15 abril 2008

«SIDESHOWS» DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (3) – A CAMPANHA SÍRIO-LIBANESA DE JUNHO E JULHO DE 1941

Este será um dos casos em se compreendem as razões porque terá sido um sideshow. Em primeiro lugar, porque a Campanha Sírio-Libanesa travou-se entre forças armadas sob comando britânico mas das mais variadas proveniências (britânicas, australianas, indianas, árabes, judaicas e ainda unidades francesas afectas à França Livre) que invadiram a Síria e o Líbano, e que se defrontaram com as defesas do Exército francês fiel ao regime de Vichy. Para as relações anglo-francesas é um daqueles conflitos que as duas partes envolvidas esqueceram depois de muito bom grado…

Por outro lado, com franceses combatendo dos dois lados, por vontade do General de Gaulle e apesar das opiniões contrárias da maioria dos que o rodeavam (como Leclerc), tratou-se colateralmente de um episódio sangrento de uma Guerra Civil francesa, assunto que também não interessará realçar. Culminado as causas para o esquecimento, a campanha teve lugar simultaneamente com uma das mais famosas operações de toda a Segunda Guerra Mundial, a da invasão da União Soviética pela Alemanha (Operação Barbarossa), que foi desencadeada a 22 de Junho de 1941.
As facilidades concedidas pela Administração Colonial francesa às esquadrilhas em trânsito da Luftwaffe* quando elas foram apoiar o exército iraquiano na sua guerra contra os britânicos em Maio de 1941, foram as razões próximas para precipitar a decisão de Winston Churchill em neutralizar as atitudes dúbias de uma Administração obediente a Vichy no Próximo Oriente. Dúbia até ao fim, o General Henri Dentz (acima, com Pétain), o Alto-Comissário francês, recusou o auxílio que alemães e italianos lhe propuseram, ao mesmo tempo que punha o maior empenho na resistência à invasão.

Apesar de invadidos por dois lados (Palestina e Iraque), e ao contrário dos sideshows já aqui mencionados, na Síria a moral dos combatentes e a qualidade do material equivaliam-se. A resistência dos franceses de Vichy mostrava-se tenaz contra os outros, mas particularmente feroz contra os seus compatriotas gaullistas. O Ás da aviação francesa Pierre Le Gloan cobriu-se de glória abatendo 7 aviões britânicos. Foi a falta dos reabastecimentos (que teriam de vir por mar, quando o Mediterrâneo Oriental pertencia aos britânicos…) que acabou por vergar a resistência dos defensores.
Mesmo no curso das negociações para a rendição, a política interna francesa sobrepor-se-á às realidades internacionais, com o General Dentz** a exigir ignorar o General Georges Catroux, representante da França Livre, e assinando o Armistício do Acre apenas com os britânicos. O local (São João do Acre foi a última possessão dos cruzados na Terra Santa) e a data (14 de Julho de 1941, data da queda da bastilha) da assinatura eram cheios de significado para os franceses. E os 37.736 vencidos sobreviventes eram agora prisioneiros de guerra, criando um outro problema político delicado.

Para de Gaulle, o problema nem se devia colocar: pretendendo passar por corporizar a França, os elementos aprisionados do Exército francês deveriam ser incorporados sem quaisquer questões adicionais, para se redimirem dos erros do passado... Mas os britânicos, mais realistas, impuseram a livre opção individual e daquele total, apenas 5.688 (ou seja 15%) escolheram aderir à França Livre; os restantes preferiram ser repatriados. À falta de indicador melhor, este é um bom indício do que valeria a popularidade do General de Gaulle entre os franceses no Verão de 1941…
Pormenor irrelevante mas interessante: foi nesta campanha que Moshe Dayan (acima) recebeu o ferimento no olho que o obrigou a usar uma pala para o resto da vida. Os binóculos que estava a usar foram atingidos por uma bala e os estilhaços do mesmo destruíram-lhe o olho e o globo ocular de tal forma que não podia usar prótese. O mediático General israelita era então um mero intérprete*** duma unidade australiana e, ironicamente, a bala que o atingiu e desfigurou era tão francesa quanto os caças Mirage III que, conjuntamente consigo, fazem parte dos ícones da vitória israelita na Guerra dos Seis Dias de 1967…

* Força Aérea alemã.
** Henri Dentz - um oficial de mérito indiscutível, foi o primeiro do seu curso em Saint Cyr - foi condenado à morte em 1945 como colaboracionista. Charles de Gaulle (magnânimo…) comutou a pena em prisão perpétua. Dentz morreu na prisão em Dezembro de 1945.
*** Não foi só o Mourinho a começar uma grande carreira pelas traduções… Ao contrário de Dentz, tanto Dayan como Mourinho são conhecidos pelas dúvidas que suscitam quanto à parte da fama que devem à sua competência técnica ou à sua vocação mediática...

2 comentários:

  1. Li e, mais uma vez, fartei-me de aprender coisas; umas mais importantes no decurso da história, outras mais curiosas.
    Aguardo os próximos episódios.

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  2. Como algumas destas apreciações até tem uns laivos de análise estratégica, fico contente por as apreciares sem as estranhares...

    Vais ver que, depois da tua recensão:
    (http://donagataempontodecruz.blogspot.com/2008/04/ameaa-global-o-imprio-em-cheque-guerra.html

    a Estratégia pode ser assim como aquele famoso anúncio da Tónica Schweppes: aprende-se a gostar...

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