Se é possível que exista um Acordo de Cavalheiros entre antigos Presidentes da República que Mário Soares recentemente desrespeitou, também é possível que exista um outro Acordo protegendo de ataques severos àqueles políticos de provecta idade que se mostrem francamente a caminho da senilidade. Dei por mim a pensar que, mesmo que não mereça, felizmente para Mário Soares esse Acordo parece ser respeitado. É que a entrevista que Mário Soares deu à revista Visão desta semana sobre o seu exílio forçado em São Tomé tem momentos embaraçosamente inacreditáveis.
Suponho ser de Bismarck o comentário acerca dos três momentos onde não se deve dizer a verdade: antes das eleições, durante a guerra e depois da caça (ou da pesca). Há muito tempo (leiam-se os livros sobre Soares de Maria João Avillez) que se sabe como Mário Soares parece ter uma memória prodigiosa para transformar os acontecimentos passados em enormes pescarias. Mesmo em episódios escorregadios, que são submetidos a severo escrutínio, como é o caso do 25 de Novembro de 1975, a versão de Soares não é parecida com a de nenhum protagonista, mas é muito mais imaginativa...
Nesse aspecto estrito da imaginação, adivinha-se que a idade esteja a fazer de Mário Soares um memorialista cada vez melhor, numa verdadeira linha de guionista de Hollywood: Não é verdade, mas poderia ter sido, e quando assim contado fica com muito mais piada. É que pelo prisma de Soares, no Portugal de 1968 e 69 ele já era uma vedeta, conhecida por quase todos os portugueses e temido pelo poder, que lhe receava a popularidade. Soares faz Abranches Ferrão perguntar: - Porque é que não se fazem eleições livres? Para Melo e Castro* responder: - Porque o Mário Soares ganhava…
À distância de 40 anos e com aqueles protagonistas é impossível confirmar diálogos como os de cima, assim como as variadas peripécias vividas em São Tomé que foram também contadas pelo entrevistado, em que consistentemente os membros da PIDE fazem figuras de estúpidos. Mário Soares parece ali o herói de um filme de Steven Seagal, sem uma beliscadura nem uma contrariedade (tirando o exílio). A certa altura Soares fala da Guerra do Biafra (1967-70) que então se travava: (…) E voos de abastecimento de armas ao Biafra, que era católico, contra a Nigéria, que era protestante.
Acontece que, como já aqui expliquei num poste, o Biafra era maioritariamente cristão (incluindo tanto católicos como protestantes) enquanto as forças federais da Nigéria eram maioritariamente muçulmanas… Não deixa de ser simbólico e significativo que num dos raros aspectos da entrevista que é historicamente verificável, Mário Soares se estenda assim ao comprido… Pouco plausíveis mas divertidas como os filmes de Hollywood, as histórias contadas por Mário Soares tendem a tornar-se cada vez mais aqueles peixes enormes que uma vez, o avôzinho esteve quase, quase a apanhar…
* José Guilherme de Melo e Castro, dirigente da comissão executiva da União Nacional, figura central da chamada primavera marcelista.
Suponho ser de Bismarck o comentário acerca dos três momentos onde não se deve dizer a verdade: antes das eleições, durante a guerra e depois da caça (ou da pesca). Há muito tempo (leiam-se os livros sobre Soares de Maria João Avillez) que se sabe como Mário Soares parece ter uma memória prodigiosa para transformar os acontecimentos passados em enormes pescarias. Mesmo em episódios escorregadios, que são submetidos a severo escrutínio, como é o caso do 25 de Novembro de 1975, a versão de Soares não é parecida com a de nenhum protagonista, mas é muito mais imaginativa...
Nesse aspecto estrito da imaginação, adivinha-se que a idade esteja a fazer de Mário Soares um memorialista cada vez melhor, numa verdadeira linha de guionista de Hollywood: Não é verdade, mas poderia ter sido, e quando assim contado fica com muito mais piada. É que pelo prisma de Soares, no Portugal de 1968 e 69 ele já era uma vedeta, conhecida por quase todos os portugueses e temido pelo poder, que lhe receava a popularidade. Soares faz Abranches Ferrão perguntar: - Porque é que não se fazem eleições livres? Para Melo e Castro* responder: - Porque o Mário Soares ganhava…
À distância de 40 anos e com aqueles protagonistas é impossível confirmar diálogos como os de cima, assim como as variadas peripécias vividas em São Tomé que foram também contadas pelo entrevistado, em que consistentemente os membros da PIDE fazem figuras de estúpidos. Mário Soares parece ali o herói de um filme de Steven Seagal, sem uma beliscadura nem uma contrariedade (tirando o exílio). A certa altura Soares fala da Guerra do Biafra (1967-70) que então se travava: (…) E voos de abastecimento de armas ao Biafra, que era católico, contra a Nigéria, que era protestante.
Acontece que, como já aqui expliquei num poste, o Biafra era maioritariamente cristão (incluindo tanto católicos como protestantes) enquanto as forças federais da Nigéria eram maioritariamente muçulmanas… Não deixa de ser simbólico e significativo que num dos raros aspectos da entrevista que é historicamente verificável, Mário Soares se estenda assim ao comprido… Pouco plausíveis mas divertidas como os filmes de Hollywood, as histórias contadas por Mário Soares tendem a tornar-se cada vez mais aqueles peixes enormes que uma vez, o avôzinho esteve quase, quase a apanhar…
* José Guilherme de Melo e Castro, dirigente da comissão executiva da União Nacional, figura central da chamada primavera marcelista.
Coitado, a idade também já não o ajuda, embora a verdade é que o senhor sempre me pareceu ter uma veia muito especial para a criatividade.
ResponderEliminarMas será que não teve sempre essa "idade"?
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