Aquilo que está a acontecer nos Estados Unidos, dias consecutivos de protestos nas ruas por causa de uma morte controversa devida a uma intervenção policial na pequena e esquecida cidade de Ferguson (21.000 habitantes) no Missouri afigura-se-me ser apenas mais um daqueles recorrentes episódios que sociedades complexas como a norte-americana aparecem dispostas a suportar para manter as suas complexas regras de funcionamento. Para quem observa os acontecimentos de fora, é até possível admitir – como me aconteceu – que as autoridades poderão estar com alguma razão no caso concreto que detonou estes protestos mas reconheça-se que aquilo que os Estados Unidos mostram de si no que concerne a actuações policiais e relações raciais, acaba por (n)os colocar naturalmente ao lado dos contestatários.
Programas televisivos como Cops e aparentados, que serão produzidos para as audiências domésticas com o propósito de dissuasão e de transmitir tranquilidade, funcionam de forma inversa quando são transmitidos no estrangeiro: torna-se assustador imaginarmo-nos a cair nas mãos despóticas de um agente da lei norte-americano… O único cuidado que se extrai daquelas situações acaba por resultar irónico (daí o título deste poste) por causa da hipocrisia consubstanciada na forma de tratamento: não se tratam os negros por pretos mas arreia-se-lhes com uma sem cerimónia surpreendente... nos africano-americanos. Deixem-me antecipar-vos que creio que estes motins terminarão por si, como aconteceu anteriormente em Watts (1965) ou em Los Angeles (1992). A fotografia inicial é de Elliot Erwitt, data - premonitoriamente - de 1950.
Adenda1: Nem de propósito, para evidenciar as distinções entre cá e lá, numa notícia local lê-se que cinco GNR se deixaram ferir quando se dispunham a dispersar uma rave party no Alentejo, assim ficando com o papel de vítimas perante a opinião pública. No Missouri é diferente: agride-se (e chega a matar-se) os civis para que sejam eles a ficar com o capital da vitimização...
Adenda2: Há que reconhecer que, com seis tiros no corpo, dois dos quais na cabeça, conforme constará do relatório da autópsia, torna-se bastante mais difícil dar alguma razão à conduta policial...
Adenda2: Há que reconhecer que, com seis tiros no corpo, dois dos quais na cabeça, conforme constará do relatório da autópsia, torna-se bastante mais difícil dar alguma razão à conduta policial...
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