Carlos Arias Navarro (1908-89) foi o último presidente de conselho do franquismo, e um bom exemplo da progressiva decadência do regime espanhol naquela sua fase terminal. Carlos Arias foi nomeado para o cargo na sequência de um atentado da ETA em 20 de Dezembro de 1973, que vitimou o seu antecessor no cargo e que fora o homem de confiança de sempre do Generalíssimo Francisco Franco, o Almirante Carrero Blanco.

Foi nesse ambiente de desânimo que um dos ministros do executivo, Arias Navarro (abaixo), foi indigitado, com as opiniões em surdina a atribuírem a sua nomeação às opiniões de D. Cármen, a esposa de Franco, porque o funcionamento dos mais altos circuitos de poder em Espanha tendia cada vez mais a funcionar de uma forma parecida com a das antigas cortes monárquicas quando o monarca em funções se tornava cada vez mais senil...

Em menos de seis meses, os ultras do regime espanhol (coloquial e colectivamente designados por el búnker) tinham forçado o afastamento dos dois ministros de perfil mais liberal do executivo de Arias e o presidente do conselho havia tirado o tapete ao Chefe de Estado-Maior espanhol, General Diez Alegria, quando este encetou uns tímidos contactos de abertura, com o seu conhecimento e concordância prévia, por ocasião de uma visita à Roménia. Tendo tido a vantagem de poder observar o que acontecera a Marcelo, nem isso o motivou a agir...

Revendo essas cenas do passado, enquadrando-as com o artigo sobre a mentira como virtude política, publicado ontem no Público e assinado por António Barreto (um excelente artigo!), há que reconhecer que, sendo as mentiras uma prática política de sempre, parece que episódios como aquele de Arias Navarro são raros e cada vez nos tornamos mais cínicos porque se torna cada vez mais difícil ajuizarmos quando os protagonistas da actividade estão a ser sinceros, tal a sua sofisticação interpretativa.

Lembrei-me do soluço genuíno de Carlos Arias e das outras coisas que são trabalhadas para parecer genuínas porque, no tal artigo do Público, tendo-se lembrado das mentiras virtuosas do actual e de outros ex-primeiros-ministros, António Barreto parece ter-se esquecido deste. E estes erros de casting, só por serem erros de casting, não merecem tal esquecimento...
* O discurso tornou-se um clássico espanhol, aqui parodiado.
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