21 fevereiro 2020

OS AMIGOS DE SEREM «AMIGOS»

Faleceu Joaquim Pina Moura. Há dias falecera Álvaro Barreto. Mas falemos mais do primeiro. Nestas ocasiões, há as notas de pesar da presidência da República e do governo (caso seja caso disso) e está convencionado que simultaneamente surge um circuito de declarações daqueles que são (ou foram) considerados politicamente próximos do falecido, manifestando os protestos da maior amizade por quem acabou de partir - os eufemismos e a omissão dos seus aspectos mais controversos são exigências da etiqueta do ambiente. Assim como os exageros, muitas vezes toscos e outros tantas inverosímeis; o defunto fora, frequentemente, um grande amigo. Eu, que tinha só suspeitas que todas aquelas proclamações de amizade eram falsas, tive ocasião, há uns tempos, de o comprovar em pleno quando do falecimento de uma figura pública que me era bastante próxima, e que eu descobri via televisão, rádio e jornais, ter, depois de morto, amigos e pessoas que o conheciam muito bem a quem eu nunca o ouvira fazer em vida a mínima referência. Em lugar de destaque nessa cenografia dos grandes amigos, gostaria de destacar Jorge Coelho, cujo extensíssimo leque de pessoas que ele assim qualifica faz parte do anedotário nacional: é o caso agora do falecimento do amigo Pina Moura, como fora o caso anteriormente do falecimento do amigo Almeida Santos em 2016, como havia sido o caso - e esse felizmente ainda está vivo - da visita ao grande amigo que estava alojado no estabelecimento prisional de Évora: José Sócrates em 2014. Mas, desta vez, aprofundemos a crítica a este expediente para além do tradicional bombo da festa que é a figura semi-caricatural de Jorge Coelho. Escolhamos um outro amigo de ser amigo, o embaixador Seixas da Costa, que também é um amigo professo de Pina Moura, conforme confessou à rádio do Observador. «Morreu-me um amigo», começa ele por escrever no seu blogue. O que é pena é que, como se percebe pela leitura do penúltimo parágrafo daquele texto, «há já quase uma década» que os amigos não se falavam... E isto será até a versão benigna da intimidade dos dois amigos, Pina Moura e Seixas da Costa. Todos teremos conhecido na nossa vida pessoas com essas características, pessoas com quem privámos mais intimamente numa certa fase da vida mas de quem depois nos apartámos, sem que qualquer das partes se esforçasse por manter o contacto posteriormente. Designar por amizade o que subsiste numa relação dessas é um daqueles descaramentos que uns têm... e outros não. O que os primeiros não costumam estar habituados é a ouvir a opinião crítica dos segundos quanto aos seus exageros. Caso aqui do embaixador, que é apenas menos ridículo que Jorge Coelho.

2 comentários:

  1. Talvez não saiba, mas deveria saber antes de falar de cátedra, que, precisamente na última década, em parte da qual eu vivi no estrangeiro, JPM sofreu de uma grave doença degenerativa que progressivamente o afastou do contacto com as pessoas amigas. Mas, pelos vistos, isto é indiferente para quem apenas pretende fazer chicana de mau gosto. FSC

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  2. Infelizmente, muitos de nós já terão passados por situações análogas à que descreve com Pina Moura (que me explicou presumindo que a desconhecia quando escrevi o que escrevi), em que assistimos, constrangidos, a ver amigos (verdadeiros amigos) a degenerar e a perder as suas faculdades. Também comigo aconteceu recentemente, no caso que até mencionei no poste. E essa é precisamente a ocasião que normalmente reputamos importante para que os amigos apoiem os amigos. Como se costuma dizer: «os amigos são para as ocasiões». No caso concreto que referi, a presença de uns e o desaparecimento de outros serviu para diferenciar os amigos dos «outros», os tais que depois apareceram à hora do funeral a reclamarem-se de uma amizade e proximidade que os factos desmentiam. Por isso, tem toda a razão quando escreve que falo de cátedra.

    Mas não a tem (razão) quando arrisca considerar que me é indiferente realçar ou ignorar a sua chicana. Sim, porque a minha atitude, que classifica de «chicana de mau gosto», é apenas uma reacção à sua «chicana de bom gosto». Não se convença, pela ausência de reacções, que os outros são todos parvos e que as suas chicanas passam desapercebidas.

    PS – Aquela sua justificação de que parte do último decénio até vivera «no estrangeiro» está a tornar-se um pouco gasta. Se a sua biografia estiver certa, desde 2013, ou seja, há sete anos(!) que abandonou o posto em Paris. Nesses sete anos, nunca lhe deu para visitar o seu amigo Joaquim Pina Moura? Pelos vistos, não. A amizade, às vezes, é fodida. A verdadeira.

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