Estamos a 50 anos de distância dos tempos em que quem apresentava programas na televisão o fazia como se estivesse em plena sala de aula, socorrendo-se dos meios que houvesse à disposição, como o fazia o Padre Raul Machado no seu programa intitulado Charlas* Linguísticas (data de 1958) em que, como se vê acima, ainda ele recorria a um vulgar quadro de ardósia, para as explicações complementares.
A pedagogia dos tempos modernos terá evoluído imenso mas, no campo televisivo, terá sido no caminho regressivo da sobre simplificação. Naqueles debates políticos mais importantes, há quem apoie os seus argumentos durante a discussão – lembro-me, por exemplo, do debate entre António Guterres e Durão Barroso em 1999 – nuns gráficos de barras que costumam ser muito coloridos, mas pouco explicativos em que consistem as abcissas e as ordenadas…
Actualmente, este último gesto popularizou-se, com o aproveitamento do tempo de antena para a passagem de mensagens televisivas sobre simplificadas (ver deste blogue o poste O Peclec, o Sigic, o Nuno e o Melo) ou, envolvendo bonecos, para brandir mapas que representam uma análise estratégica profunda, como fez Daniel Oliveira com aquele mapa mais abaixo (também inserido no seu blogue), na sua aparição no Eixo do Mal da SIC Notícias.
A intenção clara do encadeamento de três configurações fronteiriças da Palestina em três datas distintas (1947, 1949-1967, 2000) é a de nos induzir visualmente a ideia que o território concedido aos palestinianos tem vindo a reduzir-se progressivamente. Ora, para deles se poder extrair essa conclusão, então aqueles três mapas deveriam representar realidades compatíveis, o que não é verdade, para além de qualquer deles necessitar de notas explicativas...
O primeiro mapa do bonecos de Daniel Oliveira (de 1947) nunca chegou a existir concretamente. Representava apenas uma proposta de plano da ONU para repartir a Palestina entre árabes e judeus – de uma forma que beneficiava nitidamente os segundos... Simplesmente, nenhuma das partes estava interessada nessa repartição, nem sequer em discuti-la, e ambas partiram para a Guerra em 1948 - os judeus versus os palestinianos e os países árabes vizinhos.
Com a vitória militar dos judeus (a propósito, nessa época um dos maiores apoios diplomáticos com que eles contavam era o soviético…), estabeleceu-se o segundo mapa do bonecos de Daniel Oliveira (1949-67), um que, ao contrário do anterior, é real: ele resulta das fronteiras de facto alcançadas pelos beligerantes em 1949. Mas tem legendas erradas: naquela região verde onde se lê Palestine, devia ler-se Jordânia - como abaixo se explica porquê.
É um facto devidamente esquecido que durante aqueles 18 anos, os palestinianos que não se haviam refugiado nos países vizinhos nem haviam adquirido cidadania israelita, estiveram sob tutela árabe: os da Faixa de Gaza estiveram sob tutela egípcia; e os da Cisjordânia sob a tutela do antigo Emirato da Transjordânia, que depois anexou a região e que com isso se transformou em 1949 mudando o nome para Reino Hachemita da Jordânia**.
Durante décadas, mesmo depois de ter ocupado a Cisjordânia em 1967, essa anexação foi um álibi invocado por Israel para a resolução do problema do estabelecimento da pátria palestiniana: eles já tinham uma, a Jordânia. Contudo, apesar do parentesco dos povos – Rania, a actual Rainha jordana é de ascendência palestiniana – depois dos acontecimentos de Setembro Negro (1970), já aqui por mim abordados no blogue, a Jordânia acabou por se dissociar da questão palestiniana.
Resta o último mapa dos bonecos de Daniel Oliveira, o datado de 2000. Como o primeiro, também é o mapa de um projecto que praticamente não saiu do papel – o dos Acordos de Oslo de 1994 (veja-se acima, o detalhe das regiões da Cisjordânia). Pela descontinuidade geográfica das zonas palestinianas, também já critiquei aqui no blogue a viabilidade da solução, comparando-a aos famosos bantustões sul-africanos do tempo do apartheid, lembrando o que lhes aconteceu.
Este último mapa faz reflectir, nem que seja para constatar o tão pouco que os israelitas estão dispostos a ceder e o tão pouco que os palestinianos parecem estar dispostos a aceitar, mas, no enquadramento geral dos bonecos, a sua seriedade aparece tarde demais numa sequência que pretende reduzir – e de forma tendenciosa – a complexidade do problema israelo-palestiniano a uma espécie de cartoon de densidade infantil, com os bons e os maus…
* Simbólico do que são os conhecimentos do corrector ortográfico do processador de texto (e um alerta para quem neles se fia cegamente …), este não reconhece o vocábulo charlas escolhido por aquele vulto da Língua Portuguesa para título do seu programa…
A intenção clara do encadeamento de três configurações fronteiriças da Palestina em três datas distintas (1947, 1949-1967, 2000) é a de nos induzir visualmente a ideia que o território concedido aos palestinianos tem vindo a reduzir-se progressivamente. Ora, para deles se poder extrair essa conclusão, então aqueles três mapas deveriam representar realidades compatíveis, o que não é verdade, para além de qualquer deles necessitar de notas explicativas...
O primeiro mapa do bonecos de Daniel Oliveira (de 1947) nunca chegou a existir concretamente. Representava apenas uma proposta de plano da ONU para repartir a Palestina entre árabes e judeus – de uma forma que beneficiava nitidamente os segundos... Simplesmente, nenhuma das partes estava interessada nessa repartição, nem sequer em discuti-la, e ambas partiram para a Guerra em 1948 - os judeus versus os palestinianos e os países árabes vizinhos.
Com a vitória militar dos judeus (a propósito, nessa época um dos maiores apoios diplomáticos com que eles contavam era o soviético…), estabeleceu-se o segundo mapa do bonecos de Daniel Oliveira (1949-67), um que, ao contrário do anterior, é real: ele resulta das fronteiras de facto alcançadas pelos beligerantes em 1949. Mas tem legendas erradas: naquela região verde onde se lê Palestine, devia ler-se Jordânia - como abaixo se explica porquê.
É um facto devidamente esquecido que durante aqueles 18 anos, os palestinianos que não se haviam refugiado nos países vizinhos nem haviam adquirido cidadania israelita, estiveram sob tutela árabe: os da Faixa de Gaza estiveram sob tutela egípcia; e os da Cisjordânia sob a tutela do antigo Emirato da Transjordânia, que depois anexou a região e que com isso se transformou em 1949 mudando o nome para Reino Hachemita da Jordânia**.
Durante décadas, mesmo depois de ter ocupado a Cisjordânia em 1967, essa anexação foi um álibi invocado por Israel para a resolução do problema do estabelecimento da pátria palestiniana: eles já tinham uma, a Jordânia. Contudo, apesar do parentesco dos povos – Rania, a actual Rainha jordana é de ascendência palestiniana – depois dos acontecimentos de Setembro Negro (1970), já aqui por mim abordados no blogue, a Jordânia acabou por se dissociar da questão palestiniana.
Resta o último mapa dos bonecos de Daniel Oliveira, o datado de 2000. Como o primeiro, também é o mapa de um projecto que praticamente não saiu do papel – o dos Acordos de Oslo de 1994 (veja-se acima, o detalhe das regiões da Cisjordânia). Pela descontinuidade geográfica das zonas palestinianas, também já critiquei aqui no blogue a viabilidade da solução, comparando-a aos famosos bantustões sul-africanos do tempo do apartheid, lembrando o que lhes aconteceu.
Este último mapa faz reflectir, nem que seja para constatar o tão pouco que os israelitas estão dispostos a ceder e o tão pouco que os palestinianos parecem estar dispostos a aceitar, mas, no enquadramento geral dos bonecos, a sua seriedade aparece tarde demais numa sequência que pretende reduzir – e de forma tendenciosa – a complexidade do problema israelo-palestiniano a uma espécie de cartoon de densidade infantil, com os bons e os maus…
* Simbólico do que são os conhecimentos do corrector ortográfico do processador de texto (e um alerta para quem neles se fia cegamente …), este não reconhece o vocábulo charlas escolhido por aquele vulto da Língua Portuguesa para título do seu programa…
** Resultado da junção da Transjordânia e da Cisjordânia. Trans e cis são prefixos latinos significando para lá de e para cá de. Jordânia refere-se naturalmente ao Rio Jordão.
Fiz uma ligação lá para o meu cantito! Além de ter visto os mapas em vários blogs, também os vi EIXO....
ResponderEliminar:))
Nem sei qual o tráfego do seu blogue, Maria do Sol, mas, pelo número de pessoas que estou a verificar virem ao "Herdeiro" encaminhadas pela ligação do seu "cantito", então fiquei sem diminutivos para qualificar o meu blogue.
ResponderEliminarSó espero que tenham lido! Porque se leram... vão voltar concerteza!
ResponderEliminar:))
Eu fui das que li!
ResponderEliminarCertamente, se não se importar, voltarei!
Regresse sempre que quiser, um Ar de.
ResponderEliminarNão caio no exagero de lhe dizer para se instalar em permanência, porque não lhe prometo que tenha temas para postes a um ritmo suficiente para a entreter continuamente...
:)