31 dezembro 2011

QUEM MAS FAZ, PAGA-MAS ou A NOVA REPÚBLICA DE SALÒ

Em Abril de 2009 popularizou-se um vídeo de uma das cerimónias de uma Cimeira da NATO onde Sílvio Berlusconi, imerso numa conversa telefónica, dava uma banhada à anfitriã, Angela Merkel. Como acontece com os fait-divers que acompanham a actuação pública de figuraços (como é o caso também de Alberto João Jardim), tratava-se de apenas mais um incidente que apenas incomodaria alguém que tivesse uma reputação a defender, o que não era propriamente o caso. Mas, para a historieta ter um remate moral, há que ler a notícia do Wall Street Journal de ontem, onde se relata um telefonema feito pela chancelerina alemã ao presidente italiano alegadamente em prol da remoção de Berlusconi do cargo de primeiro-ministro para a sua posterior substituição por Mário Monti.
Não deixará de ter o seu significado que, no meio de tanta liberdade de imprensa de que gozamos na Europa, estes furos jornalísticos comecem por despontar à superfície mas do outro lado do Atlântico… Assim como não será surpreendente constatar que, quaisquer analogias que se venham a fazer, a partir deste embaraçoso episódio, entre esta Itália tecnocrática dirigida por Monti e a República de Salò (bandeira acima: regime fascista fantoche sob tutela alemã que vigorou no Norte de Itália entre 1943 e 1945), não terá também qualquer grande amplificação mediática – imagine-se lá porquê?! A notícia, já oficialmente desmentida, a ser verdadeira, é grave, e não nos descansa quanto à intromissão dos alemães – ao jeito do regime de Vichy – nas próximas eleições presidenciais francesas de 2012…

30 dezembro 2011

«IMITATION OF LIFE»


Embora esteja longe de a contar entre as melhores músicas dos R.E.M., considero que há algo de hipnótico neste vídeo-clip de Imitation of Life (2001), composto basicamente por uma cena com convidados de uma festa num jardim que tem a duração de uns meros 20 segundos. Para contar a história que acompanha a música, o vídeo tanto avança quanto recua esse período de tempo, enquanto se vai focando em sucessivos aspectos particulares do que entretanto aconteceu na festa, alguns dos quais nem nos teremos apercebido inicialmente. Uma metáfora do quanto as situações podem ser muito mais complexas do que aparentam.

29 dezembro 2011

…OUTRAS POLÍTICAS, QUAIS?

Na fotografia acima, os moscovitas atravessam a então Praça Sverdlov indiferentes ao enorme cartaz que ali fora mandado afixar pelo PCUS onde se apela à poupança e contenção económica. Como parece estar a acontecer actualmente com a economia portuguesa durante este último decénio, também a economia soviética de então (1981) parecia progredir com taxas de crescimento muito baixas¹, que estavam muito aquém das justas aspirações dos trabalhadores soviéticos.

O problema nunca mais se resolveu e o desfecho é-nos conhecido (a propósito, alguém me sabe identificar as flores que enfeitam o cano da arma na fotografia abaixo? É para as justapor, como flores da liberdade de Agosto, aos Cravos de Abril…). Recordando isto e quando ouvimos os comunistas portugueses a clamar por outras políticas, para além da nossa concordância genérica com tal proposta, importa que nos esclareçam mais concretamente a que outras políticas é que se estão a referir…
¹ Nesse decénio, que veio a ser conhecido como a Era da Estagnação, não se dispõem de dados fiáveis sobre os valores reais do crescimento económico da União Soviética (muito provavelmente abaixo dos 2%/ano) porque, numa manifestação de superioridade do socialismo científico, os valores oficiais eram sempre muito superiores à realidade…

28 dezembro 2011

REFLEXÕES COM O DESEMBRULHAR DAS PRENDAS

Depois de desembrulhar as prendas deste ano, ocorreu-me quanto, como acontecia outrora com os brinquedos, considero imprescindível manter com os livros uma relação lúdica. Outrora, misturava-se a inveja com o desdém para com os autores daqueles preciosismos do modelismo cujas obras-primas praticamente destruíam as possibilidades de se chegar a brincar com as miniaturas (abaixo). Eram eles que dominavam (e dominam) a opinião publicada no que respeita ao mundo dos brinquedos em miniatura. Dei por mim concluindo que se passa algo de muito semelhante – embora o excesso seja em sentido diametralmente inverso – entre aqueles que aparecem publicamente como os dominadores da opinião no mundo dos livros.
Como as aventuras em que os brinquedos em miniatura poderiam participar, também o mundo editorial pode ser vastíssimo, quase infinito. Todavia, parece-me haver um desequilíbrio absurdo entre a forma como se divulgam os livros que são obras de ficção e aqueles que o não são. Por exemplo, aceita-se que se escreva um encómio sobre um romance a respeito da Guerra Civil de Espanha (abaixo), mas sem que se sinta a mínima necessidade de adicionar sugestões de leitura sobre a História desse mesmo conflito. Inversamente, é prática comum que, nos casos raros em que a crítica incida sobre uma obra de não ficção, sejam adicionadas sugestões de leitura de obras de ficção daquela época… Parece assim que só a ficção proporcionará o prazer da leitura...
Na realidade, sabe-se que a maioria dos leitores de um romance do género não conhecerão à partida o período histórico com detalhe suficiente para apreciar na sua plenitude o desenrolar da história imaginada pelo autor da obra de ficção. Nos antípodas do que acontecia com a rigidez excessiva dos maiorais do modelismo, aqui no caso dos livros abusa-se vezes demais da permissividade e, para não o insultar na sua ignorância, convida-se o leitor dessas obras mais exigentes a, à portuguesa, acompanhar a história tirando umas pelas outras. Descrito de um outro modo, se os modelistas não nos deixavam, às crianças, fantasiar, os críticos literários parecem não querer que nós, os leitores, façamos outra coisa senão isso…

27 dezembro 2011

«FAILBLOG»

Penso estar a captar correctamente o espírito dos postes que são publicados no FailBlog quando aqui insiro uma das notícias que encontrei há pouco no PT Jornal (acima, clicar para ampliar). Relata um ataque cibernético que expôs as informações de alguns cartões de crédito de utilizadores portugueses que estavam depositadas num site de estratégia (a azul). O assunto permanece controverso. Mas nada haveria ali de anómalo não fosse precisamente a Unicre (a vermelho), a empresa responsável pela emissão de cartões de crédito em Portugal e a quem a notícia não virá decididamente mesmo nada a calhar, a principal patrocinadora da página onde ela aparece publicada…

26 dezembro 2011

O MAPA DA CRISE

Este mapa da futura crise do Euro é, pelas omissões que contém, um excelente exemplo do carácter selectivo e orientado de como o problema das dívidas dos países da zona Euro se tem vindo a desenvolver. Nele, entre as menores economias da zona Euro, a luxemburguesa não é avaliada – está lá um buraco negro no lugar do país – e as maltesa e cipriota – ambas ilhas do Mediterrâneo – nem sequer aparecem no mapa – ficaram esquecidas!

Houvesse objectividade nos critérios que desencadearam a crise e Malta (com um deficit esperado de 3,5% para este ano) e sobretudo Chipre (onde ele ultrapassará os 6%) já teriam objecto da atenção dos mercados, das agências de rating e das parangonas da informação.

Felizmente para eles, a sua pequenez (Malta tem 420 mil habitantes e Chipre 800 mil) protegê-los-á dos holofotes da atenção mundial, ao contrário do que acontece com a Grécia, a Irlanda, Portugal ou a Itália. E, não tivesse ele cavado aquele descomunal poço financeiro, por esta vez, Alberto João Jardim e a Madeira teriam vantagens objectivas em ser um país independente…

«BLACK HOLE SUN»

Está-se sempre a tempo de constatar quanto o que parece pode não ser. Esta canção tão pouco natalícia adquire por estes dias cá por casa uma ressonância de Natal.

25 dezembro 2011

O DÓI-DÓI

Parece-me apropriado e oportuno evocar o Dói-Dói em tarde de dia de Natal, dia de memórias de infância por excelência. O Dói-Dói era o cão da fotografia acima, com a cabeça a lembrar um tamanco holandês, que conseguia falar sem abrir a boca, cujo expoente da expressividade era colocar os braços (curtos) por debaixo das orelhas (compridas) e que era a estrela de um programa de televisão dos Sábados aí de 1964/65 intitulado (salvo erro) Passatempo das Cinco.

O KETCHUP ou AS NATUREZAS QUE JÁ VIRAM MELHORES DIAS

Todos nos lembramos daqueles quadros das naturezas mortas, onde o denominador comum a tudo o aparece retratado, por muito diverso que seja, é a sua condição de inanimado. Mesmo aqueles pintores que transportam o tema das naturezas mortas para os territórios das naturezas matadas (acima), são inequívocos quando evidenciam o aspecto defunto do que outrora esteve vivo. Esta fotografia abaixo porém, de autor que infelizmente desconheço, é interessantemente ambígua. O tema central – a garrafa de ketchup pousada numa mesa de esplanada – é indiscutivelmente uma natureza morta. A dúvida aparece na classificação a dar ao senhor de bigodes e ar enfiado que aparece do lado direito. Falho de o classificar de natureza morta – ainda respira – ou mesmo moribunda, considerando o seu aspecto e o grau de conservação tradicional das embalagens de ketchup nos cafés públicos, acredito que se pode afirmar com segurança que esta fotografia é uma natureza que-já-viu-melhores-dias.

24 dezembro 2011

O COMBATE INFORMATIVO E A INFORMAÇÃO DE COMBATE

Cada vez que faço uma leitura ocasional aos blogues cujos temas tratados costumam evoluir à mercê daquilo que vem sendo publicado na informação – uma outra forma mais maliciosa de os descrever será referir-me aos blogues que assentaram praça… – lembro-me de como a lógica daquilo que chega aos cabeçalhos da informação não é – nem é para ser… – a mesma lógica daquilo que será o mais importante que saibamos. Para usar exemplos ainda na agenda mediática, ficou-se a saber que o recente anúncio da morte de Kim Jong-Il afinal fora adiado por dois dias ou, que eu saiba e até agora, ainda não houve nenhum jornalista que conseguisse furar o bloqueio que ainda encobre as manobras de bastidores, explicando com conhecimento de causa como se promoveu a substituição (rápida e discreta) em Itália de um primeiro-ministro político (Berlusconi) por um tecnocrata (Monti) que nem sequer é parlamentar…
Porém, poucos exemplos se compararão em embaraço e vergonha para a classe jornalística (de um país onde ela se têm a si própria como muito dinâmica), ao caso da Ofensiva do Somme que teve lugar durante a Primeira Guerra Mundial, quando ela se iniciou a 1 de Julho de 1916, há mais de 95 anos atrás. Tratou-se do dia mais sangrento de toda a História do Exército britânico, que sofreu ali mais de 57.000 baixas entre as quais mais de 19.000 mortos. Os resultados tácticos nem de longe nem de perto podem justificar a carnificina. Porém, se lermos uma edição dos dias seguintes (3 de Julho) de um típico jornal britânico (acima, The Daily Mirror) podemos ler (em destaque) que o primeiro dia (da ofensiva) fora muito satisfatório e que as baixas dos Aliados haviam sido ligeiras… Dá que pensar que seja com matéria-prima dessa (ou semelhante) que muitas vezes se travam os combates – esses verbais – de blogues!

23 dezembro 2011

O CARTÃO A MAIS

A cena bizarra ocorreu anteontem durante um jogo entre as equipas holandesas do Ajax e do Az 67 Alkmaar, disputado no estádio do primeiro. Houve em espectador mais arrebatado que entrou intespestivamente em campo e tentou agredir o guarda-redes da equipa visitante. O visado não só conseguiu evitar a agressão como passou ao contra-ataque ainda antes que os elementos da segurança do estádio conseguissem apanhar – e proteger – o intruso.


Para reforçar o insólito da situação e cumprindo escrupulosamente o regulamento, o árbitro resolveu expulsar o guarda-redes que fora atacado. Em resposta (e retaliação), o treinador do Az decidiu retirar a sua equipa de campo, considerando não haver condições de segurança, deixando com isso o árbitro a apitar para o boneco. Pode ser entendido como um aviso à navegação a Passos Coelho: o exercício desmesurado da autoridade pode expô-la ao ridículo...

22 dezembro 2011

AO CIMO DA ESCADARIA

O pretexto próximo para a inserção da fotografia acima foi o falecimento recente do Querido Líder norte-coreano, e o objectivo é recordar como nos bons velhos tempos também outros países socialistas podiam produzir líderes assim tão queridos como Kim Jong Il. O líder que aparece parcialmente escondido ao cimo da escadaria, mau grado as dimensões orwellianas do retrato, é o soviético Leonid Brejnev, identificável por causa do peito ornado de medalhas. A fotografia é da autoria do russo Igor Palmin e foi tirada em Tashkent, capital do Uzbequistão, quando fazia parte da União Soviética. Uma ternura, não é?

21 dezembro 2011

A ESPECIFICIDADE HÚNGARA

Entretanto, longe dos holofotes mediáticos, a questão do plano de auxílio financeiro que foi solicitado pela Hungria em Novembro passado prossegue, cheio de vicissitudes – no passado dia 16, as delegações do FMI e da EU suspenderam as negociações. O exemplo húngaro – as finanças públicas entraram em derrapagem mas a Hungria não pertence à zona Euro – tem passado desapercebido porque não interessará a nenhuma das partes usá-lo no grande debate político que se trava na União. De resto, os húngaros sempre apreciaram considerar-se um caso à parte dos vários casos peculiares da Europa central.
Existe uma história de um suposto diálogo entre um diplomata húngaro e um seu homólogo norte-americano contado por Galeazzo Ciano (abaixo), o perspicaz ministro dos negócios estrangeiros de Itália durante os anos iniciais da Segunda Guerra Mundial, que nos diz muito sobre essas peculiaridades. Estava-se nos finais de Dezembro de 1941 (cumprem-se agora 70 anos) e, no encadeamento de Pearl Harbour, a Alemanha tomara a iniciativa de declarar guerra aos Estados Unidos, arrastando atrás de si as declarações dos seus aliados europeus, onde se contava a Hungria – a 13 de Dezembro de 1941.

Naqueles poucos dias de transição até à ruptura efectiva, um membro do departamento de Estado que fora colocado em Itália e agora iria ser repatriado, ignorante dos detalhes políticos do continente como todos os norte-americanos têm a reputação de ser, tentava perceber numa conversa com o encarregado de negócios húngaro qual fora a lógica diplomática que levara a Hungria àquele gesto:

- A Hungria é uma República?
- Não, é uma monarquia.
- Com um Rei?...
- Não, com um Almirante.
- Que comanda a vossa frota?
- Não temos frota. O nosso país já não tem saída para o Mar.
- Então vocês têm reclamações territoriais.
- Claro!
- Contra a América?
- Não.
- Contra a Inglaterra?
- Não.
- Então contra a Rússia?
- Também não.
- Então contra quem?
- Sobretudo contra a Roménia.
- Então vão declarar guerra também a Roménia!
- Não, que esses são nossos aliados…

OS PODRES DO REINO


O eurodeputado britânico Nigel Farage tem este estilo de intervenção parlamentar onde com demasiada frequência a grosseria ultrapassa a frontalidade. Mas, para além da etiqueta parlamentar, o que mais impressiona no vídeo acima nem foi o discurso e a descrição da situação política europeia que é ali feita por Farage – com a qual tendo a concordar no essencial. Foi a atitude evasiva, envergonhada mesmo, como ele foi escutado pelos responsáveis da União ali presentes no hemiciclo. Van Rompuy (Presidente do Conselho), Durão Barroso (Presidente da Comissão) ou Olli Rehn (Comissário das Finanças) que, noutras ocasiões noutras circunstâncias, adoram dizer coisas, a uma só voz enfiaram o nariz em baixo e assobiaram para o lado durante a diatribe de Farage. Parafraseando Hamlet, há algo de podre neste reino da Europa quando um tal discurso radical eivado de alguma demagogia parece conseguir alçar-se assim tão facilmente a uma tal superioridade moral sobre tantos responsáveis de topo da União…

20 dezembro 2011

LEITURA ATENTA

Esta é uma fotografia que pertence ao passado mas a um passado intemporal. A sua autora é francesa – Janine Nièpce (1921-2007) – o que dará um significado próprio à toillete modesta da leitora que lê atentamente o livro. O casaquinho e a boina de malha que ela enverga, ao abrigo das tendências da moda, serão o limiar mínimo da elegância sóbria na sociedade francesa onde se costuma estar particularmente atento a esses pormenores. O ambiente que a cerca parece ser o de uma biblioteca pública, coerente com a deduzida falta de meios da leitora. E a forma como segura o livro, agarrado e não pousado na mesa ao contrário dos outros, transmite-nos a ideia que o lê por devoção, não por obrigação. Não sei se será uma imagem comum de encontrar na actualidade…

UMA PRENDA PESSOAL OU UMA PRENDA SOCIAL?

Já aqui me referira elogiosamente a Gregório, um herói de banda desenhada da autoria do holandês Jan Kruis, daqueles que aprendemos a gostar cada vez mais com a idade… É o caso da pequena história acima (clicar em cima da imagem para a aumentar) que suponho perfeitamente oportuna para esta quadra de troca de prendas. A história acaba por deixar por responder a questão se todos saberemos atribuir o valor intrínseco àquilo que oferecemos e àquilo que nos oferecem.

19 dezembro 2011

A VELA À JANELA E O GENERAL DITATORIALMENTE REVOLUCIONÁRIO

Está a aproximar-se a quadra em que, há 30 anos, o Papa João Paulo II veio pedir aos fiéis católicos que acendessem uma vela para a colocarem à janela. O seu apelo era feito mais como polaco do que como pontífice. Também a ampla resposta que recebeu pelo Mundo fora, no quadro da Guerra-Fria então ao rubro, terá transcendido muito os seus seguidores católicos. Todas aquelas velas destinar-se-iam a assinalar a imposição da Lei Marcial na Polónia em 13 de Dezembro de 1981 – um acontecimento que não vi muito evocado na panóplia das efemérides recentes. Não era a primeira – nem seria a última... – das contradições colossais em que o socialismo real do Leste se espalhava e em que o comunismo idílico do Ocidente se via em palpos de aranha para conseguir explicar os factos… aos camaradas. É verdade que já houvera outros episódios anteriores (por exemplo, em Berlim Leste em 1953) onde, como na Polónia de 1981, os regimes ditos dos trabalhadores perseguiam os trabalhadores propriamente ditos e as estruturas sindicais (acima, o Solidariedade). Todavia, o protagonista do regime que então impunha a Lei Marcial à Polónia abalava mais outro mito da propaganda comunista: se nesta os soldados e as baixas patentes podiam ser revolucionários (como no Portugal do PREC), a regra era que os generais eram sempre reaccionários (e o exemplo clássico daquela época era Pinochet). Com a figura de Wojciech Jaruzelski (abaixo), os comunistas precisavam aplicar-se no mais apurado contorcionismo revolucionário para explicar aquela nova figura de um general que repressão política… mas por bons motivos.

OS CAMPEÕES NACIONAIS DO «BILAS»

Admitamos, num passado hipotético, que num daqueles bairros plácidos dos arredores de Lisboa, com aquela configuração tradicional que lhes deu a arquitectura do Estado Novo, se podia ter desenvolvido entre a rapaziada do bairro um gosto entusiasmado pelo jogo do berlinde. E o entusiasmo cresceria dos jogos entre a malta da mesma rua – aqueles que geram os campeões das respectivas ruas… – para uma competição mais exigente no jardim central do bairro, reunindo não apenas os vários campeões de arruamento como também os amigos, primos e conhecidos da malta do bairro.
Então se, por hipótese, um qualquer refrigerante patrocinasse com alguns tostões esses campeonatos de bairro e se alguns dos campeões locais aparecessem depois nas fotografias das páginas publicitárias de uma revista juvenil qualquer, ninguém duvidará como os fotografados seriam considerados entre a malta nova e por algum tempo os verdadeiros heróis do bairro, além de que seria normal esperar que, com aqueles egos inchados, os melhores de entre eles se quisessem considerar a si próprios como os campeões nacionais do bilas. E não seria natural esperar tudo isso de miúdos daquela idade?…
O que se torna engraçado é que, mudando-se o tempo e os meios, podemos assistir a uma reencenação disso tudo, mas agora com adultos! O jogo de berlinde agora são os blogues exclusivamente políticos e a promoção na revista juvenil faz-se agora num canal de notícias - a TVI24. Mas a presunção está lá toda, quer a de considerar o jogo do berlinde como o único hobby decente, quer a de considerar-se conhecedora da realidade nacional para se arrogarem para si a competência de organizarem a eleição do melhor jogador dextro, do melhor canhoto, do melhor individual ou da melhor equipa

VOTOS ESTRANGEIRADOS

Chegámos ao período da troca de votos inerentes à quadra e parece-me indecente, não apenas abusar do espírito de um autor anónimo, como exprimir os meus votos em inglês e não no nosso idioma materno, mas não resisto a afixar este poste estrangeirado, porque aqueles votos pintados na parede e o trocadilho que contêm traduzem tudo aquilo que considero ser o espírito desta quadra. Infelizmente. Em vez de Merry Christmas & Happy New Year temos MERRY CRISIS & HAPPY NEW FEAR.

18 dezembro 2011

O DOMÍNIO DE OUTROS DEUSES

A implosão de uma das torres do bairro do Aleixo no Porto, não foi apenas a destruição física (e espectacular) de um imóvel (acima). Terá sido também – e disso não me apercebi que se tivesse falado nos órgãos de comunicação social que a cobriram – a implosão simbólica de uma certa concepção urbana que parecia acreditar que a qualidade das infra-estruturas poderiam influenciar as características da comunidade que delas usufruia.
Não deixa de ser relevante lembrar que já há 40 anos – antes portanto daquele bairro ter sido edificado… – já René Goscinny parodiava essa concepção e os fins políticos a que ela se podia prestar – acima as páginas iniciais da aventura de Astérix de 1971, O Domínio dos Deuses. Nela, Júlio César tentava construir um gigantesco bairro romano junto à aldeia gaulesa com o propósito de assimilar culturalmente os companheiros de Astérix… Reconheço que há uma grande injustiça nesta analogia quando se comparam os simpáticos gauleses à pouco simpática população do bairro do Aleixo... Mas no resto, até ao desfecho – abaixo – as semelhanças são indesmentíveis e torna-se retrospectivamente difícil explicar como se terá persistido no erro a não ser que tenha havido outros motivos para o fazer, bem menos ingénuos do que concepções de reordenamento urbanístico…
…E, como nota final e um elogio à sobriedade de Rui Rio, para distinguir estilos diferentes de fazer política e porque a memória jornalística tende a ser extremamente curta, permitam-me relembrar aqui quando, operações deste mesmo género, por causa da sua espectacularidade e da atracção dos media que elas suscitavam, eram pretexto para que o primeiro-ministro de então aparecesse a fingir que era ele que detonava os explosivos

17 dezembro 2011

TOM & JERRY


Hoje, Sábado, um dia tradicionalmente parco em notícias do Mundo mas rico em notícias preparadas para cabeçalhos do Expresso, torna-se pertinente inserir esta composição com vídeo e fotografia do Tom & Jerry em homenagem ao circo informativo mediático onde a bicharada participa para depois se contemplar, realimentando-o. A fotografia abaixo é de Arthur Steel.

16 dezembro 2011

GUERRAS ESQUECIDAS (8): A CONFRONTAÇÃO «MALAIO»-INDONÉSIA (1962-1966)

Anteriormente, já aqui chamara a atenção para a localização estratégica da Malásia entre os dois colossos asiáticos: a China, a Oriente e a Índia, a Ocidente. Entenda-se por Malásia neste caso, não o país com esse nome, mas as regiões meridionais da Ásia onde predominam os malaios – as ilhas de Java e Sumatra e a península malaia. As duas primeiras, onde reside sensivelmente 90% da população malaia, foram colónias holandesas enquanto a última esteve sob hegemonia britânica. Para complicar o xadrez étnico (e político) local, existem apreciáveis (e influentes) minorias representativas de cada um dos colossos asiáticos: chinesas e indianas. O mapa abaixo, com cidades identificadas por quatro alfabetos distintos, dá-nos uma boa ideia da encruzilhada que é a região.
Ao prepararem-se para abandonar os seus antigos domínios no final da década de 1950, os britânicos quiseram preservar para a sua Malásia as fronteiras políticas que haviam sido traçadas na época colonial. Em oposição a isso, Sukarno, o presidente da Indonésia, passava por ser um visionário impulsionando os promotores da ideia de uma grande federação dos povos malaios que se denominaria Maphilindo (Ma – Malásia, Phi – Filipinas, Indo – Indonésia). Convém esclarecer que a contraproposta britânica, embora não tão lírica, era igualmente forçada, ao reunir num mesmo país as várias colónias da península com as outras três colónias britânicas – leia-se a curiosa história de Sarawak – situadas na ilha de Bornéu, onde os malaios nem sequer se encontravam em maioria.
Os projectos de Londres e Jacarta entraram em conflito aberto em finais de 1962, a pretexto da criação dessa federação, juntando a Malásia ocidental peninsular a essa outra Malásia no Bornéu Setentrional (acima). Desencadearam-se insurreições armadas nestas últimas colónias, embora os objectivos políticos dos insurrectos pudessem divergir dos da Indonésia que os apoiava militarmente: o Partido Popular do Brunei, por exemplo, pronunciava-se a favor de uma independência autónoma das três colónias do Bornéu – nem a federação com a Malásia, nem a reunião com a Indonésia. Mas o conflito armado acabou por pôr fim à viabilidade política dessas terceiras vias. Tratou-se de uma guerra subversiva clássica, deliberadamente limitada na sua dimensão pelos dois contendores.
Reino Unido e Indonésia defrontaram-se assim por cerca de quatro anos, num Teatro de Operações selvagem compartilhando 1.780 km de fronteiras mais ou menos indefinidas, traçadas pelo meio de uma selva tropical e impossíveis de patrulhar eficazmente. Do ponto de vista táctico, o conflito veio a tornar-se uma sucessão de incursões no território inimigo, com choques ocasionais e ferozes entre pequenas unidades de infantaria. A narrativa das operações do livro acima é uma sucessão de episódios desse género, que aumentaram de frequência a partir do momento em que os britânicos decidiram assumir também a iniciativa de penetrar em território indonésio sem o assumirem (Operação Clarete)… Constata-se que o número de efectivos envolvidos foi surpreendente baixo.
Para os 209.000 km² e 1,5 milhões de habitantes do Bornéu Setentrional e, apesar da acelerada rotação de unidades que lá prestaram serviço (recorde-se que os britânicos se defrontavam em simultâneo com uma outra guerra subversiva no Iémen do Sul), o número de efectivos engajados do lado britânico nunca terá superado os 17 mil – já havia igual número em 1965 na Guiné portuguesa (TO com 36.000 km² e 0,5 milhão). Isso reflecte-se no número de baixas: 800 mortos do lado malaio (95% militares), mas onde apenas um pouco mais de 100 eram soldados britânicos, e uma estimativa de 600 do lado indonésio. Mas, se esta foi uma guerra de que os britânicos se podem orgulhar de ter vencido, as razões para a sua vitória não terão sido obtidas tacticamente no terreno...
As teorias de Basil Liddell Hart (acima) sobre a abordagem indirecta do inimigo encaixam na perfeição na solução arranjada pelos britânicos para esta confrontação: para eles, a causa do conflito era a política expansionista desenvolvida por Sukarno e pelos que o rodeavam. Portanto, como acontecera no Irão a propósito de Mossadegh em 1951, houve que espicaçar os Estados Unidos (e a CIA) para se sensibilizarem com os problemas estratégicos regionais que estavam a ser agudizados pela conduta de Sukarno – algo que os norte-americanos tenderam a levar a sério considerando o seu envolvimento progressivo na questão vietnamita. Com o apoio da CIA e do MI6, o General Suharto derrubou Sukarno em Outubro de 1965. E em Agosto de 1966, a Confrontação estava terminada

15 dezembro 2011

UM DEDO NUM GATILHO DUMA KALASHNIKOV


Embora a mensagem com o vídeo acima me tenha chegado acompanhado por um comentário desagradavelmente racista, estas imagens de um chimpanzé aos tiros a despovoar a vizinhança podem-nos servir de metáfora e de reflexão, para estas próximas épocas que se anunciam conturbadas, do quanto se tornou fácil colocar meios de destruição poderosos nas mãos de um qualquer inimputável. E qualquer destes episódios recentes, na Noruega ou na Bélgica, são a prova que se enganam os que pensarem que, como acontece no vídeo, isso serão coisas que só acontecem com bandos de marginais (camuflados de grupos políticos) num qualquer país de África...

A INVASÃO BRASILEIRA

Ainda na continuação da referência à invasão de programas brasileiros nos finais da década de 70 que fiz no poste anterior, torna-se oportuno inserir uma pequena parte – felizmente!... – da actuação d’As Frenéticas, um conjunto brasileiro convidado para actuar e abrilhantar o Festival RTP da canção de 1980. Num piscar de olho para a audiência, a canção interpretada era também o tema principal de uma das telenovelas brasileiras que à época passava em Portugal: Dancin’ Days. Apreciada a esta distância, percebe-se que era mesmo necessário um enlevo cúmplice do público para apreciar aquela actuação medíocre. Ceterum censeo e sem rancor pelas invasões passadas, prefiro que sejam brasileiros a ficar com a EDP

14 dezembro 2011

UMA PEQUENA VIAGEM AO PASSADO TELEVISIVO A PRETO E BRANCO

Um pequeno exercício curioso: uma viagem ao passado para analisarmos como era a programação televisiva de um dia banal de há 50, 40 ou 30 anos, ainda as emissões eram a preto e branco e havia apenas uma emissora – a RTP – embora, como veremos mais abaixo, já desde há (mais de) 40 anos que existem dois canais de televisão. Porém, como também iremos constatar, os períodos de emissão eram brevíssimos quando comparados com os da actualidade (onde muitos canais emitem continuamente durante 24 horas), daí a importância na memória daqueles veteranos como eu das saudosas imagens das miras técnicas (acima) por onde se procedia à sintonização dos televisores. Ao fim e ao cabo, a mira técnica tornava-se na imagem que a televisão mais transmitia…
Este quadro acima estava afixado na montra de uma loja comercial que a RTP abriu na Praça de Londres em Lisboa e nele se anunciava a programação para 6ª Feira, 30 de Maio de 1958. A emissão iniciava-se somente às 21H00 e, encerrando às 23H30, durava apenas duas horas e meia. A informação era pouca e o serão televisivo era dominado por um concurso intitulado Quem Sabe, Sabe… apresentado por Artur Agostinho. Notem-se aqueles 15 minutos finais dedicados ao XIII Campeonato do Mundo de Hóquei em Patins que se disputava no Porto e que viria a ser ganho pela selecção portuguesa. Na campanha eleitoral em curso, Humberto Delgado já prometera que obviamente demitiria o Senhor Presidente do Conselho e as respectivas eleições presidenciais iriam ter lugar a 8 de Junho…
Esta Selecção TV de 2ª Feira, 26 de Maio de 1969 não é tão típica quando desejaria. A emissão começa 1H30 mais cedo do que o normal para cobrir a amaragem da missão Apollo 10, mais um episódio da corrida espacial para a conquista da Lua. Descontando isso, a emissão iniciar-se-ia às 19H00 e duraria cerca de cinco horas. Desde há seis meses, um 2º Programa apresentava uma programação (não muito) alternativa, com um período de emissão diária equivalente à que fora a do 1º canal dez anos antes. Mas o que torna a programação deste dia ainda mais diferente do comum é a estreia do programa Zip-Zip depois do Telejornal, com cerca de 1H45 de duração. O programa perpetuar-se-á como um símbolo da abertura que seria possível durante a Primavera Marcelista no que concerne à programação televisiva.
Dez anos depois, mas com o 25 de Abril de permeio, podemos apreciar a programação de 2ª Feira, 12 de Março de 1979. A duração das emissões comerciais dos dois canais pouco aumentaram do anterior, antecipadas em meia e uma hora, respectivamente (acima e abaixo). As emissões funcionais é que se expandiram enormemente: a tarde está coberta pelas aulas do Ciclo Preparatório (que já vinham do princípio da década de 70) e a manhã pelas aulas do Ano Propedêutico, uma criação recente entre o fim do Secundário e o Ensino Superior, que irá dar origem ao 12º Ano. Na programação, a época coincidirá com o apogeu da invasão dos programas brasileiros: a seguir à telenovela (O Astro), que se tornou obrigatória depois do sucesso de Gabriela (1977), o serão é dominado pelo Planeta dos Homens.
Os meus agradecimentos àqueles que tornam estas imagens acessiveis na internet.

13 dezembro 2011

AS «REGRAS» DO VISCONDE DE BALSEMÃO


O boxe é um desporto regido pelas regras do Marquês de Queensberry. Ao assistimos a um combate de boxe é difícil esquecermo-nos do peso da influência aristocrática na modalidade. Então, quando um dos pugilistas se lembra de morder ferozmente a orelha do adversário, como aconteceu com Mike Tyson quando defrontou Evander Holyfield em 1997 (acima), aí é difícil que não façamos a pergunta virtual qual seria a opinião do Marquês sobre aquilo que estamos a assistir… Mudando ligeiramente de tema, e embora fisicamente menos violenta, também a informação televisiva pode ser igualmente muito agressiva como se pode apreciar aqui embaixo. Depois da abertura da actividade aos canais privados em Portugal (1993), também nesta actividade terá surgido a necessidade de se estabelecerem regras, a que um outro nobre terá emprestado o nome: o Visconde de Balsemão.

Umas e outras regras, as do Marquês e as do Visconde, são mais importantes por existirem do que propriamente para serem cumpridas. Vale o paralelo porque também no caso da informação televisiva de quando em vez as coisas descontrolam-se e um dos dois participantes no match, o jornalista ou o paisano, desrespeita as regras do Visconde. A razão pode pertencer a um lado ou a outro, mas uma constante é que as televisões jogam sempre em casa. Mas, para falarmos dum desses incidentes, cedamos à descrição mais detalhada de um outro blogue: um antigo primeiro-ministro português ter visto interrompida uma conversa que estava a ter com uma jornalista, durante um noticiário televisivo, comentando temas do quotidiano da política pátria, para abrir tempo a um curto directo do aeroporto (…) à espera de José Mourinho, num contexto de uma qualquer expectativa que então existia quanto ao futuro do famoso treinador.

quando a emissão regressou ao estúdio, fez uma declaração firme, logo seguida de um abandono de cena espectacular, indignando-se pelo facto do seu verbo ter sido interrompido por um motivo tão corriqueiro. Não saiu a meio do directo, que lhe estaria a fazer perder o seu precioso tempo, mas apenas saiu no fim, para poder bem «explorar o sucesso», utilizando uma imagem militar. Ou seja, o que o autor destas palavras estará a sugerir é que o antigo primeiro-ministro deveria continuar a cumprir cavalheirescamente as regras do Visconde mesmo depois do seu anfitrião (SIC Notícias) as ter rompido. Mesmo conhecendo o seu metier como diplomata, suponho que ele estará a exigir um urbanismo em excesso aos outros. Porque haverá uma diferença entre dispor-se a ser interrompido para ouvir um entrevistado ou para mostrar imagens fugidias do aeroporto, na perseguição alguém que nunca se terá mostrado disponível para falar…


Ou então, podemos apreciar um outro episódio demonstrativo desta mesma fluidez das regras do Visconde por parte da equipa da casa, mas agora na RTP Notícias. Acima, podemos seguir uma discussão acesa entre Rui Moreira e António Pedro Vasconcelos a propósito da pertinência da referência às escutas telefónicas a Pinto da Costa. Ela culmina com o abandono do estúdio por parte do primeiro comentador enquanto o segundo estava a falar. Não é preciso ser-se formado em realização para nos apercebermos para onde é que o realizador devia orientar as câmaras: para a notícia, que era a saída inesperada de Rui Moreira. Mas não é isso que se vê no vídeo: a câmara permanece teimosamente focada no orador que até titubeia... Se, como se sugere acima, Santana Lopes tivesse saído durante o directo aconteceria aquilo que em linguagem desportiva é conhecido por benefício ao infractor. É conhecido como os órgãos de informação adoram cobrir todas as notícias com excepção daquelas em que eles próprios são o fulcro da notícia – e esta não é uma das tais regras do Visconde de Balsemão

12 dezembro 2011

PEQUENA NOTA ARQUEOLÓGICA SOBRE O PAÍS DA FOICE E DO MARTELO (E DA ESTRELINHA)

Alguém me fez notar, no seguimento do poste mais abaixo a respeito da tribo perdida dos comunistas portugueses, que é possível que o Avante! não adopte os princípios do internacionalismo proletário e que isso seja visível logo no próprio cabeçalho do jornal (acima) onde, por cima da foice e do martelo, se nota a ausência da estrela que simboliza esse internacionalismo. E há que reconhecer que é uma opinião bem fundamentada. Só isso poderá explicar a solidariedade manifestada para com o regime iraniano, um regime notório por perseguir, prender e executar militantes comunistas.

Mesmo assim, creio que isso não obstará a que se mostre mais empenho e militância no acompanhamento da actividade dos comunistas naquela que foi a pátria de Lenine… Num traço nostálgico, deixo aqui um cartaz evocativo dos bons velhos tempos. Para os mais esquecidos, a figura de Lenine está representada por aquele busto careca, de barba e bigode, posicionada a cerca de ⅓ do lado esquerdo do cartaz. Em rodapé pode ler-se qualquer coisa como: Glória ao Povo Soviético Construtor do Comunismo! Entretanto o comunismo foi destruído mas acho que fica sempre bem acarinharem-se as origens…

AQUELE QUE VIVE PELA ESPADA, MORRERÁ PELA ESPADA

Valéry Giscard d’Estaing foi o primeiro Presidente de França (1974-1981) a ser eleito através da televisão. Cultivando uma imagem onde se combinava a sofisticação com a competência tecnocrática, o candidato ficou também com a frase do primeiro grande debate presidencial da História de França disputado entre ele e François Mitterrand na noite de 10 de Maio de 1974: Sr. Mitterrand, olhe que o senhor não tem o monopólio dos sentimentos. Acima, David Burnett fotografa o ainda candidato diante de um televisor, aguardando pelas 20H00 e pelos primeiros resultados dessas eleições presidenciais das quais irá sair vencedor por uma pequena margem, com 50,8% dos votos. Mas diz-se que aquele que vive pela espada, morrerá pela espada. O septenato passado, foi ocasião de um melhor actor da cena política francesa querer a desforra e vencê-la: François Mitterrand. Abaixo, o discurso de despedida de Valéry Giscard d’Estaing¹, proferido pela televisão (como não poderia deixar de ser...), mostra-nos um Giscard d’Estaing arrogantemente igual à imagem que de si projectara, concordante com o seu percurso posterior durante os trinta anos que entretanto se passaram. Azar o dele que a França não sentisse a sua falta como insinuou, não apenas por palavras, mas também levantando-se e deixando a cena vazia por quase um minuto enquanto soa a Marselhesa…
¹Francesas, franceses,

Há sete anos o povo francês confiou-me o destino do nosso país. Foi uma grande honra para mim dirigi-lo num mundo difícil, perigoso, dominado por uma crise económica, social e moral de que não há memória nos últimos cinquenta anos. Vocês confiaram-me os bens mais valiosos da comunidade nacional: a paz, a liberdade e as nossas instituições. Fui o seu guardião e, nesta hora da despedida, restituo-as a vós, intactas.
Hoje, a vontade do maior número escolheu um novo presidente. Quis que a transição se faça de acordo com as regras de continuidade republicana. É por isso que serei eu mesmo a acolher o Senhor François Mitterrand no Palácio do Eliseu. Isto fornecerá a prova da observância dos princípios democráticos e do funcionamento normal das nossas instituições. Depois de amanhã deixarei o Palácio do Eliseu. Estou aqui esta noite para vos dizer muito simplesmente: adeus.
Deixo o meu cargo com a consciência de me ter empenhado totalmente e dedicado todos os meus esforços àquilo que considerei essencial. Peço que se lembrem disto: durante estes sete anos, tive um sonho: que a França se tornasse uma nação forte e simpática, fraterna para todos os seus e tratando de igual para igual com os grandes dirigentes mundiais. Durante sete anos, a França viveu em paz, sem sofrer convulsões internas graves, nem políticas nem sociais. Todas as eleições tiveram lugar nas datas em que seria normal. A França continuou a ser o país de todas as liberdades e a forma como se desenrolou a eleição presidencial é a prova disso, torna-se mesmo parte daquilo que não passará de uma ilha de liberdade num mar de restrições. Todas as vezes que as nossas forças tiveram de intervir no exterior, fizeram-no com sucesso, o que permanecerá uma honra dessas minhas decisões.
Se o nosso país não registou toda a prosperidade que eu lhe desejava, mantivemos porém durante sete anos a solidez do Franco, limitámos o défice orçamental, restabelecemos o equilíbrio da segurança social, salvando assim, os nossos sistemas de previdência. Quis também que o francês se orgulhasse da França. Por causa disso, empenhei-me quando vos representei no estrangeiro. Ao cruzar as nossas fronteiras, cada um de vós pode orgulhar-se de ser francês. Lançámos grandes projectos, o nosso programa de independência energética continuou sem falhas causando a admiração do mundo. Desenvolvi a Entente franco-alemã pela consolidação da Europa, mantive abertos os canais de diálogo pela paz.
Quero agradecer calorosamente a todas aquelas e aqueles de vós que me deram o seu voto, num total de catorze milhões e seiscentos mil. Votos populares, corajosos, modestos, expressões de quem reconheceu o esforço e quiseram o bem da França. Obrigado a todos vós que, de Valenciennes a Thionville, da Alsácia à Bretanha, das Antilhas a Reunião, da Mancha ao Lozère, da Alta Sabóia ao Var e à Córsega me ajudaram na minha tarefa e me trouxeram o seu entusiasmo e dedicação. A França continuará a precisar de vós e todas as vezes que isso for preciso, sei que poderei contar convosco. Neste dia que marcará para muitos o fim de grandes esperanças, sei quão numerosos serão os que compartilham a minha emoção. Saibam que um acontecimento político é apenas mais um elo na cadeia de nossa longa história. Para aqueles que me seguiram até o fim, peço-lhes que esqueçam as feridas da luta política e se fixem apenas no apego aos ideais que permanecem nossos e na vontade de reforçar a união cada vez que ela tiver oportunidades de sucesso.
Por mim, permanecerei atento a tudo aquilo que disser respeito aos interesses da França. Orientado para o futuro e reforçado com a experiência adquirida, permanecerei decerto à disposição do meu país para defender os princípios e ideias que têm orientado a minha vida e inspirado a minha actuação nestes sete anos. Antes de vos deixar, desejo-vos boa sorte a todas e todos vós. Sim, boa sorte do fundo do coração, sem amargura para uns e com um caloroso reconhecimento para os outros. Os meus melhores votos vão também para aquele que os franceses escolheram para ser o primeiro de entre eles. E, nestes tempos difíceis, onde o mal espreita e ataca por todo o mundo, espero que a Providência vele pela França, pela sua felicidade, por seu bem e pela sua grandeza.
Adeus.

11 dezembro 2011

A TRIBO PERDIDA


Está visto: para o PCP o internacionalismo proletário já não é o que era… Disputam-se eleições na Rússia, há um partido reaccionário que vence as eleições mas somente depois de recorrer a amplas manobras (detectadas) de viciação dos resultados. O povo vem para as ruas manifestar a sua indignação por esta verdadeira chapelada eleitoral que veio lesar, em primeiro lugar, o Partido Comunista da Federação Russa que, mesmo assim, reforçou as suas posições, assumindo-se, com 19% dos votos, como o maior partido da oposição.

E, com todas estas injustiças e o povo a protestar nas ruas (como todo o revolucionário gosta), o que o Avante tem a dizer são apenas uns comentários muito tépidos sobre a situação naquele país que, não nos esqueçamos, já foi o farol do Comunismo mundial? Comentários, que são tanto mais chochos, quando os comparamos com outros artigos daquela mesma secção internacional do jornal a que foi dada uma redacção muito mais empenhada e militante, como será o caso da oposição às novas agressões do imperialismo na Síria e no Irão

Depois do triste episódio da referência ao Protocolo dos Sábios do Sião, continua a parecer que o Avante e o PCP andam cada vez mais desorientados, tendo perdido quase totalmente as referências do que deveriam ser as suas solidariedades ideológicas, como se se tivessem tornado (passe a ironia do carácter judaico desta analogia…) numa espécie de tribo perdida do marxismo-leninismo que, isolada e desprovida de sacerdotes, anda a perder progressivamente a sua ortodoxia religiosa

...DIRECTAMENTE DO SRI LANKA, EM CIMA DO ACONTECIMENTO EM BRUXELAS!

Esta última cimeira em Bruxelas terminou tarde na noite, já na madrugada, mas o facto das notícias sobre as conclusões da mesma ainda estarem a sair ao princípio da manhã não inibiu que a TSF dedicasse o seu famoso programa Fórum TSF, logo a partir das 10H00 da manhã da Sexta-Feira seguinte, às opiniões dos ouvintes – a participação do já consagrado auditório TSF! Estava a ouvir o programa intermitentemente e algo se terá passado que me escapou pois, aos anónimos do costume, sucedeu-se primeiro a opinião da eurodeputada comunista Ilda Figueiredo (adivinham? - O que é preciso é mudar de políticas…) e depois a da eurodeputada bloquista Marisa Matias. Não sei se houve uma auscultação sistemática a uma eurodeputada de cada grupo parlamentar, sei que na próxima vez que sintonizei, estava a opinar e eurodeputada socialista Ana Gomes que nos falava do… Sri Lanka!
Que não restem dúvidas que, apesar do grupo parlamentar socialista no parlamento europeu dispor de mais meia dúzia de eurodeputados, incluindo mais duas mulheres, Edite Estrela e Elisa Ferreira, a eurodeputada socialista mais abalizada para nos dar a sua opinião sobre o que acabara de acontecer em Bruxelas seria a que estava do outro lado do Mundo… Desconfio que, mesmo da Nova Zelândia, nos antípodas da Europa, Ana Gomes terá opiniões ardentemente vincadas sobre um atropelamento recente numa rua de Lisboa. No encadeamento, vim a lembrar-me a propósito, de um trocadilho básico a uma publicidade da minha infância às lâminas de barbear (abaixo). Como as descreviam então, este será um tipo de informação que será tão arguto quanto descreviam aquelas lâminas, tão cortantes na primeira passagem como depois a escanhoar, só que em vez de serem stainless são brainless¹.
¹ Só em inglês as palavras são foneticamente semelhantes referindo-se ao contraste entre o aço que não mancha e a informação acéfala.

10 dezembro 2011

UM OUTRO «BLOCO CONTINENTAL»?

Embora a posição do governo britânico suscite muitas críticas internas – a montagem acima, parodiando David Cameron numa pose churchiliana foi extraída do tablóide The Sun – ela recolherá decerto muitas simpatias individuais entre os cidadãos dos países que ficaram presos do outro lado, no consensual Bloco Continental que terá deixado isolado o Reino Unido, a acreditar nas narrativas da informação. Aliás, as críticas mais consistentes a David Cameron (não é o caso propriamente do The Sun…) vão para a falta de habilidade diplomática – pior do que a de Angela Merkel! – que deixou os britânicos isolados no final do processo.

De resto, o cenário estratégico que parece vir a emergir da cimeira, salvaguardadas as distâncias temporais e a diferença entre os meios de combate, parece ser familiar para quem conheça a História da Europa. Aproveitei para inserir acima o discurso proferido por Winston Churchill em 4 de Junho de 1940¹, quando o continente estava em vias de ser dominado por Adolf Hitler. Já aqui me referi a ele, e é verdade que esses discursos valerão mais pela retórica do que pela substância, mas não deixa de ser curioso constatar que nele, Churchill faz por sua vez referência, por analogia, à Europa então dominada por Napoleão Bonaparte (1804).
Se se repetir o que aconteceu no passado, então preparemo-nos para verificar se a capacidade de resistência do Reino Unido continuará a ser superior à propensão natural do Bloco Continental para se começar a fragmentar…

¹ Quando Napoleão esteve em Bolonha por um ano, com as suas lanchas de fundo chato e o seu Grande Exército, alguém lhe disse que «havia ervas bem amargas em Inglaterra». Haverá certamente muitas mais depois do regresso da Força Expedicionária Britânica. Eu, por mim, tenho a confiança total que, se todos cumprirem o seu dever, se nada for negligenciado, se as disposições correctas forem tomadas, como está aliás a acontecer, vamos tornar a provar a nós mesmos que seremos capazes de defender a nossa Ilha, que iremos enfrentar a tempestade da guerra e que iremos sobreviver à ameaça da tirania, se for necessário durante anos e se for necessário sozinhos. De qualquer modo, é isso mesmo que iremos tentar fazer. Essa é a vontade de todos os membros do governo de Sua Majestade. Essa é a vontade do Parlamento e da nação. O Império Britânico e a República Francesa, ligados na sua causa e pela sua necessidade, irão defender até a morte o solo pátrio, ajudando-se reciprocamente como bons camaradas no máximo das suas forças.
Iremos até o fim: lutaremos em França, lutaremos nos mares e oceanos, lutaremos no ar com crescente confiança e poder; iremos defender a nossa Ilha custe o que custar; lutaremos nas praias, lutaremos nos locais de desembarque, lutaremos nos campos e nas ruas, lutaremos nas colinas; jamais nos renderemos, e mesmo – o que eu não creio nem mesmo por um momento que seja – se a nossa Ilha ou uma grande parte dela vier a ser subjugada e submetida, o nosso Império do Ultramar, armado e guardado pela Frota Britânica, continuará a lutar até que, quando Deus quiser, o Novo Mundo, com toda a sua força e poderio, se ponha em marcha para socorrer e libertar o Velho.