13 outubro 2008

O INTELECTUAL DA ESQUINA

Diz muito sobre o que nós somos, portugueses, a forma como hierarquizamos as prioridades para resolver os problemas. Basta juntarmo-nos uns três ou quatro para que apareça um deles a dissertar sobre as causas profundas do problema a resolver, causa para a qual, obviamente, aquele ajuntamento não tem solução… Baralhamos os aspectos da questão que precisam de uma solução simples e imediata, misturando-os com os outros aspectos mais complexos associados a questões estruturais para cuja resolução as soluções se tornam muito mais complexas. Depois, tudo, o simples e o complexo, fica por resolver...
Num dos casos em que é tradicional ridicularizarmo-nos, o daquelas aglomerações que se formam em caso de um acidente automóvel, o que considero mais paradoxal nem sequer é a multidão que ali fica sem nada fazer, apenas a comentar o acidente. É que, no final, aquele que é considerado a pessoa mais importante do ajuntamento não é quem evacuou os feridos, quem rebocou os carros sinistrados ou quem lavou o local do sinistro; é o intelectual que viu como foi o acidente, sabe como ele poderia ter sido evitado e até tem palpites sobre como terá evoluído o estado clínico dos feridos agora no Hospital…
Na essência, comentários como os que estou a ler por aí na blogosfera (veja-se este, à laia de exemplo), só muito remotamente estarão associados à solução do problema premente que o Governo português pretende solucionar quando ontem anunciou a criação de uma garantia de vinte mil milhões de euros; mas tal qual acontece com o intelectual de esquina do parágrafo acima, a explicação dada então por Teixeira dos Santos não se compara à profundidade explicativa - e à inocuidade aplicativa - da de muitas análises que já tive oportunidade hoje de ler por aí…

4 comentários:

  1. Caro A.Teixeira.

    Independentemente da opinião do senhor do blog nada ter muito a ver com esta questão da garantia de 20 mil milhões, a realidade é que o Estado português aparentemente apresentou uma garantia de 20 mil milhões para supostamente garantir o que está depositado nos bancos.

    Mas como o governo português representa os cidadãos portugueses são estes que estão a apresentar uma garantia, com o seu próprio dinheiro sobre dinheiro do qual já são proprietários.

    Portanto não há aqui nada de extraordinário nem o governo português conseguiu de repente um qualquer passe de magia branca; antes são os contribuintes involuntariamente que estão a garantir o que já é seu e fazem-no duplamente.
    Mantendo os seus depósitos, que estão a ser mal geridos pelas entidades bancárias e sendo ao mesmo tempo penhor e garantia.

    Se num futuro próximo, acaso se vier a verificar que os bancos portugueses rebenta;nessa altura o que é que se fará?

    Irá de novo aumentar-se a garantia obtendo dinheiro noutro lado, ou irá pedir-se de novo aos contribuintes que garantam a má gestão do sistema bancário?

    As más opções no que diz respeito às aplicações dos bancos e aos crédito entre bancos?

    É que isto é muito engraçado e muito corajoso da parte do governo e visa gerar TRANQUILIDADE, admito, mas o dinheiro não é elástico e existem limites claros aos que os contribuintes podem garantir ou servirem de garantia.

    Talvez seja melhor os bancos e os accionistas deles começarem a entrar com dinheiro para cobrir as perdas ou deixarmos mesmo um ou dois bancos irem à falência para "limpar" o sistema.

    Viver de bolhas financeiras, mesmo microscópicas, e à nossa escala, deveria ser algo que um auto proclamado governo de esquerda devia fugir como o diabo foge da cruz.

    A pergunta não é directamente para si, mas "esta é uma economia de mercado onde todos podem falir menos bancos"?

    Este problema não vai desaparecer, os bancos tem que limpar e reescrever os seus activos, um dos problemas que o senhor Pitta aponta; a concessão de crédito ao desbarato tem que ser corrigido, e não vi até agora nada, nenhuma medida a ser tomada para resolver isso.

    Antes pelo contrário, alegremente vemos todos os dias anúncios na televisão a promover ofertas de crédito.

    E ontem o actual governo lançou uma péssima ideia para revitalizar o mercado habitacional: baixar impostos a fundos de investimento imobiliário.

    Explicação oficial: para lhes possibilitar "investirem".

    Explicação real: como os lucros deles estão em queda ou negativos e estão entalados com "material para vender (casas) e a depreciação de bens não vendidos em contabilidade é de 1% ao mês; estas pessoas sabem que a crise vai continuar durante muito tempo, o nosso actual governo decidiu fazer " comunismo " de mercado dando-lhes uma mãozinha.

    Pode ser que quando alguns membros do governo saírem do mesmo exista um bom lugar à espera no Conselho de administração de algum destes fundos.

    É uma decisão económica extremamente errada e que não penaliza em nada a má gestão destes fundos e deste sector.

    Apenas lhes manda o sinal que podem continuar a fazer investimentos na área quer seja possível fazê-los ou não.

    Quando existirem problemas o governo baixa os impostos para re-possibilitar o investimento.

    Isto pode parecer fora do âmbito do post, mas a realidade é que daqui a 3 ou 4 anos vamos voltar a ter a mesma questão, com as noticias de que o governo português (contribuintes) garantiu 25 milhões de qualquer coisa para garantir depósitos bancários devido à ultima crise do sector "X".

    Mas lá está: quando os problemas rebentarem de novo a sério, devido aos ciclos eleitorais, provavelmente já não será o trapaceiro primeiro ministro actual a estar no cargo.

    Varrer para baixo do tapete, é interessante, mas não resolve problemas.


    Dissidente-x

    ResponderEliminar
  2. Há sempre umas "autoridades" dispostas a tomar conta das ocorrências.
    Isto digo eu, que não as leio, para não ver a figura que faria se, eu próprio, escrevesse sobre as ditas ocorrências

    ResponderEliminar
  3. Lisonjeia-me muito, Dissidente, o desenvolvimento que o seu comentário ao meu pequeno poste assumiu. Nele, procurei estabelecer as características do que designarei (usando terminologia médica) de tratamento de urgência É o tratamento necessário quando o tratamento profilático falhou ou nem sequer existiu. E os casos alheios a que me referi no poste e de que usei apenas um exemplo nem sequer cuidavam disso: eram apenas descrições sintomáticas de problemas (no caso exemplificado, o do sobre-endividamento) que só muito indirectamente se podiam associar à crise de liquidez no mercado interbancário.

    É que há problemas financeiros e problemas económicos. Embora as questões não sejam estanques, podem ser independentes: uma empresa pode estar a gerar imensos lucros (saúde económica) e não ter dinheiro para pagar ordenados (crise financeira). E a crise prioritária neste momento é esta última. O que as crises têm de bom é que não é preciso recorrer a abstracções para se explicarem os riscos que se correm: esta manhã, a Bolsa islandesa abriu, depois de ter estado 3 dias encerrada, e fechou quase logo de imediato, já o índice de acções havia baixado 47%... Perante ameaças destas, as soluções que se arranjam não são óptimas, nem sequer boas, são as possíveis e, fundamental, as que funcionem…

    Sem termos presente estes factos, arriscamo-nos a ser como o” intelectual da esquina”, já na sua segunda fase, em que depois da “descrição do acidente”, elabora na forma como “ele poderia ter sido evitado”, com um típico “é o que eu ando a dizer há não sei quantos anos: têm que se pôr aqui uns semáforos!”. Ora por agora, e apesar de todo o optimismo que grassa por aí desde ontem, ainda nem sei – e suponho que ninguém sabe – qual virá a ser o número total de vítimas…

    PS – A pergunta não era para mim, mas nesta economia de mercado há muitas outras empresas que não vão à falência para além dos bancos: a CP não vai à falência, a Carris e os STCP não vão à falência, a RTP não vai à falência, todos os Hospitais EP não vão à falência…

    ResponderEliminar
  4. Sobretudo JRD porque, nestas alturas, aqueles que sabem mais que os outros, também sabem que há coisas que se devem dizer, outras que podem dizer e outras que é proibido dizer.

    ResponderEliminar