26 outubro 2009

O TRANSEXUAL POR CAUSA DO DOPING

Uma das grandes revelações provocadas pela Queda do Muro de Berlim, de algo de que anteriormente se suspeitara mas não se pudera provar, foram os programas de preparação dos atletas (especialmente das atletas femininas) dos países do Bloco Leste que lhes permitiam alcançar resultados desportivos extraordinários mas à custa da ingestão de substâncias que eram proibidas – aquilo a que se costuma dar o nome de doping.
No caso da Alemanha Democrática, um dos casos a que se veio a dar mais destaque mediático, e que serviu aliás de base, como testemunha, aos julgamentos de alguns dos responsáveis pelo programa nesse antigo país, foi o de Heidi Krieger, uma antiga atleta lançadora de peso, campeã europeia da modalidade em 1986, que se terá visto forçada a fazer uma operação de mudança de sexo por causa dos esteróides anabolizantes por ela ingeridos…
O emparelhamento das fotografias com o antes e o depois (acima) tem o seu impacto visual, mas a verdade é que há que reconhecer que estamos perante mais um daquele mitos urbanos, um dos eufemismos modernos para manipulação… O problema da identidade sexual de Heidi, agora transformada em Andreas, Krieger existiu decerto, mas ter-se-á colocado muito antes da ingestão do cocktail de hormonas que fez dele(a) um(a) campeã(o)…
É impossível negar os riscos para a saúde dos atletas de tais tratamentos, mas o caso da transexualidade de Krieger está longe de ter sido a norma para que seja honesto usá-lo como exemplo mediático. Houve milhares de atletas que foram submetidas aos mesmos tratamentos e que não têm problemas de identidade sexual. Lembrei-me de, no mesmo estilo da de cima, justapor fotografias antigas e actuais de antigas campeãs do lançamento do peso.
E foi assim que fiz a montagem das fotografias de três grandes campeãs da modalidade: a checa (ex-checoslovaca) Helena Fibingerova, a também alemã (ex-alemã de Leste) Ilona Slupianek e a russa (ex-soviética) Natalya Lisovskaya. Foram as três últimas recordistas mundiais da especialidade e Lisovskaya permanece como tal desde Junho de 1987 (com 22,63), tendo as três alcançado marcas que são hoje irrepetíveis, porque só o doping as permitia obter…
Aceitando que qualquer delas terá sido provavelmente submetida a um cocktail de hormonas semelhante àquele que foi ministrado a Krieger, como se pode observar pelas fotografias (Fibingerova, Slupianek e Lisovskaya, nesta ordem), constata-se que qualquer das antigas campeãs se tornou entretanto numa senhora cuja presença ainda infundirá respeito, mas nada nelas permite supor que se lhes coloquem problemas quanto à sua identidade sexual…

2 comentários:

  1. Muito interessante este artigo. Nunca tinha visto este assunto tratado. Fiquei apenas com dúvidas sobre se o fenómeno é específico do ex-Bloco de Leste ou aconteceria o mesmo com atletas de outros países de grande prestígio neste âmbito. Isto é, fiquei curioso de saber se era uma lógica de regime ou uma lógica da competição.

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  2. Se não houver confusão entre conceitos, suponho que as duas lógicas que aponta não se excluem mutuamente, António Marques Pinto.

    O fenómeno do "doping" já estava e continuou espalhado por todo os países e por todas (mas mesmo todas) as modalidades, mesmo depois do fim da Guerra Fria. Isso será o que desiga por lógica de competição.

    Mas, antes desse período, no Bloco Leste o "doping" alcançou um "peso" institucional impar que não se voltou a repetir depois. Por isso é que há vários recordes mundiais de atletismo feminino que não são batidos há 20 anos... E isso só acontece porque havia uma lógica de regime.

    Comparado de outra forma, e com uma referências que o António Marques Pinto certamente ainda se lembrará, o Cristiano Ronaldo não estará para Portugal como a Nadia Comaneci estava para a Roménia...

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