30 junho 2010

A SAUDAÇÃO MANIPULADA

No poste que publiquei ontem, ao falar de saudações e da forma como a saudação nazi se assemelhava à olímpica e como hoje é difícil distingui-las, lembrei-me de uma famosa fotografia tirada em Outubro de 1938 na Checoslováquia (acima) e que se costuma usar para ilustrar a expansão do nazismo para os países limítrofes antes do começo da Segunda Guerra Mundial (veja-se a fotografia usada em três sítios distintos). Nela, uma mulher de aspecto rural chora convulsivamente agarrada a um lenço enquanto faz a saudação nazi, depreendendo-se que a contragosto...

A manipulação das imagens para efeitos de propaganda nunca foi um exclusivo de uma ideologia ou facção política. E os exemplos de manipulação que nos são verdadeiramente desconfortáveis são aqueles manipulados pelo nosso lado contra os outros. Descubra-se assim que a fotografia acima é afinal o pormenor de um instantâneo (abaixo), onde se podem ver outras mulheres também em saudação e percebendo-se, pelas expressões entusiasmadas das segundas, que a emoção que pode estar a provocar o choro da mulher pode não ser aquela que deduzíramos da fotografia truncada…

29 junho 2010

CASOS EM QUE NÃO PÔDE HAVER “ERROS DE ARBITRAGEM” E AINDA OUTROS ERROS

Há que reconhecer que as cerimónias grandiosas dos Jogos Olímpicos modernos foram uma criação da extraordinária máquina de propaganda da Alemanha nazi quando os organizou em Berlim em 1936. Montados e encenados com um detalhe que nunca se vira até então, apenas ficou de fora da organização do espectáculo aquilo que não podia ser controlado: o desfecho das competições de algumas modalidades olímpicas onde, pelas suas próprias características, será mínima a influência dos erros de arbitragem para a classificação final¹. Um dos casos flagrantes disso são as competições de atletismo!
É assim que aparece esta conhecida fotografia simbólica da cerimónia protocolar dos primeiros classificados da competição de salto em comprimento, com o norte-americano Jesse Owens em primeiro lugar, ladeado pelo alemão Luz Long e pelo japonês Naoto Tajima. No meio de todos aqueles braços levantados, onde a saudação nazi se confundia com a saudação olímpica, os responsáveis da delegação norte-americana terão decidido demarcar-se de conotações incómodas, induzindo os seus atletas a saudarem com uma continência, uma ironia no caso de Owens que não cumprira qualquer serviço militar…
Conquistando quatro medalhas de ouro, Jesse Owens foi o Herói do Estádio dessas Olimpíadas de 1936 para grande aborrecimento de Adolf Hitler. Sabe-se isso pelos seus desabafos privados para quem com ele privava (Albert Speer) mas não pelas suas atitudes em público. O resto da história que acompanha a lenda, incluindo a famosa recusa em felicitar Owens é forjada. Hitler deixou de felicitar qualquer atleta depois do primeiro dia de provas, quando o Comité Olímpico lhe chamou a atenção que, como anfitrião, ou felicitava todos os atletas vencedores (e não apenas os alemães), ou então não felicitava nenhum…

Quanto ao comportamento dos berlinenses, alheios a essas subtilezas protocolares, Jesse Owens veio mais tarde a reconhecer que fora ali que recebera as maiores aclamações da sua carreira (acima). E, especificamente quanto ao comportamento de Adolf Hitler, foi o próprio desprezado a defendê-lo das críticas quando escreveu que ao passar perto da sua tribuna no estádio fora Hitler que se levantara e tomara a iniciativa de o saudar, saudação a que depois ele correspondera: Hitler não mostrou desprezo por mim – foi FDR (Franklin D. Roosevelt, Presidente dos Estados Unidos) que mostrou desprezo por mim.
Owens colocara o dedo na ferida que, quanto à prática social de racismo, os Estados Unidos não tinham moral para dar lições a ninguém. Roosevelt nem um telegrama lhe enviou. Quando se organizou uma parada (acima) e uma recepção em sua homenagem no Hotel Waldorf-Astoria de Nova Iorque – e ao contrário dos hotéis de Berlim onde estivera – o homenageado teve que apanhar o elevador dos criados... Mesmo numa cidade que se considerava cosmopolita um negro com quatro medalhas olímpicas de ouro era em primeiro lugar um negro. Com um futuro muito pouco promissor à sua frente (abaixo)...
¹ Em contrapartida, uma das meias-finais do torneio de futebol, onde o Peru vencera a Áustria por 4-2 (após prolongamento) foi repetida, alegando a organização que houvera uma invasão de campo que lesara a equipa austríaca. Dadas as circunstâncias (Berlim, 1936, jogo contra a Áustria), ainda hoje é inexplicável onde é que os peruanos poderão ter conseguido mobilizar essa multidão de apoiantes que invadiu o campo…

28 junho 2010

A MÃO DA FIFA

A fotografia acima foi tirada durante um jogo dos quartos de final do Mundial de 1986 no México, opondo a Argentina à Inglaterra. Mostra o momento preciso em que Diego Maradona, incapaz de conseguir saltar mais alto, se socorre da mão para marcar um golo irregular à vista de centenas de milhões de telespectadores... mas não do árbitro, um senhor tunisino chamado Ali Bin Nasser. A intensa rivalidade entre os dois países (que haviam travado a Guerra das Malvinas quatro anos antes) e a projecção da imprensa do país lesado adicionaram publicidade ao incidente, que se terá tornado possivelmente, mais do que o resto, num dos episódio mais recordados de todo o torneio. E vale a pena recordar que foi já há vinte e quatro anos!...
Ora quando as notícias mais interessantes dos dois jogos de ontem do Mundial 2010 foram dois colossais erros de arbitragem, um em cada jogo, é caso para perguntar se, passados estes 24 anos, terá sido alguma vez preocupação sincera dos responsáveis da FIFA durante esse período evitar que os episódios escabrosos como o da fotografia inicial se repetissem. Ou então, usando as expressões dos nossos comentadores especializados, se alguma vez lhe interessou preservar a verdade desportiva… No formato em que está colocada creio que a pergunta já contém a resposta: é evidente que não! Na trilogia do futebol moderno (desporto – espectáculo – negócio) as preocupações primordiais da FIFA são obviamente outras.
É preciso bastante mais do que a inércia ou o conservadorismo extremo para se poder explicar este comportamento da FIFA em tentar evitar que se repitam destas fraudes. A verdade é que o organismo que tutela o futebol mundial não pretende compartilhar democraticamente as decisões do que acontece em campo com aquilo que vêem as centenas de milhões de adeptos em casa. Em caso destes erros escabrosos, imolam-se os árbitros. Mas, enquanto se mantiver este status quo viscoso, torna-se sempre mais fácil ajustar o desfecho dos eventos às conveniências do negócio, já que na FIFA sempre se preferiu que, apesar da tal verdade desportiva, se possa evitar que alguma selecção menor possa chegar às finais do Campeonato…

27 junho 2010

ERIC, A ENGUIA

A fotografia acima foi tirada na partida de uma das eliminatórias da prova de 100 metros livres masculinos de natação dos Jogos Olímpicos de Sidney em 2000. Para a grande maioria dos observadores, ignorantes das subtilezas técnicas da modalidade, será mais por instinto que se reconhece que haverá algo de errado com a fotografia. Por um lado, o estilo do nadador: teso como uma tábua de engomar, prepara-se para dar um doloroso chapão quando entrar na água. Por outro lado, parece estar a competir sozinho…

A eliminatória contava inicialmente com a participação de dois outros nadadores, um do Níger e outro do Tajiquistão, que foram eliminados por terem efectuado falsas partidas. Isso não impediu que se tivesse dado a hipótese a Eric Moussambani, um nadador de 22 anos vindo da Guiné Equatorial, a hipótese de se qualificar para a final, numa das provas mais memoráveis daqueles Jogos Olímpicos. É que depois do chapão da partida, notavam-se as suas dificuldades ao nadar e, nos metros finais, até a de se manter à tona de água…
O tempo que demorou a percorrer a distância foi mais do dobro da maioria dos outros nadadores em competição: 1:52,72 – à sua maneira, foi outro record olímpico... Recebeu uma das maiores ovações do dia e o interesse imediato da comunicação social de todo o Mundo. Descobriu-se que Eric, que entretanto recebera o cognome irónico de a enguia, só aprendera a nadar oito meses antes e que se estreara numa piscina de 50 metros naquela prova – a dos seus treinos era a de um hotel com apenas 20 metros…

Para preservar a qualidade dos Jogos, os regulamentos olímpicos procuram estabelecer padrões mínimos de competição tentando evitar que se verifiquem situações do género. Porém, essas normas chocam com outras, mais ecuménicas, aquelas que procuram facilitar o acesso às competições aos atletas dos países mais desfavorecidos, como é o caso da Guiné Equatorial. Afinal, poderá parecer cruel, mas vale reflectir sobre o que Eric, a enguia, fez pela notoriedade do seu país, mesmo à custa de quase se ter afogado…

24 junho 2010

C´ERA UNA VOLTA IL PORTOGALLO

Ainda a propósito de inícios de filmes, permitam-me falar de um outro filme, com um início muito interessante (ver mais abaixo), embora sem atingir a categoria de Os Amigos de Alex. A um ritmo, pausados um dos diálogos que ali tem lugar inicialmente é o seguinte:
Charles Bronson (o Bom): - E o Frank?
Jack Elam (um dos Maus): - O Frank mandou-nos a nós os três.
Charles Bronson: - Trouxeram um cavalo para mim?
Jack Elam: - Bem… parece que nós… (sorriso maldoso) nos falta um cavalo.
Charles Bronson (abanando negativamente a cabeça): - Trouxeram foi dois a mais.
Nestes Western Spaghetti sempre admirei os heróis que mantinham, mais do que o sangue-frio, a capacidade de se manterem espirituosos até nos momentos em que se preparavam para arriscar a vida. Este diálogo só podia ter tido lugar num desses filmes, onde o que motivava as personagens ou era a cupidez (e os Maus eram desesperadamente maus) ou a vendetta (e o Bom era marginalmente menos mau que os outros).
A política portuguesa nunca teve argumentos muito elaborados mas os dos últimos tempos têm mostrado que quem os procura escrever terá descido a um patamar de sofisticação idêntico aos dos argumentistas dos Western Spaghetti com os seus Maus, que são irrecuperavelmente maus e motivados por maus instintos, e os Bons, os tais que são marginalmente menos maus que os outros, que afinal parecem agir também só por vendetta
Esta última fotografia é apenas uma curiosidade, mostrando o elenco principal e o realizador de Era Uma Vez no Oeste: da esquerda para a direita, Henry Fonda, Claudia Cardinale, Sergio Leone, Charles Bronson e Jason Robarts.

23 junho 2010

AS TRÊS GERAÇÕES DO DECLÍNIO BRITÂNICO

Quis o destino que Jorge VI (1895-1952), Rei da Inglaterra, Escócia e Irlanda e Imperador da Índia (acima), tivesse morrido prematuramente com apenas 56 anos de idade¹. Apesar da extraordinária importância dos acontecimentos que tiveram lugar durante o seu breve reinado de 15 anos, nomeadamente a Segunda Guerra Mundial de onde o seu país e os seus domínios saíram como vencedores, Jorge VI reinou sobre um Império que já se encontrava num processo de decadência inexorável.
Por exemplo, o racionamento, que vigorara durante a Guerra (1939-45), mantivera-se e até se agravara depois dela terminar. O do pão, por exemplo, teve que ser instituído entre 1946 e 1948. Quando Jorge VI faleceu subitamente em Fevereiro de 1952, quase sete anos depois dos dias de alegria da Vitória de 1945, havia escassez e o comércio de carne e de açúcar ainda era racionado. A imagem do Reino Unido da fase final do reinado de Jorge VI é uma imagem de um país estóico, contido, cinzento, parecendo sempre envolto em nevoeiro.
A fotografia abaixo sintetiza os aspectos acima citados. Tirada por ocasião do funeral de Jorge VI, podemos ver por detrás dos véus e da esquerda para a direita a nova Rainha, Elizabeth II, a sua avó e mãe do monarca falecido, a Rainha Mary, e a sua mãe, a recém-viúva, a Rainha Elizabeth. À vista, o ambiente geral é soturno e o luto coaduna-se com o estado do país: estóico e contido. Através da presença das três gerações, depois do apogeu e da perda dos primeiros pedaços do Império como a Irlanda ou a Índia, subentende-se o declínio.
¹ Em contraste, o seu irmão mais velho e predecessor, Eduardo VIII (1894-1972), veio a morrer vinte anos depois dele, com quase 78 anos de idade.

22 junho 2010

OS MERCEDES QUE SE CHAMAM ASSIM POR CAUSA DA MERCEDES QUE AFINAL NÃO SE CHAMAVA ASSIM

Há uma história, relativamente pouco conhecida, associada às origens da marca Mercedes-Benz e que pretende explicar a razão pela qual a marca ficou com aquele nome: foi um empresário e diplomata austro-húngaro de origem judaica chamado Emil Jellinek que, por volta de 1900, terá sugerido ao então fabricante automóvel DMG (Daimler Motoren Gesellschaft) que desse a denominação comercial de Mercedes a uma das suas viaturas, em alusão ao nome da sua própria filha Mercedes. A viatura assim baptizada tornou-se um sucesso comercial. Mais tarde, quando em 1926 a DMG se veio a fundir com a Benz & Cie, o prestígio da gama Mercedes já era suficientemente grande para que a designação comercial das viaturas da nova construtora (a Daimler-Benz) fosse preservada como Mercedes-Benz.

A história é engraçada mas, quem a conhece, não costuma saber quanto ela está retocada, qual artigo de jornal ou argumento de filme de Hollywood. Emil Jellinek era o concessionário da DMG em Nice, na Côte d´Azur francesa, local de concentração dos ricos, potenciais clientes de automóveis. Em 1900, Jellinek respondia por 25% das vendas da marca – 36 automóveis! – e as suas sugestões tinham uma grande importância na sede em Estugarda. Quanto à sua famosa filha Mercedes… afinal não se chamava Mercedes. Chamava-se Adriana Manuela Ramona Jellinek (abaixo) e passara a usar esse nome de alcunha (qual Lili ou Cinha…) em alusão, numa daquelas atitudes tão chiques quanto possidónias das socialites, a uma verdadeira Mercedes, María de las Mercedes de Borbón y Habsburgo-Lorena, Infanta de Espanha.

21 junho 2010

FOTOGRAFIAS QUE A GUERRA-FRIA PREFERIA REALÇAR

Construído entre 1914 e 1922 (acima), o Memorial dedicado a Abraão Lincoln tornou-se um dos monumentos simbólicos da capital norte-americana Washington DC, e também um local de passagem quase obrigatória para os dirigentes estrangeiros que estejam de visita à cidade para se encontrarem com o Presidente dos Estados Unidos.
Observe-se neste poste como, entre as fotografias mais famosas ali tiradas, se contam as dos dirigentes dos principais países rivais dos Estados Unidos durante a fase da Guerra-Fria. Ora, mais do que o fundador Washington, Lincoln será o presidente norte-americano que melhor veio a corporizar a ideologia norte americana.
A coincidência temática das fotografias dos minúsculos Nikita Khrushchev (é dele a careca luzidia da fotografia mais acima), Fidel Castro (imediatamente acima) e Deng Xiaoping (abaixo), todos diante da imponência da grandiosa estátua ou das afamadas palavras de Lincoln, não foi arte casual. É uma mensagem ideológica descarada.

20 junho 2010

O MISTÉRIO DO PRIMEIRO-MINISTRO DESAPARECIDO

Como os portugueses sabem por experiência própria, quando os Primeiros-Ministros morrem acidentalmente em funções, o episódio tende a tornar-se num apreciadíssimo fruto para as especulações. O de Camarate (abaixo), além do inquérito oficial, rendeu seis ou sete Comissões Parlamentares de Inquérito, que chegaram a conclusões opostas. Imagina-se o que aconteceria se o Primeiro-Ministro tivesse desaparecido?...
No Domingo, 17 de Dezembro de 1967, um dia de Verão no Hemisfério Sul, o Primeiro-Ministro australiano Harold Holt de 59 anos, que era um praticante entusiasmado de natação e mergulho (abaixo), desapareceu subitamente da vista dos acompanhantes numa praia de Melbourne… Apesar da maior busca efectuada até então pela Marinha e pela Força Aérea australianas, o corpo de Holt jamais veio a ser encontrado…
Oficialmente, dois dias depois do desaparecimento o Primeiro-Ministro foi declarado morto e realizou-se uma cerimónia oficial religiosa a 22 de Dezembro em substituição do funeral. Apareceram algumas teorias engraçadas, a mais imaginativa de todas, a de que Harold Holt fora raptado por um submarino chinês… Agora, se o caso se tivesse dado na nossa Costa da Caparica, já imaginaram quantas Comissões Parlamentares teria havido?...

19 junho 2010

FOTOGRAFIAS QUE A GUERRA FRIA PREFERIA ESQUECER

Aquilo que faz Leonid Brejnev abraçar de forma tão esfusiante o actor Chuck Connors durante a sua visita de Junho de 1973 aos Estados Unidos foi uma série de TV intitulada The Rifleman, uma das raras séries de origem ocidental a ser transmitida na União Soviética e de que o Secretário-Geral do PCUS era um fã entusiasmado. É difícil distinguir qual o aspecto mais engraçado do inesperado instantâneo: se o embevecimento de Brejnev, se o constrangimento do enorme (1,97 m!) Connors. Porém, nem para a máquina de propaganda do Ocidente conviria mostrar ao seu auditório esses gostos tão prosaicos, esse verdadeiro rosto humano do dirigente soviético, nem à máquina de propaganda do Leste conviria mostrar ao seu essa fraqueza do seu dirigente máximo, essa sua predilecção por essas séries televisivas de conteúdo ideológico tão suspeito.

18 junho 2010

PERTO DA PERFEIÇÃO


Os filmes nunca devem ter muito mais do que as duas a quatro personagens importantes que costumam ter. No caso da história exigir mais do que essas quatro personagens e se elas forem introduzidas a um ritmo normal, corre-se o risco de que o espectador perca o fio à história, baralhando-se com a identificação de personagens importantes; ou então, para evitar que isso aconteça, é preciso alterar o ritmo dos acontecimentos para que a apresentação dessas personagens seja mais progressiva, o que aumentará a duração do filme. Nunca houve, nem haverá uma solução fácil para o problema.

Contudo, o início de Os Amigos de Alex (The Big Chill 1983) será, dos casos que conheço, aquele que mais se aproxima da sua solução perfeita. A habilidade do realizador, aproveitando muito bem o genérico (acima) e o primeiro acontecimento da história (o funeral de Alex, abaixo), permitiu-lhe descrever ali de forma vincada os traços fundamentais das personalidades das sete personagens importantes da história. São 10 a 15 minutos mágicos, com pormenores como, por exemplo, a diferença subtil entre as reacções de Glenn Close (sonhadora) e de Jeff Goldblum aos primeiros acordes de You can't always get what you want (abaixo, no início).

17 junho 2010

A IMPORTÂNCIA DE ENGELS PARA A EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO MARXISTA-LENINISTA

Em 1959, naquilo que poderá ser classificado pelos ideólogos como uma provocação capitalista, a reputada Casa Christian Dior de alta-costura de Paris solicitou (e recebeu) autorização para fazer uma sessão de fotografias pública com os seus modelos em Moscovo. Aqui se mostram os resultados dessa passagem de modelos de há 50 anos.
A atenção dos fotógrafos concentrou-se, em vez dos vestidos, nos múltiplos contrastes e nas expressões dos transeuntes, o que proporcionou fotografias muito interessantes, muitas delas tiradas no GUM, o famoso Centro Comercial na Praça Vermelha, que reabrira com essas funções apenas em 1953, depois de ter estado 25 anos fechado.
Também a União Soviética sob Nikita Khrushchev, parecia ter entrado numa época em que se reabrira para se expor em competição com o Ocidente. Estava a ganhar a corrida espacial e Khrushchev prometia que em breve a produção socialista ultrapassaria a dos países capitalistas, mas estas fotografias parecem contradizê-lo com elegância…
Alguns anos depois (1964) Khrushchev seria discretamente afastado e a União Soviética voltaria a fechar-se. Lembrei-me destas fotografias a propósito de uma outra, actual, que bem merece o título de Socialismo Moderno (abaixo). Foi tirada na China, o maior país socialista do Mundo e herdeiro de Mao Zedong, o grande rival ideológico de Khrushchev…
Voltando o título, perguntará o leitor: o que tem Engels a ver com isto tudo? Nada, a não ser que Engels possui a barba mais bem arranjada da história do marxismo-leninismo teórico… Se quiserem uma resposta mais a sério, sugiro-lhes então que peçam a um militante comunista uma explicação simples (1 minuto!) sobre o pensamento teórico de Engels…
Engels é o segundo a contar da esquerda, depois de Marx, precedendo Lenin e Stalin...

16 junho 2010

SOBRE A CLASSE MÉDIA BRASILEIRA

Relembro ou apresento duas conhecidas séries de televisão que tiveram por tema central a classe média brasileira. Uma chamava-se Sai de Baixo (1996-2002), cujo elenco aparece (compreensivelmente...) na fotografia de cima; a outra Os Normais (2001-2003), em que a acção se centrava à volta de um casal típico da classe (abaixo). Ambas passaram em Portugal, embora com sucessos distintos. Qualquer das séries retrata a mesma classe social, embora com regionalismos a que só os próprios brasileiros seriam sensíveis: paulistana a primeira, carioca a segunda. Porém, os estilos de humor distintos davam a entender como as duas haviam sido concebidas a pensar em audiências diferentes.
Enquanto o humor de Sai de Baixo é essencialmente primário, o de Os Normais pretende ser, não só mais sofisticado¹, como, a espaços, sexualmente picante. Concretamente, e para quem tenha visto as séries, é a diferença que vai das inseguranças de Vani (Fernanda Torres) em Os Normais comparadas com as inanidades de Magda (Marisa Orth) em Sai de Baixo. A primeira série é uma caricatura apelando a uma certa cumplicidade com a própria classe social que é caricaturada, enquanto a segunda, de traços mais grossos e ridículos, destina-se a fazer rir a classe socialmente abaixo da retratada. O humor de Sai de Baixo torna-se mais exportável e a série teve muito mais sucesso em Portugal.
Mas o meu favoritismo vai todo para Os Normais onde há momentos na série em que se conseguem equilíbrios que considero memoráveis. Os primeiros minutos do vídeo abaixo são um exemplo disso: o casal Vani e Rui (Fernanda Torres/Luiz Fernando Guimarães) estão na sauna, compostamente vestidos de toalha, quando se lhes vem juntar a sua amiga Patrícia (Graziella Moretto), um exemplar da bomba loura burra que Vani toma por uma ameaça e que aparece na cabine totalmente nua… Não vale a pena contar o resto, mas chamo a atenção para o cuidado com que as cenas foram trabalhadas para que se mantenham num registo humorístico estrito evitando o pornográfico… apesar da amiga ser periquituda.
¹ O que não impede que algumas piadas também estejam assinaladas... Só que, em vez das tradicionais gargalhadas off, ouve-se um efeito sonoro.

15 junho 2010

O CASO DWYER

Porque é praticamente desconhecido na Europa, começo por sintetizar aquilo que foram os preliminares do chamado Caso Dwyer. Budd Dwyer foi um político norte-americano filiado no Partido Republicano e originário da Pennsylvania. Entre outras funções, foi o Tesoureiro do Estado (o responsável pelas finanças estatais) de 1981 a 1987. Em 1986, foi acusado e veio a ser condenado em Dezembro desse ano por um caso de suborno em que se envolvera. Como costuma acontecer com a maioria destes casos, Dwyer veio protestar publicamente a sua inocência, tendo chegado mesmo a apelar por escrito para que lhe fosse concedido um perdão presidencial pelo então Presidente Ronald Reagan.

Habituado e habilidoso a lidar com os órgãos de informação, Dwyer, que se mantivera no seu cargo apesar da condenação que recebera e de, entretanto, ter sido eleito um novo Governador do Estado, convocou uma conferência de imprensa para o seu gabinete na véspera do dia em que iria ser lida a sua sentença. A expectativa geral era que se tratasse de uma conferência de imprensa em que Budd Dwyer apresentaria a sua versão dos acontecimentos e se lamentasse do tratamento injusto a que o estavam a sujeitar antes de apresentar a sua demissão do cargo. Porém, Dwyer estava disposto a pagar o preço máximo pela preservação da sua imagem pública, manipulando o aparelho da informação

A declaração que Dwyer começou por ler na conferência de imprensa ia de encontro às expectativas desse aparelho, mesmo nos seus excessos de comparar o sistema judicial a um Gulag. O que se seguiu, não. Depois de entregar, sempre em frente das câmaras e dos microfones e a três colaboradores diferentes, cartas para a sua mulher, para o novo Governador e assumindo-se como dador de órgãos, Budd Dwyer tirou de um envelope um revólver de cano comprido calibre .357 Magnum (um verdadeiro pistolão!), anunciando aos presentes que aqueles a quem aquilo pudesse afectar deviam sair da sala (fotografia acima), antes de encostar o cano ao palato e puxar pelo gatilho apesar dos pedidos dos presentes.

A questão que suscitou maior controvérsia na altura (Janeiro de 1987) terá sido a da exibição total ou apenas editada das imagens do evento nos media. (Aviso: as imagens são violentas. O vídeo com as imagens então recolhidas por um dos cinco canais de televisão presentes pode ser visto nesta ligação.) Na questão das imagens, aquilo que acontecera evidenciava um conflito óbvio entre mostrar a realidade e a conveniência de o fazer. Mas esse era só um dos problemas levantados pelo Caso Dwyer. O outro, porque mais desfavorável para o tal aparelho da informação não costuma ser debatido: a capacidade que tem qualquer político esperto, mesmo de segunda categoria, de manipular a agenda informativa

O Caso Dwyer foi um excesso, mas o protagonista encenou-o antecipando perfeitamente como se comportaria o aparelho com a notícia que ele iria criar. Apesar de já não possuir outros argumentos substantivos, o protagonista contou com a sua condição de vítima à frente das câmaras para assim proteger a sua reputação futura. Não é em vão que recentemente se produziu um documentário a procurar limpar-lha… Outro político, Georges Clemenceau, terá dito no fim da Primeira Guerra Mundial: Se me preocupasse com a minha glória, morreria agora! Budd Dwyer, com a sua carreira em declínio e já só preocupado com a sua reputação, organizou as coisas para que isso lhe acontecesse mesmo…

14 junho 2010

A BÉLGICA E A EUROPA

Hoje, a propósito das eleições que ontem ali tiveram lugar, na informação voltar-se-á a falar mais uma vez da situação política belga, como se se tratasse de um daqueles casais nossos conhecidos, que estão permanentemente desavindos mas que, por motivos que nos continuam a escapar, nunca mais se decidem a pedir o divórcio. Já aqui havia falado algumas vezes do tema: através de sucessivas transferências de competências para os governos das respectivas comunidades, o governo nacional belga já não tem poder algum.

Se assim não fosse, os partidos políticos que, como em todo o lado, existem para alcançar o poder, não teriam passado 282 dias em discussões infindas para integrar o governo central, nem se disporiam tão facilmente a abandoná-lo ao menor incidente. Será talvez excessivo afirmar que a Bélgica já não existe. Existe, mas existirá com a mesma substância que a vontade de sua Majestade quando os britânicos empregam aquela sua conhecida e consagrada expressão: o Governo de Sua Majestade (His Majesty's Government)…

É curioso como durante décadas – a Bélgica foi um dos países fundadores da CEE em 1958 – o problema da coesão belga foi pontapeado para a frente, na ilusão de que a Bélgica parecia ser um país ainda mais moderno que os outros, já adaptado à Europa do futuro, com os respectivos membros da federação (a Flandres e a Valónia) e Bruxelas como o Distrito Federal, numa réplica continental de Washington D.C. ou de Brasília. Porém, cada vez parece mais certo que o futuro próximo da União Europeia não virá a ser propriamente esse…

De há uns meses para cá tudo passou a ter nacionalidade: os problemas financeiros são gregos e as soluções têm de ser alemãs. E a campanha que precedeu as eleições belgas assemelhou-se na argumentação ao debate que divide a União, com os flamengos do Norte a acusarem os valões do Sul de um despesismo de recursos que não possuem. Se estes resultados eleitorais servirem de amostra do que poderá pensar o eleitorado europeu, então será preferível não nos consultarem também desta vez, que nos estamos marimbando todos uns para os outros...

13 junho 2010

CINCO QUADROS DE FUZILAMENTOS

Ainda a propósito de fuzilamentos com pelotão organizado para o efeito, como só constam afinal do título da fotografia do poste anterior, vale a pena relembrar aqui algumas das pinturas mais célebres associadas a esse tema, a começar por aquela que será, provavelmente, a mais famosa de todas Três de Maio de 1808 em Madrid, que foi pintada por Francisco de Goya em 1814 (acima). O quadro veio depois a servir de inspiração em obras de outros grandes pintores, mantendo-se a mesma disposição, com os fuzilados à esquerda e os algozes à direita, assim como a manifestação da simpatia implícita pelos primeiros.
Em A Execução de Maximiliano (acima) de Édouard Manet (obra impressionista de 1867), essa simpatia manifesta-se na atitude estóica de Maximiliano (o do centro), o efémero Imperador do México (1864-67), quando comparada com as dos seus companheiros. Todavia, em Massacre na Coreia (abaixo) de Pablo Picasso (de 1951), essa simpatia manifesta-se de forma mais complexa, através da nudez dos executados (todos mulheres e crianças) em contraste com os metais e os rebites dos carrascos. Alusiva à Guerra da Coreia (1950-53) e ao envolvimento norte-americano nela, é uma das obras politicamente mais engajadas do pintor espanhol.
Curiosamente, a evolução que este tema terá tido na escola de pintura russa e depois soviética, é distinto do da pintura ocidental. O quadro abaixo, que foi pintado em 1897 mas cujo tema é ainda a Guerra Patriótica de 1812 e cujo autor é Vassily Veretchaguine, mostra como o exagero para efeitos de propaganda é muito mais russo do que soviético.É que parece não fazer sentido que os invasores franceses (à direita, impecavelmente alinhados) tivessem escolhido deliberadamente o interior de uma Igreja Ortodoxa de Moscovo (identificável por causa dos vários ícones religiosos nas paredes) para perpetrarem os seus massacres...
Outro fuzilamento que também foi imortalizado em tela para efeitos de propaganda foi O dos vinte e seis comissários de Baku, um episódio acessório da imposição do poder soviético nas regiões do Cáucaso durante a Guerra Civil que se seguiu à Revolução de Outubro. Pintado por Isaak Brodsky em 1925, sete anos depois dos acontecimentos, é o único quadro do conjunto que não respeita a disposição tradicional à Goya, aparecendo agora os fuzilados do lado direito e onde estes não são retratados como vítimas, assumindo, pelo contrário, uma atitude desafiadora e sendo desenhados num plano superior ao dos carrascos.

FOTOGRAFIA DE UM ASSASSINATO COLECTIVO

A fotografia abaixo foi tirada em Agosto de 1979 em Sanandaj, uma das principais cidades do Curdistão iraniano a cerca de 500 km a Oeste de Teerão. Não é classificável como uma fotografia de guerra, porque nem se trata de um acto associado a uma guerra, apenas à repressão, a um instantâneo de um crime. De um lado os executores são guardas revolucionários islâmicos – o Xá fora derrubado oito meses antes – enquanto os executados (onze) são descritos como membros da elite curda local que se teriam aproveitado da onda revolucionária para promoverem acções em prol do nacionalismo curdo. A fotografia mostra a resposta dos persas a essas acções…
A fotografia tornou-se mundialmente célebre e deram-lhe o título Pelotão de Fuzilamento no Irão. Considero-o um mau título. A existência de uma secção de fuzilamento está associada a alguma organização e a algum formalismo em atenção à dignidade de quem vai morrer. O que a fotografia mostra será melhor descrito como uma bagunça, um conjunto de homicídios, com cada executante agachado de G-3 na mão a apontar para o seu alvo vendado à sua frente que tanto podia ser alvejado de joelhos como de pé. Percebe-se até que nem a ordem de fogo foi coordenada, porque se vêem vítimas já atingidas pelos tiros e outras ainda não…

12 junho 2010

AGORA SOBRE ASSUNTOS DE QUE NÃO FICARAM DÚVIDAS

Agora que se deram por terminados os trabalhos da Comissão de Inquérito do negócio PT/TVI, onde era a figura mais graduada do seu partido, e depois de já ter passado o apogeu mediático do episódio do gamanço dos gravadores, este é o momento politicamente conveniente para que na bancada parlamentar socialista se inste o seu vice-presidente Ricardo Rodrigues a pedir discretamente a suspensão do seu mandato. O que Ricardo Rodrigues fez não precisa de relatório porque ficou relatado no vídeo abaixo. E não se procure iludir o problema com a questão da imunidade parlamentar porque o que aconteceu foi um problema de conduta pessoal daquele deputado, conduta essa que foi uma vergonha! Tanto no roubo como na sua declaração posterior. E outra será a continuação da conivência da direcção da bancada do seu partido com aquilo que todos vimos que ele fez.

AS FOTOGRAFIAS TRUNCADAS DO CAPITALISMO

No Verão de 1899 o Presidente dos Estados Unidos, William McKinley (1843-1901), posou para uma fotografia institucional (acima, do lado esquerdo) acompanhado do então Vice-Presidente Garret Hobart (1844-1899). Hobart veio a falecer em Novembro desse mesmo ano e quando se McKinley se apresentou à reeleição no ano seguinte, dado o sucesso da primeira, pensou-se em fazer uma outra fotografia do mesmo estilo com McKinley acompanhado do novo candidato à Vice-Presidência, Theodore Roosevelt (1858-1919).
É bizarro que, nessa nova fotografia tirada um ano depois, McKinley apareça com a mesma roupa, sentado na mesma cadeira e assumindo a mesma pose que na fotografia anterior. Dessa vez, McKinley e Roosevelt apareciam mais afastados e o fundo do jardim até parece descontínuo. Também não se conhece nenhuma testemunha da sessão fotográfica conjunta. Para a história escondida, a fotografia acima parece ter sido uma das primeiras fotografias adulteradas por razões políticas. Uma das primeiras entre muitos milhares…
Genuínas ou adulteradas, constate-se que aquele estilo de propaganda eleitoral fez a sua época, como se pode observar na fotografia acima, tirada em 1904, desta vez já com Theodore Roosevelt na cadeira da presidência acompanhado do seu Vice, Charles Fairbanks (1852-1918).