10 dezembro 2008

OS ESTADOS PRINCIPESCOS DA ÍNDIA – 2

Cronologicamente, o primeiro Estado Principesco a divergir em relação à solução ou Índia ou Paquistão nem o fez por razões religiosas. Travancore tinha 18.000 km² e 3 milhões de habitantes e situava-se na ponta sudoeste da península indiana no extremo meridional da Costa do Malabar. Embora a maioria da população local fosse hindu, a região será a mais cosmopolita do ponto de vista religioso de toda a Índia: no actual Estado de Kerala que resultou da junção de Travancore com as regiões adjacentes, 56% da população são hindus, 25% são muçulmanos e 19% são cristãos.

Embora não fosse um dos Estados Principescos mais importantes (o Maharaja tinha direito apenas a 19 salvas de canhão…), Travancore possuía um percurso histórico peculiar: havia vencido uma armada holandesa em 1741, na Batalha de Colachal, uma das raras vezes, depois da chegada de Vasco da Gama (1498), em que um país asiático vencera uma potência europeia até à Batalha de Tsushima (1905). Pormenor curioso: o Almirante vencido, o flamengo Eustáquio de Lannoy acabara por ficar na Índia ao serviço do vencedor, modernizando-lhe a Marinha e o Exército.
Aquele que se tornara o homem forte de Travancore a partir de 1936 também era, de uma certa forma, um estrangeiro. Apesar do seu nome complexo, Chetpat Pattabhirama (C.P.) Ramaswami Aiyar era um advogado de sucesso, completamente ocidentalizado, que nascera em Madrasta, região de cultura tamil. Originalmente colaborara com o Partido do Congresso (fora seu secretário, conjuntamente com Nehru, no período 1917-18) mas inflectira na sua carreira para uma atitude mais colaborante com os britânicos. Fora já com o seu título de Sir que aceitou o cargo que o Maharaja lhe ofereceu.

Sir C.P. (abaixo), como passou a ser conhecido, no melhor estilo britânico de abreviar um nome demasiado complexo para pronunciar, tornou-se assim o Dewan (chefe de governo) de um Estado onde o Maharaja não se mostrava particularmente entusiasmado em exercer o poder. Como um advogado atento, logo desde Fevereiro de 1946, Sir C.P. antecipara quais seriam as consequências legais do abandono da Índia pelos britânicos: o Estado de Travancore readquiriria o estatuto de independência que gozara até 1795, data da assinatura do Tratado que firmara com a Companhia das Índias Orientais…
Apesar da forte influência local do Congresso e também do Partido Comunista Indiano, apesar das pressões vindas de Nova Deli, onde se contavam também as do Vice-Rei Lorde Mountbatten, o Dewan mostrava-se inflexível na sua determinação de que Travancore a partir de 15 de Agosto de 1947 seguisse um caminho distinto do da Índia e do Paquistão, tanto mais que haviam sido descobertos depósitos de monazita, que era o material de onde se extraía o tório, um elemento radioactivo, então considerado um elemento fundamental para as pesquisas nucleares e de interesse estratégico.

Num dos episódios menos conhecidos e também menos heróicos da História da futura Índia, tudo se veio a resolver em seu proveito entre 25 e 30 de Julho de 1947. A 25 Sir C.P. foi vítima de um atentado e esfaqueado na cara e no corpo, tendo sido operado de emergência. O recado foi bem compreendido e foi o próprio C.P. convalescente que recomendou ao Maharaja de Tranvacore que ele assinasse a Adesão cinco dias depois. Sir C.P. sobreviveu mas abandonou o cargo passadas três semanas. Veio a morrer como um gentleman, adormecido no cadeirão de couro do seu clube, em Londres…
(Continua)

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