Entre várias narrativas dos antecedentes que conduziram ao conflito, mesmo em Histórias da Guerra Civil de Espanha que se mostram globalmente mais simpáticas para com o lado republicano (Hugh Thomas ou Antony Beevor), há uma opinião coincidente em atribuir uma boa parte das culpas ao regime republicano por ter escolhido defrontar-se desnecessariamente com a Igreja Católica espanhola, quando esta poderia não vir a constituir uma ameaça séria para o novo regime. Não justifica a conduta posterior da instituição, mas é uma opinião que aqui deixo porque raramente se vê expressa.

Mas, em Julho de 1936, ao começar a Guerra Civil, a Igreja espanhola sentia-se de tal forma cercada que se transferiu quase em bloco (a excepção mais notória foi o clero basco e algum catalão) para o lado dos nacionalistas. E aí permaneceu. São conhecidas as concepções do Arcebispo de Toledo sobre a guerra que se travava em Espanha: uma luta entre a Espanha e a anti-Espanha, a religião e o ateísmo, a civilização cristã e a barbárie. A Igreja espanhola foi uma das vencedoras de 1 de Abril de 1939.

Ora, revendo momentos em que ela ali esteve, e a propósito da recente beatificação dos 498 religiosos espanhóis executados por ocasião da Guerra Civil, eu até posso compreender a intenção do Vaticano, na linha de uma inflexão que o papa Bento XVI queira causar na forma como a Igreja está a ser conduzida, abandonando ecumenismos e discursos para o exterior, e concentrando-se na mensagem aos verdadeiros fieis, qual verdadeiro laager**. Está no seu direito e é capaz de ter razão, que o modelo experimentado desde o Vaticano II*** parece não ter tido grandes resultados…

Mas esses soberanos temporais sempre podem dizer, em abono dessas faltas de honestidade, que a política tem razões que a moral desconhece… Agora, aqueles que são quase exclusivamente soberanos espirituais têm de se lembrar que, mesmo não sendo seguidos, podem continuar a ser respeitados fora do seu rebanho pelo seu discurso e pela sua conduta, e que esse respeito não sai nada reforçado com demonstrações de incoerência que podem passar por cinismo…
* Dados de Hugh Thomas.
** Círculo de carros de bois, com que os colonos europeus enfrentavam as ameaças. A palavra é de origem africânder.
*** Concílio Vaticano II.
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