Para contar a história desta Aliança Popular será necessário prestar algumas explicações adicionais sobre a Islândia (acima, a bandeira do país), sobre a sua história, sobre a situação da Europa Ocidental durante a Guerra-Fria e sobre a história das coligações políticas em Portugal desde 1975. Esta última será a parte mais simples de explicar: desde 1976 que o Partido Comunista Português (PCP) não se apresenta sozinho a eleições. Nesses 33 anos, a coligação que tem sido formada por aquela organização com mais uns amigos que gravitam à sua volta, já se chamou FEPU, APU e CDU (abaixo), conforme os amigos. E já se apresentou a 19 eleições legislativas e autárquicas.
Com isso, os comunistas portugueses já conseguiram bater o recorde dos seus camaradas islandeses, onde a Aliança Popular durou 32 anos (1956-1998). Registe-se como, nestas comparações internacionais, raramente nos lembramos da Islândia. Em primeiro lugar, por ser um país pequeno, com uma dimensão geográfica parecida com a de Portugal (103.000 km²) embora com uma população semelhante à da Madeira ou dos Açores (320.000 habitantes); e em segundo lugar, por ser um país localizado verdadeiramente na periferia da Europa, conforme se pode observar no mapa abaixo. Uma localização que tem tanto de periférica quanto de estrategicamente importante.
Com isso, os comunistas portugueses já conseguiram bater o recorde dos seus camaradas islandeses, onde a Aliança Popular durou 32 anos (1956-1998). Registe-se como, nestas comparações internacionais, raramente nos lembramos da Islândia. Em primeiro lugar, por ser um país pequeno, com uma dimensão geográfica parecida com a de Portugal (103.000 km²) embora com uma população semelhante à da Madeira ou dos Açores (320.000 habitantes); e em segundo lugar, por ser um país localizado verdadeiramente na periferia da Europa, conforme se pode observar no mapa abaixo. Uma localização que tem tanto de periférica quanto de estrategicamente importante.
Surpreendentemente, uma das potências que tem um particular interesse na Islândia é a Rússia. A ilha tem a localização ideal para bloquear as ligações marítimas entre os seus portos do Oceano Árctico (como Murmansk) e o Oceano Atlântico. Foi para evitar que uma potência continental (nesse caso, a Alemanha, então aliada da União Soviética na sequência da assinatura do Pacto Molotov-Ribbentrop) desfrutasse dessa vantagem, que os britânicos ocuparam a Islândia em Maio de 1940. A Islândia, permanecendo neutral, mas entretanto tornada independente (Junho de 1944), continuou sob ocupação aliada (britânica e norte-americana) até ao fim da Segunda Guerra Mundial - abaixo, tropas canadianas da guarnição.
As organizações de esquerda da Islândia foram-se inspirar nas suas designações às suas congéneres alemãs. Foi assim que, à esquerda do Partido Social-Democrata, num processo de fusões alimentado por dissidências oriundas desse partido, apareceu um partido islandês filiado no Comintern(*) designado por Socialista. Partido esse que, pelas razões apontadas no parágrafo acima, foi muito apoiado pelos soviéticos imediatamente depois da Segunda Guerra Mundial, para que a Islândia adoptasse uma política externa neutral. Já então (eleições de 1946), os socialistas islandeses (comunistas), obtiveram um resultado eleitoral apreciável, com 19,5% dos votos, à frente dos social-democratas com 17,5%.
Mas o Parlamento (acima) era dominado pelos partidos da direita (Independência e Progressivo, que haviam recebido 62,6% dos votos no conjunto) e foi sob o governo deles que a Islândia acabou por aderir à NATO em 1949, apesar dos socialistas terem tentado transportar a oposição à decisão para protestos nas ruas (abaixo), uma ocasião que, pela sua raridade, se tornou histórica. Apesar da Islândia ser um daqueles típicos países nórdicos, tornados famosos pelos seus altos padrões de vida e pelos seus governos sociais-democratas, contava no seu espectro político com um partido comunista que era mais forte do que o social-democrata e, proporcionalmente, um dos mais fortes da Europa Ocidental.
Em 1956, possivelmente tentando alargar a sua base de apoio, a formação coligou-se com mais uma dissidência dos sociais-democratas, formando a já mencionada Aliança Popular que, de coligação, veio a transformar-se definitivamente num partido em 1968. Com este último, atingiu-se o climax dos resultados eleitorais: 22,9% nas eleições de 1978. Não se assumindo claramente como comunistas, o posicionamento da Aliança quanto à política externa era explícito e em favor das opções russo-soviéticas e não se distinguia, por exemplo, daquele que era então o posicionamento do PCP quanto a essas questões fundamentais: era contra a permanência da Islândia na NATO, contra a adesão do país à União Europeia, etc.
Chegou a fazer parte do governo islandês. Por cinco vezes: 1956-58, 1971-74, 1978-79, 1980-83 e 1988-91. A Aliança Popular (símbolo acima) ainda sobreviveu bem ao impacto da queda do Muro, mantendo uns digníssimos 14,4% e 14,3% nas eleições de 1991 e 1995(**). Em 1998, os seus dirigentes optaram por concorrer numa mais ampla frente de esquerda, incluindo outras formações, designada Aliança Social-Democrata que depois se veio a tornar numa nova formação política em 2000. Em Portugal, também neste aspecto da dinâmica partidária parecemos ser mais conservadores que os islandeses. O PCP, aparece coligado consigo mesmo há 33 anos mas a fórmula, que se assume garantida, está para durar…
(*) Organização comunista internacional, também conhecida por III Internacional, fundada em 1919 em Moscovo, e que supervisionava e coordenava a actividade dos partidos comunistas nacionais. Foi dissolvida em plena Segunda Guerra Mundial (1943).
(**) Quem dera à CDU, que obteve 8,8% e 8,6% nas eleições desses mesmos anos…
(**) Quem dera à CDU, que obteve 8,8% e 8,6% nas eleições desses mesmos anos…
Que a CDU e as coligações anteriores do PCP sejam "coligações consigo mesmo", digamos que é uma figura de estilo, uma forma de expressão que traduz o essencial sem aprofundar os detalhes como é natural na exiguidade de um artigo de blogue.
ResponderEliminarEstas coligações têm servido para abarcar pessoas e organizações que não se revêem inteiramente no PCP (geralmente em aspectos de política internacional e em conceitos radicais de metodologia revolucinária), seja para efeito de trabalho organizativo, seja para efeitos eleitorais - há pessoas que apoiam a CDU mas que não apoiariam o PCP sozinho.
Se é verdade que o PCP absorve a imagem e a liderança destas coligações, é de admitir que as pessoas e forças integrantes negoceiem as condições políticas da sua participação e sejam ouvidas nas decisões que entendam.
A dissidência entre A. Cunhal e José Tengarrinha (MDP) em 1987 que acabou com a APU e fez surgir a CDU, fazem pensar isso. Como o facto das coligações terem tomado outros nomes resulta de alterações na respectiva composição. De resto, o que é o Bloco de Esquerda, lá onde foi parar em boa parte o ex-MDP depois de ter sido Política XXI?
Por outro lado, não duvido que a continuação da existência da CDU seja discutida internamente em cada processo eleitoral.
Caro António Pinto,
ResponderEliminarCom toda a consideração que merece um "habituendo" deste blog mas a CDU surge aos olhos do comum dos mortais (como eu próprio) como uma forma de camuflar o PCP.
Sejamos imparciais o seu parceiro de coligação (o PEV) tem clramente uma existência virtual.
Lembro-me de os próprios "verdes" alemães terem considerado esse partido como "demasiado ligado ao PCP".
Até hoje não conheci ninguém ligado a organizações ambientalistas como a Quercus, do qual fui membro, ou LPN que se revisse de alguma forma no PEV.
A CDU faz-me lembrar um PCP envergonhado de si próprio - enfim uma opinião meramente pessoal.
Lamento, mas "coligações consigo mesmo" não é uma figura de estilo, é isso mesmo. O António Marques Pinto lembrar-se-á, com certeza, das eleições legislativas de 1980, onde concorreram uma coligação a sério, a AD, à direita, com o PSD e o CDS, e duas a fingir, à esquerda, a FRS e a APU, com o PS e o PCP, respectivamente, coligados consigo mesmos.
ResponderEliminarPegando na sua própria expressão, só mesmo os militantes dos partidos (e acredito que com os do PCP isso talvez ainda aconteça mais) é que "se revêem inteiramente" nos seus partidos. Quanto à maioria das pessoas, suponho que a decisão do voto é fluida e ponderada, feita de se "reverem", mas só muito "parcialmente".
Quanto ao que afirma - "há pessoas que apoiam a CDU mas que não apoiariam o PCP sozinho" - é uma boa teoria mas que está há 33 anos à espera para que se possa testar na prática o seu contraditório, não é?...
Noutras paragens, chamar-se-á a isso "dogma de fé". E enquanto a tese "do centro" se mantiver essa, ambos adivinhamos o que resultará da "discussão interna em cada processo eleitoral".
O António Marques Pinto sabe muito bem que há muitas maneiras de se estabelecer uma colaboração política entre um grupo de pessoas e um partido. A especificidade do PCP é que ele precisa de uma outra sigla, para criar uma terceira sigla que concorre às eleições. Camuflado, numa camuflagem que passa por vergonha de se identificar como escreveu o João Moutinho.
As siglas eram o MDP e a APU e passaram a ser o PEV e a CDU. E isso é uma opção deliberada, porque eu posso dar-lhe exemplos das duas práticas:
a) Quando o PS precisava de siglas para a FRS em 1980, Sousa Franco entrou com uma, a ASDI. Lembra-se? Mas o mesmo Sousa Franco apareceu
como independente a encabeçar as listas do PS para as Europeias de 2004...
b) Não sei se se lembra, mas, para as eleições legislativas de 1991, o PCP estabeleceu um acordo com a UDP e Mário Tomé foi eleito nas listas como uma espécie de deputado "independente". Pelos vistos, o PCP também conhece e sabe usar esses estatutos...
Tudo isto, António Marques Pinto, será apenas o aspecto folclórico da "coisa" porque, como já por diversas vezes aqui dei a entender, na minha opinião o problema nuclear do PCP está na essência da própria organização e não nas designações com que escolhe apresentar-se aos actos eleitorais.