28 outubro 2009

A PROIBIÇÃO

Se durante o período da Guerra-Fria era (e hoje actualmente ainda é) costume realçar a herança comum compartilhada entre europeus e americanos, existem, por outro lado, muitos outros episódios históricos que os apartam, como ficou, de resto, bem vincado ao longo dos oito anos (2001-09) que durou a Administração Bush. Exemplo flagrante desse nosso distanciamento em relação ao tratamento que fizemos à nossa herança comum foi o episódio que ficou conhecido nos Estados Unidos como a Proibição.
A Proibição, entenda-se, foi uma proibição geral ao consumo de bebidas alcoólicas – e por isso tornou-se coloquialmente conhecida como a Lei Seca – que entrou em vigor nos Estados Unidos a partir de 16 de Janeiro de 1920. Evidentemente que a Lei tinha raízes em movimentos nascidos no Século XIX no Reino Unido e noutros países anglo-saxónicos em prol da temperança, i.e., da abstinência de bebidas alcoólicas. Contudo, na Europa continental esses movimentos eram considerados pouco mais que uma anedota.
De facto, no resto do velho continente ninguém se parecia importar já que entre os países da Europa meridional aparecia a França a liderar as listas mundiais do consumo de vinho per capita e entre os da Europa Setentrional aparecia a Alemanha a liderar as do consumo de cerveja per capita… Mas, aquilo que a alguns no Reino Unido pareceria grave, ficou a parecer nos Estados Unidos, com a tendência natural dos seus habitantes para os exageros, ainda mais grave… Em 1869 veio ali a ser criado um Partido Proibicionista
Nunca foi um partido de massas, mas o assunto que levara à sua fundação nunca mais saiu de agenda da política americana durante os 50 anos seguintes e quem andava na política como que era forçado a ter uma opinião sobre o assunto: pró (seco) ou contra (molhado) a proibição. Em 1917, quando os Estados Unidos se envolveram na Primeira Guerra Mundial, os congressistas secos suplantavam os molhados na proporção de 2 para 1 e foi assim que a Constituição dos Estados Unidos recebeu um novo Aditamento, o XVIII.
O referido Aditamento, complementado pela Lei Volstead, entretanto aprovados pelo Congresso mas também ratificado por 36 estados dos 48 que então compunham a União tornaram-se efectivos em Janeiro de 1920. E com eles a Proibição. A parte folclórica do resto desta história torna-se mais conhecida a partir daqui: o comércio clandestino de bebidas alcoólicas, os bares, também clandestinos, os milhões arrecadados, a ascensão dos bandos de gangsters, as suas lutas internas e depois as travadas entre eles e o FBI.
Este foi um daqueles casos em que a desobediência social alargada tornou patente que os legisladores, por muito bem intencionados que estivessem, se haviam excedido quanto ao âmbito da interferência na esfera privada do cidadão. Para salvar a face, foi preciso um outro processo legislativo, igualmente complexo, para desfazer tudo o que fora feito, nomeadamente um outro Aditamento à Constituição dos Estados Unidos (o XXI), também ratificado por 36 estados da União – completado em 5 de Dezembro de 1933.
Se o erro foi reconhecido, o fiasco da Lei Seca nunca me pareceu saudavelmente assumido pela sociedade norte-americana. Não me lembro, por exemplo, de piadas sobre o período numa série como Cheers (acima), cuja acção se passava num bar centenário de Boston e onde elas seriam oportuníssimas. Em contrapartida, entre autores da Europa continental, vale a pena evocar os Irmãos Bross (abaixo), uma história de BD francófona, contando de uma forma cómica as desventuras de dois gangsters gémeos completamente desastrados.

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