As histórias de Banda Desenhada de
Blake & Mortimer podem ser vistas como a versão adulta das aventuras de
Tintin. O seu criador
Edgar Pierre Jacobs, belga e nascido em Bruxelas como
Hergé, o criador de
Tintin, e que fora cantor de ópera (!) até aos 36 anos, vira-se forçado pelas circunstâncias da vida, a arranjar outra ocupação por causa da Segunda Guerra Mundial (1940) e acabou por se virar para a ilustração.

Entre os seus primeiros trabalhos contaram-se os de terminar as histórias de
Flash Gordon que estavam a ser publicadas nos suplementos jornais belgas, depois dos envios dos originais terem sido suspensos devido à entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial (a Bélgica, ocupada pelos alemães, estava do
outro lado). Durante esses anos, Jacobs também foi assistente de Hergé.

Mas o carisma adquirido pelas suas aventuras de
Blake & Mortimer (como se vê acima), aparecidas logo a seguir ao fim da Guerra, em 1946, parece ser consequência de as mesmas serem dirigidas a um público mais crescido e mais sofisticado do que aquele a quem eram tradicionalmente dirigidas as produções de
BD da época. Uma das
imagens de marca das aventuras dos dois heróis é o
rigor das especulações científicas.

Só essa reputação justificaria a presença de
Blake & Mortimer na capa de uma revista de divulgação científica séria como a
Science & Vie (acima)… Confesso que, sendo
A Marca Amarela (1953) considerada como a aventura mais emblemática do autor (como se percebe pelas duas fotografias acima), o meu favoritismo aponta para a história inaugural da dupla
O Segredo do Espadão, publicada em dois álbuns a partir de 1946.
Ao contrário das carreiras tradicionais dos autores, onde as obras se sucedem num crescendo até uma obra épica, na de Edgar P. Jacobs sucede precisamente o contrário, a aventura inicial é a mais épica de todas, onde a história é uma reencenação descarada da Guerra Mundial que acabara de terminar, com os alemães substituídos por um império amarelo, cuja capital se situa em Lhassa no Tibete.

Nesta Terceira Guerra Mundial,
os amarelos* acabam por conquistar todo o Mundo, transformando a ocupação que Jacobs vivera em Bruxelas num fenómeno mundial. Há a resistência, de que
Blake & Mortimer são dois dos expoentes maiores e também há o colaboracionismo, de que o Coronel Olrik (um europeu de origem indeterminada ao serviço dos amarelos**) é um dos fantasmas…

No fim, tudo acaba em bem, com a prodigiosa prestação do
Espadão, a espantosa máquina concebida pelo professor Mortimer para a
redenção da humanidade. Nunca mais Jacobs poria os seus dois heróis a realizarem feitos tão grandiosos! Mas também há que não esquecer que a última imagem da aventura é a dos dois heróis a falar de reconstrução tendo como fundo uma Londres devastada pelas bombas…
* As manifestações de racismo e de correcção política em 1946 ainda tinham muito que progredir…
** Destinado a ser o vilão de serviço em quase todas as aventuras futuras.
Hesito entre o Espadão e O Mistério das Sete Pirâmides como os meus favoritos. A Marca Amarela parece colher grandes simpatias da maioria dos leitores da dupla.
ResponderEliminarSó queria fazer um reparo: há uma menção aos alemães, no início da trilogia do Espadão, na altura da apocalíptica devastação provocada pelos amarelos (penso agora se não será uma reminiscência das hordas mongóis): uma das primeiras cidades a ser destruída é Berlim, "apesar da furiosa oposição da Luftwaffe".
De livro aberto, vejo que as primeiras cidades nomeadas são Moscovo, Calcutá e Hankeu, depois é Varsóvia, onde são mencionados os “combates encarniçados da heróica aviação polaca”, depois (noutro quadro) é a vez de Roma e num terceiro (e último quadro) é a vez de Berlim ("que se tornou novamente num montão de ruínas fumegantes apesar da furiosa oposição da Luftwaffe", como cita) e Paris ("apesar do reforço da linha Maginot…"). Por fim, é a vez de Londres.
ResponderEliminarEnganei-me, e entre as causas para isso conta-se o facto de Berlim ser das últimas (e não das primeiras) cidades a ser nomeada como destruída nos comunicados da BBC que acompanham a progressão dos mísseis dos amarelos – além da evidente imprudência de abusar da memória… É um privilégio tê-lo como leitor atento, João Pedro! E, se não se importa, vou retirar a nota de rodapé.