Apesar de Alexandre ser um nome de origem grega – basta lembrarmo-nos de Alexandre Magno – e da cultura e religião gregas (o cristianismo ortodoxo) terem sido extremamente influentes na formação da Rússia, o nome Alexandre era aí quase desconhecido quando o czar Alexandre I (1777-1825) ascendeu ao trono (1801), depois de uma conspiração que terminou com o assassinato do seu pai, o czar Paulo I (1754-1801). Na Europa aristocrática, sobretudo depois da execução de Luís XVI, isso foi considerado um episódio demasiado impróprio para uma corte civilizada, mas em São Petersburgo sempre se soube que o embaixador britânico a incentivara e que Alexandre sempre estivera ao corrente da conjura.
Depois de Pedro I, o Grande (1672-1725), uns cem anos antes, nunca um czar russo merecera um tal interesse na Europa, mas também, com as sucessivas Guerras Napoleónicas e a alteração consecutiva das suas fronteiras e dos seus equilíbrios internos, nunca se haviam propiciado tais condições para que a Rússia desempenhasse um papel tão importante na evolução do continente. Ainda hoje, a personalidade de Alexandre é um assunto que tem tanto de atractivo como de controverso. Raras vezes um monarca terá sido e permanecido tão incensado. Leo Tolstoi põe uma das suas personagens do seu clássico Guerra e Paz (concluído meio século depois), a proferir um dos mais rasgados elogios a Alexandre:
O nosso bom e maravilhoso imperador tem o maior papel a desempenhar no Mundo. É tão virtuoso e bom que Deus não o abandonará e ele cumprirá o seu glorioso destino de esmagar a hidra da Revolução, actualmente mais terrível ainda sob os traços daquele assassino e salteador. Esta última referência é obviamente a Napoleão, e a pretensa modéstia de Alexandre ainda o tornava mais simpático quanto em comparação com o seu grande rival; em Dezembro de 1812, em Vilnius (na Lituânia), depois da enorme derrota de Napoleão na sua frustrada Campanha da Rússia, Alexandre anunciava aos seus generais: Meus Senhores, Vós não haveis salvado apenas a Rússia, também salvaram a Europa. Mas, na intimidade, Alexandre tinha momentos de fraqueza: Às vezes apetece-me dar com a cabeça nas paredes e se pudesse abandonar honrosamente esta função, fá-lo-ia de bom grado, pois não conheço nenhuma mais difícil que esta e não tenho vocação para o trono. Visto através dos olhos do realismo cruel dos homens de governo que o acompanharam ao longo da vida, apoiando-o ou defrontando-o, havia muito de verdade naquela confissão. Embora tivesse um temperamento naturalmente simpático e generoso, também facilmente se melindrava com pormenores. Ao mesmo tempo que se mostrava fraco de carácter e desejoso de agradar a todos era extremamente teimoso o que o fazia fácil de influenciar mas difícil de orientar.
Enfim, são pormenores de carácter de um governante num tempo em que, na Rússia, o poder do monarca era absoluto e imperava a regra da hereditariedade para o alcançar. Actualmente, as coisas parecem ter mudado muito mais na forma que na substância. As referências ao poder na Rússia continuam a ser fortemente personalizadas (não se fala do Governo da Rússia, quase ninguém conhece os seus ministros) e, quanto às regras para o alcançar, ainda hoje se especula sobre o conteúdo do acordo que terá sido firmado entre Putin e o seu predecessor Yeltsin, que permitiu ao primeiro assumir o cargo de Presidente interino em 1 de Janeiro de 2000 e assim disputar as eleições presidenciais de Março de 2000 numa posição privilegiada.
Com certeza que no futuro também se virão a escrever retratos psicológicos deste czar Vladimiro II*, mas entretanto, e a propósito do recente conflito entre a Rússia e a Geórgia, vale a pena fazer a comparação destes com os tempos de Alexandre I, para perceber quanto o Império Russo encolheu e perdeu poder. É que em 1801, um dos primeiros actos do reinado de Alexandre I foi a formalização da anexação da Geórgia ao Império Russo. Claro que os tempos eram distintos e os georgianos tinham inimigos muito mais ferozes do que os russos, como eram os casos dos turcos e dos persas. Estes últimos haviam saqueado Tbilissi em 1795. Numa análise estratégica distanciada, a Rússia está a bater-se por posições que considerou suas por 200 anos.
* O primeiro czar com esse nome foi Vladimiro Ulyanov (1870-1924), que é mais conhecido pelo nome de Lenine.
Tblissi sempre teve muitos garanhões a montá-la, uns explicita outros implicitamente, como é o caso do George que também se quer pôr na Geórgia, só que o actual cavaleiro não sai de cima.
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