As políticas externas das potências nunca foram coerentes. Quem se dedicar a buscar contradições entre os seus discursos e as suas práticas, ou a descobrir inconsequências nos argumentos que as suas chancelarias invocam a propósito de cada crise internacional tem tarefa semelhante à de contar grãos de areia numa praia…Mas há potências que são simultaneamente países com uma opinião pública que funciona…
São limitações provocadas pela sua existência que, por exemplo, mantiveram por mais de 30 anos uma enorme contradição entre o discurso e a prática dos países ocidentais quanto ao regime da África do Sul. Nalguns casos, ou certas atitudes são insustentáveis, ou não se pode abusar das incoerências, ou não se pode encadear com demasiada proximidade temporal inflexões radicais nos princípios invocados previamente...
Este preâmbulo justifica-se por causa daquilo que está a acontecer no Kosovo. A vitória dos independentistas nas eleições de Sábado passado e a sua anunciada intenção de proclamarem a independência do Kosovo já no próximo dia 10 de Dezembro arrisca-se a pulverizar toda a teia argumentativa que teve de ser tecida pelas diplomacias naquela região ao longo de mais de dez anos com a intenção de a poder pacificar.
Há que recordar que, no princípio, quando os maus eram os sérvios (que, sendo maus, não eram os únicos maus…) que queriam redesenhar as fronteiras de acordo com a residência das populações, englobando os sérvios que viviam em regiões doutras antigas repúblicas jugoslavas, nomeadamente na Bósnia, as potências acabaram por estabelecer a regra que não se podiam alterar essas fronteiras internas da Federação Jugoslava.
Por isso, se bem se recordam, nos Acordos que encerraram os tempos mais tenebrosos pós- cisão da Jugoslávia, não se falava em autodeterminação dos povos, nem em referendos para que as populações decidissem o seu futuro, como costuma ser a doutrina oficial da ONU nestas ocasiões... Não dava jeito que se aplicasse aos Balcãs: há milhões de sérvios fora das fronteiras da Sérvia que se mostravam desejosos de nela se integrarem…
Com a independência do Montenegro da Sérvia em 2006 a regra da transformação das fronteiras internas da antiga Jugoslávia em fronteiras internacionais foi levada à categoria de axioma: todas as antigas repúblicas federadas da antiga Jugoslávia tornaram-se independentes segundo as fronteiras que possuíam em 1992, independentemente das minorias étnicas que existissem dentro dessas fronteiras.
E é precisamente essa regra de ouro que os albaneses do Kosovo pretendem agora quebrar ao proclamarem a independência, porque o Kosovo era parte da Sérvia jugoslava… Se isso acontece, mudam as regras, passam a valer as nacionalidades, e também os sérvios podem invocar várias regiões adjacentes (nomeadamente na Bósnia) onde as populações locais não se sentem satisfeitas no país a que agora pertencem…
A verdade é que, mudando a metáfora das teias para a da carpintaria, a maioria das soluções dos Balcãs estão presas por arames… Por muito antipática que tenha sido descrita no passado a sua causa, a anuência dos sérvios a jogarem segundo as regras do jogo impostas pela comunidade internacional (as potências das bandeiras lá de cima...) parece não lhes ter propiciado um tratamento justo. E as injustiças sempre foram fenómenos que geraram simpatias nas opiniões públicas…
São limitações provocadas pela sua existência que, por exemplo, mantiveram por mais de 30 anos uma enorme contradição entre o discurso e a prática dos países ocidentais quanto ao regime da África do Sul. Nalguns casos, ou certas atitudes são insustentáveis, ou não se pode abusar das incoerências, ou não se pode encadear com demasiada proximidade temporal inflexões radicais nos princípios invocados previamente...
Este preâmbulo justifica-se por causa daquilo que está a acontecer no Kosovo. A vitória dos independentistas nas eleições de Sábado passado e a sua anunciada intenção de proclamarem a independência do Kosovo já no próximo dia 10 de Dezembro arrisca-se a pulverizar toda a teia argumentativa que teve de ser tecida pelas diplomacias naquela região ao longo de mais de dez anos com a intenção de a poder pacificar.
Há que recordar que, no princípio, quando os maus eram os sérvios (que, sendo maus, não eram os únicos maus…) que queriam redesenhar as fronteiras de acordo com a residência das populações, englobando os sérvios que viviam em regiões doutras antigas repúblicas jugoslavas, nomeadamente na Bósnia, as potências acabaram por estabelecer a regra que não se podiam alterar essas fronteiras internas da Federação Jugoslava.
Por isso, se bem se recordam, nos Acordos que encerraram os tempos mais tenebrosos pós- cisão da Jugoslávia, não se falava em autodeterminação dos povos, nem em referendos para que as populações decidissem o seu futuro, como costuma ser a doutrina oficial da ONU nestas ocasiões... Não dava jeito que se aplicasse aos Balcãs: há milhões de sérvios fora das fronteiras da Sérvia que se mostravam desejosos de nela se integrarem…
Com a independência do Montenegro da Sérvia em 2006 a regra da transformação das fronteiras internas da antiga Jugoslávia em fronteiras internacionais foi levada à categoria de axioma: todas as antigas repúblicas federadas da antiga Jugoslávia tornaram-se independentes segundo as fronteiras que possuíam em 1992, independentemente das minorias étnicas que existissem dentro dessas fronteiras.
E é precisamente essa regra de ouro que os albaneses do Kosovo pretendem agora quebrar ao proclamarem a independência, porque o Kosovo era parte da Sérvia jugoslava… Se isso acontece, mudam as regras, passam a valer as nacionalidades, e também os sérvios podem invocar várias regiões adjacentes (nomeadamente na Bósnia) onde as populações locais não se sentem satisfeitas no país a que agora pertencem…
A verdade é que, mudando a metáfora das teias para a da carpintaria, a maioria das soluções dos Balcãs estão presas por arames… Por muito antipática que tenha sido descrita no passado a sua causa, a anuência dos sérvios a jogarem segundo as regras do jogo impostas pela comunidade internacional (as potências das bandeiras lá de cima...) parece não lhes ter propiciado um tratamento justo. E as injustiças sempre foram fenómenos que geraram simpatias nas opiniões públicas…
Sem dúvida: prepara-se um erro colossal com a anunciada independência do Kosovo. Será a vitória da "grande Albânia" e mais uma humilhação para a Sérvia. Como a história tão bem no-o recorda, as humilhações em demasia de um povo não costumam dar bom resultado. E se agora os macedónios, que também têm albaneses no território, quiserem agora proclamar a Grande Macedónia?
ResponderEliminarEstimado Historiador,
ResponderEliminarSobre a questão do Kosovo,dada a sua complexidade, não tenho, nem pretendo ter, opinião formada.
O que me aborrece, é que haja tantos estados na UE, que têm uma opinião mais que formada, direi mesmo, formatada, para a sua independência.
O problema, é que esses estados, sobre Gibraltar, Tanger, Maldivas,Catalunha, País Basco,Irlanda do Norte,Corsega, não têm,ou não manifestam, opinião.
Um abraço com estima
Mesquita Alves
(enviado para herdeirodeaecio@hotmail.com)
Sigamos com atenção a situação.
ResponderEliminarMas parece cada vez mais difícil que todas aquelas bandeiras reunidas na designação comunidade internacional consigam possuir a superioridade moral (e não apenas militar) para conciliar as expectativas de um lado (albanês)com os desapontamentos do outro (sérvio).