Mais do que as notícias da invasão de Gaza por Israel, e a consequente reacção do Hamas, mais as fotografias com as explosões e as crianças feridas, as que sejam mais impressionantes para a opinião pública, publicou-se ontem uma notícia verdadeiramente importante e, sendo hoje confirmada, pode-se tornar muito incomodativa para a argumentação que costuma ser evocada pelos israelitas para a defesa da sua causa. Na arrumação entre israelitas e palestinianos é costume esquecer-se que existem árabes que têm a cidadania israelita. Não costumam dar jeito aos aparelhos de propaganda de qualquer dos lados em confronto, que preferem colorir as questões da região a duas cores… Segundo os dados demográficos, eles constituem 19,8% da população de Israel e deviam gozar dos direitos de qualquer cidadão israelita…
Claro que não gozam e são discriminados... Também é verdade que estes árabes israelitas não são uma comunidade coesa, mas sim um somatório de clãs, como é tradicional naquela região. 82,7% são muçulmanos, na sua esmagadora maioria sunitas, mas também há árabes cristãos (8,3%) e druzos (8,4%). Os das duas primeiras confissões estão dispensados de cumprir o serviço militar, mas os druzos fazem-no. Sendo cerca de 20% da população total de Israel e tendo direito a voto, e costumando fazer-se representar por partidos políticos distintos, seria de esperar que existisse uma mesma proporção de deputados de origem árabe no Parlamento israelita (
Knesset) de 120 lugares, ou seja uns 20 a 24 deputados. Contudo, não é assim: existem três formações identificadas com os árabes que possuem um total de 10 deputados.

Na verdade, a distribuição não se deverá fazer tão nitidamente de acordo com os grupos religiosos, há muitos árabes que votarão nos partidos da esquerda tradicional judaica (
há no total 12 deputados árabes no Knesset) e há também judeus que votam nas formações mais radicais de extrema-esquerda conotadas com os árabes – um dos 10 deputados das formações acima citadas (
Dov Khenin) é judeu. Ora
a notícia que justifica o título deste
poste foi a decisão do
Comité Central para as próximas Eleições, a realizar em Israel em 10 de Fevereiro próximo, de proibir duas das formações árabes (a
Lista Árabe Unida, com forte apoio entre os beduínos, e o
Balad) de concorrer a essas eleições. O gesto não é inédito, foi tentado em 2003 e as formações afectadas recorreram para o Supremo Tribunal de Israel e ganharam o recurso.

Por detrás da guerra das fotografias destinadas à emoção, é a existência de mecanismos como estes – sistemas eleitorais sólidos mas controlados por sistemas judiciais independentes – que permitem a Israel apresentar-se ao bloco ocidental que os apoia como uma sociedade que, apesar de todos os seus defeitos, ainda defende valores que a distinguem de todos os outros países que o cercam na região. As notícias que noticiaram o afastamento das duas formações radicais pelo Comité, acrescentavam que as duas formações haviam apelado para o Supremo Tribunal e davam como certo a revogação da decisão. Não sei se se deveria estar tão seguro; em 2003 a decisão foi tomada por uma maioria de 7 votos a 4... Menos impressionante mas mais importante do que o bebé palestiniano a sangrar, eu ficaria atento ao que os juízes israelitas vão decidir…
O problema é que os bébés palestinos a sangrar podem ou não salvar-se e não é a decisão do tais juizes que o vai "decidir".
ResponderEliminarReligião e política não são miscíveis. Quando as misturam dá m....!
ResponderEliminarConcordo inteiramente. É tentar (e conseguir)cobrir o importante com o emocionante. E a gente vai na onda...
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