Vale a pena esmiuçar as circunstâncias em que Alan Greenspan, o antigo presidente da Reserva Federal norte-americana, pronunciou a sua contrição que foi rapidamente transposta para cabeçalhos de jornais por esse mundo fora. Foi perante um Comité da Câmara de Representantes dos Estados Unidos que decorreu o seguinte diálogo entre Greenspan (usando notas previamente redigidas) e o Presidente da Comissão (o congressista Henry Waxman), tal qual foi relatado pela imprensa:
AG – A crise acabou por se tornar muito mais vasta do que eu poderia imaginar. Aqueles de nós que apontámos para o interesse das empresas emprestadoras em proteger a solvabilidade dos detentores das acções (a começar por mim) estão num estado de choque e de incredibilidade.
HW – O que eu quero saber é se estava errado…
AG – Eu cometi o erro de presumir que a preservação dos interesses das organizações, especificamente bancos e outras, se organizavam de uma tal maneira que eram as formas mais capazes de proteger os seus accionistas e a solvabilidade das próprias empresas. Encontrei uma falha. Não sei quão significativa será ou se ela será permanente. Mas fiquei muito preocupado por causa disso.
HW – Noutras palavras, descobriu que a sua visão do mundo, a sua ideologia, não estava correcta, não funcionava?
AG – Absolutamente, precisamente.
Como se percebe, durante todos os anos que esteve no activo, Greenspan foi pago para ter sempre imenso cuidado com aquilo que dizia e ainda não perdeu o jeito. Só que, por outro lado, Henry Waxman não é propriamente um parlamentar noviço: é ele que arranca de Greenspan a síntese que depois encheu os cabeçalhos de todo o mundo. De qualquer forma, por detrás dos cabeçalhos, há que saudar a atitude de Greenspan ao dar a mão à palmatória perante a nova realidade da crise financeira.
A atitude de Alan Greenspan é tanto mais de saudar quanto contrasta com a de antigos responsáveis da Administração Bush – um caso gritante é o de Donald Rumsfeld – que se recusam a aceitar tanto a realidade como a sua contribuição para que ela seja como é - má. A um nível de notoriedade menor e de responsabilidade nula, muitos defensores das soluções económicas liberais, entretanto distraídos, também poderiam tomar este gesto como um exemplo que reconhecer um erro não é o fim do mundo...
Mas, confesso que o que gostei mais, demonstração plena do ditado popular ninguém vê o argueiro no seu olho nem que ele seja como uma tranca, foi a celebração irónica com que a confissão de Greenspan parece ter sido acolhida entre os comunistas. Afinal, como um comunista veterano, Greenspan bem podia ter usado a argumentação que foi usada por eles em 1989: aceitar a falência (óbvia) do sistema, mas depois transferir as culpas desse fracasso para razões acessórias que não os erros da própria doutrina.
Este reconhecimento de Alan Greenspan, apesar de muito criticado, parece-me assim sóbrio e essencialmente honesto. É por isso que se me torna difícil assistir sem reagir, a gags como o de Vítor Dias, onde graceja com Alan Greenspan (entre outros) num poste onde ao cabeçalho de jornal Errei ao confiar no mercado livre!, responde ele em título Obrigadinho, chegaste mesmo a tempo! Pois quanto ao reconhecimento dos fracassos da sua ideologia, apetece-me acrescentar: …E há mesmo quem nunca lá chegue!
HW – O que eu quero saber é se estava errado…
AG – Eu cometi o erro de presumir que a preservação dos interesses das organizações, especificamente bancos e outras, se organizavam de uma tal maneira que eram as formas mais capazes de proteger os seus accionistas e a solvabilidade das próprias empresas. Encontrei uma falha. Não sei quão significativa será ou se ela será permanente. Mas fiquei muito preocupado por causa disso.
HW – Noutras palavras, descobriu que a sua visão do mundo, a sua ideologia, não estava correcta, não funcionava?
AG – Absolutamente, precisamente.
Como se percebe, durante todos os anos que esteve no activo, Greenspan foi pago para ter sempre imenso cuidado com aquilo que dizia e ainda não perdeu o jeito. Só que, por outro lado, Henry Waxman não é propriamente um parlamentar noviço: é ele que arranca de Greenspan a síntese que depois encheu os cabeçalhos de todo o mundo. De qualquer forma, por detrás dos cabeçalhos, há que saudar a atitude de Greenspan ao dar a mão à palmatória perante a nova realidade da crise financeira.
A atitude de Alan Greenspan é tanto mais de saudar quanto contrasta com a de antigos responsáveis da Administração Bush – um caso gritante é o de Donald Rumsfeld – que se recusam a aceitar tanto a realidade como a sua contribuição para que ela seja como é - má. A um nível de notoriedade menor e de responsabilidade nula, muitos defensores das soluções económicas liberais, entretanto distraídos, também poderiam tomar este gesto como um exemplo que reconhecer um erro não é o fim do mundo...
Mas, confesso que o que gostei mais, demonstração plena do ditado popular ninguém vê o argueiro no seu olho nem que ele seja como uma tranca, foi a celebração irónica com que a confissão de Greenspan parece ter sido acolhida entre os comunistas. Afinal, como um comunista veterano, Greenspan bem podia ter usado a argumentação que foi usada por eles em 1989: aceitar a falência (óbvia) do sistema, mas depois transferir as culpas desse fracasso para razões acessórias que não os erros da própria doutrina.
Este reconhecimento de Alan Greenspan, apesar de muito criticado, parece-me assim sóbrio e essencialmente honesto. É por isso que se me torna difícil assistir sem reagir, a gags como o de Vítor Dias, onde graceja com Alan Greenspan (entre outros) num poste onde ao cabeçalho de jornal Errei ao confiar no mercado livre!, responde ele em título Obrigadinho, chegaste mesmo a tempo! Pois quanto ao reconhecimento dos fracassos da sua ideologia, apetece-me acrescentar: …E há mesmo quem nunca lá chegue!
E que falha!Foi tal a intensidade, que provocou um sismo como há muito não se via na escala(da) do capitalismo.
ResponderEliminarMeu caro JRD, para manter-me à altura da sua metáfora, nem sei como classificar a hecatombe ocorrida em 1989.
ResponderEliminarTalvez só mesmo a famosa Extinção K-T do final do Cretáceo, quando desapareceram quase todas as espécies de grande porte de então.
Só ficaram os crocodilos, os tubarões e as tartarugas, ou seja, Cuba, a Coreia do Norte e o PCP...
Meu caro,
ResponderEliminarFalamos de escalas diferentes.
Já agora, talvez seja de ter em atenção as réplicas...