19 abril 2008

«SIDESHOWS» DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (6) – A CAMPANHA DAS ALEUTAS

Se houver um sítio realmente apropriado neste mundo para Judas ter perdido as suas famosas botas são as ilhas Aleutas. Trata-se de um arquipélago de ilhas de origem vulcânica, com a disposição de um rosário de cumes de uma cordilheira que assenta numa grande falha tectónica que, partindo do Alaska, vai perder-se no meio do Oceano Pacífico. Algumas dezenas das ilhas do arquipélago (que são mais de 300 no total) contêm vulcões activos. Com um clima assemelhando-se ao da Islândia, não surpreende que a população local seja escassa: eram cerca de 8.000 no censo de 2000.

Embora pertencente aos Estados Unidos, não fora a famosa expansão, a colonização interna e o mito da fronteira que assim tornara o extenso arquipélago norte-americano. Não havia nada de épico na transacção que em 1867 os norte-americanos haviam acertado com os russos, comprando-lhes o Alaska e, com ele, as ilhas Aleutas por 7,2 milhões de dólares. Não deixava por isso de ser um território verdadeiramente norte-americano (ao contrário de outras possessões coloniais) e foi contando com isso que os japoneses fizeram os seus planos de guerra.

Para os princípios de Junho de 1942, quando o Japão ainda detinha a iniciativa da Guerra, o seu Estado-Maior Imperial concebeu um ataque simultâneo de duas forças anfíbias protegidas por forças aeronavais: um dos alvos era o atol de Midway, à volta do qual se travou a Batalha Aeronaval que tem o seu nome (4 de Junho) e que é considerada um dos pontos de viragem da Segunda Guerra Mundial no Pacífico; o outro alvo eram as ilhas de Attu e Kiska, situadas no extremo ocidental (acima) da cordilheira de 1.900 km de extensão das ilhas Aleutas.

Ao contrário de Midway, em Kiska e Attu (6 e 7 de Junho) a vitória foi japonesa – e nem chegou a haver uma verdadeira resistência norte-americana. Os problemas começaram foi depois e primeiro para os japoneses. É que todos os reabastecimentos das guarnições tinham que ser importados e transportados à mão (e Attu tem 893 km²…) em condições meteorológicas horríveis: um pesadelo logístico. Os norte-americanos estabeleceram um verdadeiro bloqueio naval aos comboios de reabastecimentos japoneses, que precisavam de escoltas poderosas.

Num desses encontros, travou-se a quase desconhecida Batalha Naval das ilhas Komandorski* (27 de Março de 1943), provavelmente a última batalha naval travada nos termos clássicos entre armadas de grandes potências (com duelos de artilharia e torpedos, mas sem intervenção de meios aéreos). O resultado da batalha foi inconclusivo, os norte-americanos – em desvantagem material – tiveram a sorte do seu lado, mas parte dessa sorte foi consequência das cautelas do Almirante japonês com os meios aeronavais norte-americanos – que, por acaso, daquela vez não existiam…

De qualquer modo, passado pouco mais de um mês, em 11 de Maio, os norte-americanos desembarcaram em Attu. Dada a extensão da ilha, os japoneses haviam decidido não se opor aos desembarques mas entrincheirarem-se nas montanhas donde lançaram um contra ataque suicida final em 29 de Maio, num local que ficou conhecido como a Baía do Massacre… Os norte-americanos só fizeram 28 prisioneiros, mas, de entre as quase 4.000 baixas sofridas, menos de metade haviam sido causadas directamente pelos japoneses. O frio, acidentes e doenças haviam feito o resto…

Para que se evitasse uma repetição do mesmo, o desembarque de 15 de Agosto em Kiska foi precedido e acompanhado de um bombardeamento maciço das unidades navais que acompanharam as forças anfíbias (norte-americanas e canadianas) que ali desembarcaram. Estragando o enredo do final desta história, os japoneses haviam evacuado prévia e camufladamente a ilha… Mesmo assim, entre mortes causadas por fogo amigo, por armadilhas deixadas para trás pelos japoneses ou por acidentes e doença chegou-se a um total de 313 mortos e quase 3.000 baixas…

Ainda hoje se especula sobre quais seriam as intenções japonesas ao conquistar aquelas duas ilhas. Há quem afirme que era um ataque para dispersar a atenção dos norte-americanos da ofensiva sobre Midway; há quem defenda que se destinava a criar um ponto de defesa avançado contra quaisquer ataques contra o Japão vindos por aquele flanco norte**. O que não levanta dúvidas é o potencial de combate e os efectivos que cada antagonista empenhou: no final da Campanha do lado dos Aliados haviam sido 144.000, do lado do Japão 8.500…

* A Batalha Naval travou-se a 160 km a Sul das ilhas Komandorski que eram soviéticas, potência que era então neutral naquele Teatro de Operações.
** Pessoalmente prefiro a primeira explicação. A segunda, tendo em consideração os enormes problemas logísticos com que os dois lados se defrontaram, parece uma daquelas explicações de estratega que esquece as realidades por detrás dos mapas e que acha que eles são iguais a tabuleiros de xadrez

2 comentários:

  1. Lido com muito interesse.
    Agradeço a sugestão de leitura dos posts de Jan. e Fev. 2007. Neste último encontrei no 3º paragrafo a confirmação da "timida" ideia que já tinha sobre a (não) postura de ambas as potências.
    Bfs

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  2. Esta campanha foi, quanto a mim, das mais curiosas.
    Continuo interessadíssima nestes episódios que me têm ajudado imenso a "resituar-me" no que diz respeito à segunda guerra mundial.
    Continua.

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