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Mais uma vez, os acontecimentos recentes que ali têm ocorrido relembram isso, mas o propósito deste poste é o de contar uma pequena história de uma pequena comunidade de refugiados (ínfima pelos padrões indianos: 300 a 500 mil pessoas…) que, como acontecia com os palestinianos, não têm nacionalidade. Mas, para contar a sua história, é preciso regressar a 1947 e às vicissitudes que acompanharam a divisão da Índia britânica entre a Índia e o Paquistão.
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Mais do que isso, quase metade de toda população muçulmana da Índia colonial estava espalhada por detrás das novas fronteiras do novo Estado indiano de maioria hindu. De igual forma, havia importantes minorias não muçulmanas no novo Paquistão. Os anos de 1947 e 1948 assistiram a um fluxo de milhões de deslocados que se cruzavam num sentido e noutro porque haviam ficado do lado errado da fronteira. Entre os que fizeram essa viagem contavam-se os biharis que se mudaram para o Paquistão Oriental.
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O Paquistão Oriental pode ser considerada uma outra aberração da Partição de 1947, resultado da aplicação do critério religioso à construção de fronteiras numa região (Bengala) onde a identidade cultural a desaconselharia. Ficou a existir um Bengala Oriental (muçulmana) ao lado de uma província indiana de Bengala Ocidental (hindu, com a cidade capital: Calcutá), compartilhando a mesma língua e cultura bengali, reputada mundialmente desde a atribuição do Prémio Nobel da Literatura em 1913 a Rabindranath Tagore.
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Com a independência do Paquistão Oriental, rebaptizado Bangladesh, em 1971, os biharis – na altura estimados em cerca de um milhão – foram escorraçados pelo novo poder político e começou o seu calvário de refugiados apátridas que perdura até hoje: já se havia passado uma geração (24 anos) desde que os mais velhos haviam abandonado a Índia – embora expulsos do Bangladesh, esta já não os considerava seus nacionais. O Bangladesh, por sua vez, considerava-os nacionais paquistaneses…
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Proporcionalmente, no subcontinente indiano, estes 300 a 500 mil refugiados apátridas de origem bihari e cultura urdu são uma mera gota de água no oceano populacional dos quase 1.500 milhões de habitantes que ele contém. Mas nada os consegue substituir no simbolismo que representam de filhos rejeitados de um projecto nacional que, mais de 60 anos depois de ter sido ambicionado, concretizado e proclamado, continua a não ter a segurança de haver protagonistas vivos que expliquem claramente o que ele é…
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