INTUIÇÕES CAMUFLADAS DE RACIOCÍNIOS

Entre as várias cenas iniciais da abertura do filme Tootsie, onde Michael Dorsey (Dustin Hoffman) se apresenta a sucessivas audições para papéis mas sempre sem sucesso, há uma dessas audições (no filme acima, entre os 2m02s e os 2m25s), onde se trava um interessante diálogo entre o actor à procura de emprego e o encarregado pela selecção.

Hoffman interrompe a audição e interpela alguém oculto na plateia:

- Posso recomeçar a leitura? Acho que consigo que ela saia melhor…
- Deixe estar, a leitura estava bem, você é que é o tipo errado.
- Oh! Mas eu posso ser mais alto.
- Não, não. Você não percebeu. Estamos à procura de alguém mais baixo.
- Ah! Mas olhe que eu não preciso de ser assim tão alto. Veja – descalça um sapato – eu até uso palmilhas. Eu consigo ser mais baixo…
- Estou a ver… Mas, na realidade, nós estamos à procura de alguém diferente.
- Eu posso ser diferente…
- Estamos à procura doutra pessoa, ESTÁ BEM?

O que este diálogo tem de interessante é que a personagem de Hoffman vai sucessiva e obtusamente procurando dar resposta aos argumentos vindos da plateia, que não passam afinal de pretextos de uma decisão tomada de antemão. Costuma ser assim na vida real e a blogosfera não é excepção.

O que esta última tem de mais engraçado do que o normal é que aqui, os argumentos, porque passados a escrito, costumam ser apresentados com mais pompa do que o costume, e a chegada à ultima fase (a do reconhecimento do empirismo: - Estamos à procura doutra pessoa, ESTÁ BEM?) torna-se muito mais ridícula e, por isso, cómica.