01 fevereiro 2022

UMAS CONSIDERAÇÕES A VER SE ME PASSA A AZIA PELA VITÓRIA DE ANTÓNIO COSTA

Apesar da azia que sinto no estômago por causa do desfecho das eleições de Domingo, neste arrumar de casa entre mal dispostos, ele há reacções que eu tenho dificuldade em compreender, caso exemplar é este texto acima de João Miguel Tavares, que, no até ao lavar dos cestos é vindima, a vindima é o arriar - ainda e sempre - em Rui Rio, ainda que num formato imaginativamente farçola. Confissão por confissão e «como imaginam», eu não gosto de João Miguel Tavares, «não aprecio o estilo» e quanto às ideias, mesmo quando concordo com o que ele escreve - por exemplo, quando ele escreveu em Janeiro de 2020 que Rui Rio é(ra) o melhor líder para o PSD, a minha suspeita instintiva é que alguém lhe tivesse explicado a conclusão, porque sozinho ele nunca teria chegado . Há um grande hiato entre certas coisas que lhe leio e outras coisas que ele escreve. Aquele alguém hipotético, a que me refiro mais acima, é capaz de estar confinado por causa da covid, e só lhe sugeriu o título do artigo de hoje do Público - A direita está enganada: a culpa não foi de Rui Rio - sem que tivesse tido oportunidade de rever depois o seu conteúdo e o resultado é que as coisas que João Miguel Tavares assinou acabam por se contradizer em parte. Assim, o parágrafo do artigo que destaquei, e «os três coelhos trucidados» por Rui Rio no Domingo, merecem um parágrafo equivalente de comentário: 1) porque ler um comentário desdenhoso sobre contas certas da parte de um autor que escreveu um livro para criancinhas a explicar o que era a crise em 2012, com o patrocínio do simpático ministro Vítor Gaspar, é de uma contradição clamorosa; se as criancinhas ainda tiverem o livro guardado ficarão certamente muito intrigadas com a completa reviravolta da importância do assunto; 2) porque João Miguel Tavares está ali a fazer um jogo de palavras de má fé entre o partido ser de direita (Rio sempre insistiu que o PSD era do centro e argumentou que era com os eleitores de centro que se ganhavam eleições) e a necessidade da constituição de um governo de direita, caso a direita ganhasse; se o eleitorado de direita não quis votar concentradamente no PSD como o da esquerda o fez no PS, foi a questão que Rio mencionou; 3) falar em alemão para o jornalista (...da CMTV), que tornava a perguntar precisamente a mesma coisa, como que ignorando descaradamente aquilo que Rui Rio acabara de anunciar, foi a fórmula mais subtil e, ao mesmo tempo, honesta, de mandar naquele momento o jornalista à merda; e, sendo tantas e tão arrogantes as faltas de educação que os vemos cometer à frente das câmaras, se os jornalistas merecem ser mandados à merda!*
Mas, ainda a propósito disso, do tema que suscitou a pergunta obtusa do tal jornalista da CMTV e a resposta irónica na língua de Goethe de Rui Rio, o tema da falta de sentido da sua continuidade por mais quatro anos à frente do PSD, vale a pena recordar (já que João Miguel Tavares e outros órfãos de um PSD assumidamente de direita não o farão certamente) que, apesar das movimentações darem uma outra impressão, ainda não se completaram quatro anos desde que Rui Rio assumiu a presidência do partido. De facto, e como se pode ver acima, foi só em meados de Fevereiro de 2018 que se realizou o congresso de transição e foi só no fim desse mês que Pedro Passos Coelho abandonou o parlamento, não acabando essa legislatura que lhe estava a correr pessimamente, já que apostara as fichas todas no fracasso do funcionamento da geringonça (Se a estratégia resultar, defenderei o voto no PS, no PCP e no BE) quando a evolução dos acontecimentos foi a que foi. Se vale a pena voltar ainda um pouco a esse passado recente, é que uma análise que fiz das três últimas eleições legislativas (2015, 2019, e agora 2022) quanto às votações em bloco da esquerda e da direita remetem para uma conclusão curiosa. Por esquerda consideremos o PS, o BE, o PCP e o Livre e por direita, o PSD, o CDS, e, mais recentemente, o Chega, a IL e mesmo a Aliança. É curioso descobrir que a votação na esquerda é praticamente a mesma nas três eleições: foi de 2.784.000, 2.789.000 e 2.792.000 votos, respectivamente (embora no último caso faltem ainda alguns milhares de votos da emigração). O que se alterou foi a distribuição interna desse voto: passou de um pouco menos de 63% para o PS em 2015, para mais de 80% agora em 2022. Pelo contrário, a votação da direita modificou-se ao longo das três eleições: depois de se ter cifrado no que era então considerado um mínimo histórico (2.085.000 em 2015), explicado naturalmente pelo trauma da troika, importa enfatizar que a votação da direita portuguesa veio a alcançar novo mínimo histórico em 2019 (1.850.000 votos). Portanto, o nadir da popularidade da direita portuguesa não ocorreu na sequência imediata da impopularidade da aplicação das medidas da troika, ocorreu quatro anos depois, quando se comprovou, na prática, que o discurso passista de que «não havia alternativa», e de que se não fizesse como ele dizia, «iria correr tudo muito mal», esse discurso foi completamente desmentido. Só agora, e à custa quase exclusivamente das duas novas formações (Chega e IL), é que a votação cresceu em quase meio milhão de votos (2.320.000 em 2022, resultados também sem emigração). Conclusão aritmética: se a direita quiser voltar ao poder, tem que ir buscar ainda o meio milhão de votos para alcançar o número de votos que alcançou em 2011 (2.813.000) e que andam fugidos desde então - especule-se lá porquê... Quanto à identidade de quem agora pode protagonizar essa conquista futura do meio milhão de votos em falta, quando Rui Rio parece pretender retirar-se (e bem!), se o clube de nostálgicos de Pedro Passos Coelho (de que João Miguel Tavares parece fazer parte) continuar a insistir que a direita tem aquele «líder natural» (para recuperar a expressão destes dois cromos abaixo...), e a sua ideia vingar, seja pelo retorno ao activo de Passos Coelho, seja por uma versão Passos Coelho 2.0, então, infelizmente, vamos ter esquerda no poder por muitos e muitos anos, muito mais crónicas à Frei Tomás de João Miguel Tavares... E eu lembro-me do que foi o cavaquismo tardio, com Catrogas e outras coisas inacreditáveis.
* Por sinal, já aqui assinalei apreciativamente uma outra ocasião similar (uma conferência de imprensa na sequência de uma derrota eleitoral), em que a jornalista (da RR) colocou uma questão - muito vaiada pela assistência - a José Sócrates que o tempo veio a tornar completamente pertinente. Não me parece ter sido o caso do jornalista da CMTV: era uma insistência obtusa - é uma dúvida irrelevante concluir se o jornalista era genuinamente estúpido ou se estava a passar por - numa questão que já fora abordada e sobre a qual Rui Rio não ia acrescentar mais nada.

Adenda de dia 5: O «ghost writer» de João Miguel Tavares parece já deve ter tido alta e tê-lo-á posteriormente ajudado com as aritméticas da noite eleitoral. Para concluir, nas variações de votos de 2019 para 2022, que o «PS perdeu muitos votos para a direita, nomeadamente para Rui Rio» e que «Rui Rio teve de ir buscar muitos votos ao centro e ao PS». Enfim, em tese, aquela coisa de disputar os votos do centro talvez não fosse assim tão estúpida. Este outro João Miguel Tavares é muito mais lúcido do que aquele que escreveu no dia seguinte às eleições.

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