, José Medeiros Ferreira engrolou uma justificação de como havia sido o pudor ou a boa educação que o havia levado a não fazer distinções entre as reputações dos dois nomeados... Ora aí está, no mínimo, uma opinião tão significativa quanto discutível: é que à má educação de realçar, naquele contexto, a indiscutível má reputação actual de Miterrand contrapõe-se a indelicadeza e a injustiça de equiparar em respeitabilidade Mendès France com alguém cujo percurso se tornou hoje num verdadeiro embaraço para a esquerda francesa…
Conseguindo perceber que um político no activo possa ter umas relações tensas com a verdade, ponderada com as conveniências, tenho muito mais dificuldades em compreender as razões de quem, como é o caso de José Medeiros Ferreira que se reclama afastado da política activa, num mero programa evocativo de um acontecimento com 40 anos, confessa assim tranquilamente malbaratar adjectivos elogiosos em quem ele próprio reconhece não os merecer. Que efeitos pensará ele que aquela descarada falta de sinceridade produzirá em quem ouve as suas análises?
Seria nota de rodapé, mas vale o esclarecimento que o episódio referido por Medeiros Ferreira se tratou da reunião da União Nacional dos Estudantes de França, que teve lugar em 27 de Maio, no Estádio Charléty, nos arredores de Paris. É dessa reunião que se extraiu a fotografia acima, onde aparecem Pierre Mendès France e Michel Rocard. Ironicamente, ao preparar este poste vim a descobrir que até como memorialista Medeiros Ferreira se equivocara: a respeitável figura de François Mitterrand nunca esteve em Charléty...

* Um particular agradecimento ao JRD, um leitor atento, pela correcção a uma crença minha, que estava errada (ver caixa de comentários).
* E outro particular agradecimento ao Dissidente-x, outro leitor atento, que são os leitores atentos que dão valia aos blogues.

3 comentários:

  1. Também assisti ao debate e diverti-me com aqueles soixante-huitard,ou não, como José Adelino Maltês *, que chegou a referir o passado Cavaquista e Sá Carneirista dos interlocutores.
    Até o Barata Feyo que zurziu nos malefícios dos ex-maoístas, fazendo uma extrapolação para o Barroso e afirmou que "aquilo" não teve nada a ver com "política".
    Foi um festival de "punhaladas", com um sorriso permanente nos lábios, que faria empalidecer o Dany (ex-)le rouge.

    * Tratou-se de José Adelino Maltez e não de José Manuel Pureza.

    bfs

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  2. Por acaso vinha cá dizer o mesmo, isto é, que mesmo sem ter visto o programa quase que apostaria que quem tinha feito o tal reparo mencionado no post teria sido J. Adelino Maltez.

    Quanto ao Sr M. Ferreira é apenas o zero e a ligeireza de um nenúfar do regime.

    Dissidente-x

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  3. Quando quis aqui descrever aquela pantominice de Medeiros Ferreira, tinha dúvidas sobre quem fora o quarto membro que participara no programa e, por isso escrevi originalmente "e (creio) José Manuel Pureza". Afinal a minha crença estava errada...

    Quando segui o debate com a atenção dividida, prestei atenção a umas intervenções mas não a outras, parecia-me haver ali um certo ambiente de tertúlia mas daquelas "à Baptista-Bastos", com nomes que apenas os iniciados conhecem - quem é que hoje sabe quem é "o" Sauvageot?... E mesmo Mendès France?...

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