Há 110 anos, Rafael Bordalo Pinheiro dedicou duas páginas no seu jornal humorístico A Paródia a desenhos alusivos às cerimónias do funeral de Eça de Queirós (acima), aproveitando a ocasião para mostrar como se podia ser irónico sobre a sociedade da época sem desrespeitar a memória do escritor então falecido. É esse o espírito que vou tentar manter neste poste a respeito do recém-falecido Saldanha Sanches e dos tempos gloriosos do PREC. O que eu me recordo é que, logo depois do 25 de Abril, Saldanha Sanches se tornou conhecido, não propriamente como um rosto¹, mas como um nome repetidamente pintado por quase todas as paredes aproveitáveis de Lisboa, que denunciavam a prisão do director do Luta Popular (acima). Parecia coisa grave, mas os apelos para que todos promovêssemos a sua libertação imediata eram pincelados com uma redacção irritantemente imperativa... Com a minha cultura política actual, percebo agora que essa ausência da imagem do injustiçado director preso não era casual. Estava-se em tempos onde osdirigentes eram grandes, mas as tolerâncias à discordância eram mínimas, onde, como os acontecimentos de Oriente tinham mostrado, a organização onde Sanches militava apenas deveria dever obediência a um Grande Dirigente e Educador do Proletariado Português como o do cartaz acima: Arnaldo Matos. Depois de se promover dentro do MRPP uma espécie de mini-revolução culturalmuito à nossa maneira, aLinha Vermelha do Grande Matos tinha de triunfar sobre a Linha Negra do Renegado Sanches (acima). Mas, perante esta reacção de simpatia que a morte de Saldanha Sanches tem gerado, apesar do tempo, não pude deixar de sorrir à ideia de que esta onda de simpatia se trate de uma desforra tardia da suaLinha Negra sobre aLinhaVermelha…
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