

Em 1386, a filha do último rei da Polónia casou com o Grão-Duque da Lituânia, Ladislau II Jagelão, que se baptizou durante a cerimónia. Ao contrário do que a dimensão dos países actuais poderia indiciar, os territórios da Lituânia medieval sob a tutela do Grão-Duque eram incomensuravelmente superiores aos da Polónia: pelo traçado das fronteiras modernas correspondem à Lituânia, à Bielo-Rússia, a uns 75% da Ucrânia e a pequenas parcelas da Rússia ocidental. Provavelmente não se tratou de um casamento de amor, mas as acusações de casamento por interesse assentariam melhor à Polónia; aliás, a associação entre os dois estados foi frutuosa.

A dinastia dos Jagelões veio a extinguir-se em 1572, mas a associação dos dois estados permaneceu, formalizada por um documento chamado União de Lublin de 1569, unificando as Cortes dos dois estados numa Dieta única. Esta Polónia daquela época representa em tudo, menos no nome, um respeitável império oriental europeu que, apesar de comparativamente subdesenvolvido, superava em área e população o da Áustria da mesma época, por exemplo. O maior problema dessa Polónia – como aconteceu mais tarde com a Áustria – era o da coesão entre as suas várias nacionalidades e religiões.
Os Lituanos não são eslavos, mas a esmagadora maioria das outras populações originais são-no, variando progressivamente de Oeste para Leste de entre os que falam polaco (que são católicos) até aos que falam russo (que são ortodoxos), passando pelas fases intermédias dos bielorussos e dos ucranianos (onde havia quem seguisse o rito bizantino mas também fosse uniata – ou seja, obediente à hierarquia do Vaticano). Espalhados por quase todo o território havia que adicionar ainda os judeus, predominantemente urbanos, cujo idioma de comunicação preferencial era o iídiche, um idioma germânico. Só em alfabetos há logo três: latino, cirílico e hebraico.
Analisando a Europa globalmente, a existência da Polónia dos Jagelões representava um cenário estrategicamente muito diferente daquele que existe hoje. Fazendo uma simulação que a explique melhor e onde se empreguem alguns números redondos, basta constatar que, na actualidade, entre a Alemanha (com mais de 80 milhões de habitantes) e a Rússia (com quase 150 milhões) encontramos três grandes estados de permeio: Polónia (40 milhões), Bielo-Rússia (10) e Ucrânia (50). Imagine-se agora como as análises estratégicas sobre a distribuição do poder na Europa teriam de ser completamente alteradas se esse centro fosse preenchido com uma Mega-Polónia de 90 ou 100 milhões de habitantes entre alemães e russos…
Foi essa Polónia, que se tornou um reino electivo depois de 1572, que se tornou o inimigo a abater pelos dois (mais a Áustria) e que acabou por ser desmontada até desaparecer completamente em três partilhas consecutivas entre 1772 e 1795, efectuadas com a participação dos Impérios russo e austríaco e do Reino prussiano. Napoleão ainda reconstituiu um Grão-Ducado de Varsóvia em 1809, mas foi um estado com a configuração Piast, formado sobretudo a partir de territórios que haviam sido anexados previamente pelos prussianos, num gesto que, tendo algo de estratégico, evidentemente, teve muito mais de simbólico, no que concerne a uma verdadeira alteração dos equilíbrios europeus.

O dilema que se colocava aos dirigentes polacos que ressuscitaram o país depois da Primeira Guerra Mundial (1918) era o contorno que ele assumiria: a Oeste ou a Leste? Coeso ou imperial? Piast ou Jagelão? Entre as potências vencedoras, o Reino Unido recomendava vivamente a primeira solução: uma Polónia coesa etnicamente, daí a proposta da linha Curzon*. Mas outros valores também estavam em causa, nomeadamente a contenção da expansão da Revolução soviética, que era a linha predominante do lado francês. E havia também as intenções de Jozef Pilsudski (1867-1935), o líder polaco, figura a merecer um poste dedicado…
A sua vitória na guerra polaco-soviética de 1919-20 (uma guerra muito pouco conhecida) permitiu aos polacos que empurrassem a sua fronteira descaradamente para Leste. A população assim absorvida, não sendo polaca, também não era russa, e o mito romântico da Polónia que as potências apadrinhavam era um mito nacional, não imperial… Mas as regiões anexadas eram as mais pobres do país e, no computo global, poderão ter sido um mau negócio, ponderando os recursos que dali se extraíram e o grau de exposição que as regiões propiciaram… A Polónia voltou a ser retalhada entre alemães e russos em 1939.

*Nome do ministro britânico dos Negócios Estrangeiros da época, Lorde Curzon. Observável a verde no último mapa.
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