27 dezembro 2016

O TRIGO E O PÃO DA FRANÇA OCUPADA

Entre Junho de 1940 e Junho de 1944 a Alemanha requisitou 2.845.000 toneladas da produção de trigo francesa, o que correspondeu ao equivalente em média de ⅛ de uma colheita média anual para aqueles quatro anos de ocupação. Só que, durante esses anos e devido à guerra, a França esteve sempre longe de conseguir alcançar tal volume de produção. Por causa disso, o governo francês lançou uma campanha para a poupança do pão, conforme se pode ver no cartaz acima, à esquerda: Economizem o pão. Cortem-no em fatias finas... e utilizem as côdeas para pôr na sopa. Mas não eram apenas essas as iniciativas, outras havia mais pró-activas: a taxa de aproveitamento do cereal para farinha panificável aumentou até proporções inimagináveis. Se, em 1939, de 100 quilos de trigo se obtinham 75 de farinha panificável, a que servia de matéria-prima para a conhecida e tradicional baguete francesa (acima, ao centro), em Novembro de 1940 a taxa de aproveitamento subira para os 82 quilos; em Março de 1941, para 85 quilos; em Janeiro de 1942 para 90 quilos e em Abril desse ano, já se atingiam taxas de aproveitamento de 98%! O senão de tanta parcimónia era a qualidade do produto, que escurecera até uma cor que transmitia uma impressão de sujidade desagradável, a que acrescia o notável defeito de não ensopar, um defeito potenciado pelo tradicional costume francês de molhar o pão no café da manhã.
Serviria de consolo (relativo) o facto de também não haver café, substituído pela pulverização e torrefacção de produtos como o tremoço, a castanha, a bolota... - mas isso são outras frentes de batalha da grande guerra alimentar travada pelos franceses durante esses anos. Para o que interessa, a partir de 1942/43 todo o francês médio se alimentava de um pão escuríssimo, sem adivinhar a ironia de que os seus bisnetos iriam tomar um sucedâneo algo parecido como o paradigma do pão saudável! Outro fosso de incompreensão (mas esse já não inter-geracional) era o que existia entre os alemães e os franceses Os primeiros não conseguiam compreender porque é que, entre os segundos, alguns se dedicavam a sabotar as colheitas de trigo, incendiando-as e prejudicando-se a si próprios, conforme se pode ler no cartaz da direita mais acima: menos trigo = menos pão. Que esperam para reagir? A racionalidade subjacente à incompreensão manifestada ali pelas autoridades alemãs de ocupação, faz-nos lembrar a das autoridades modernas de Bruxelas em toda a sua arrogância ignorante: a questão não é o volume do que se produz; o mais importante passou a ser a percepção da injustiça da forma como se reparte aquilo que se produz. E é isso que leva a que as votações populares nos países da União Europeia sejam cada vez mais frequentemente contra o status quo.

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