10 abril 2009

O HORÁRIO POPULAR E O DITADO NOBRE

Se há expressão descabida que possua o dom de me irritar é o emprego da designação horário nobre quando aplicada àquelas horas do dia em que a audiência televisiva potencial será maior. O epíteto de nobre só se compreenderá como ironia, quando se confronta com as características que costumam ser reconhecidas à maioria da audiência dessas horas, normalmente de uma indigência intelectual e cultural confrangedora.

Os exemplos sucedem-se, e repetiram-se mais uma vez nos resultados das audiências da série A Guerra, transmitida às Quartas-Feiras à noite na RTP1, já por mim aqui elogiada, e que tem mantido, na minha opinião, esse excelente padrão de qualidade. Segundo pude ler hoje no Público, a série não só nunca teve uma grande audiência (um máximo de 650 mil espectadores), como ela tem vindo a diminuir sucessivamente, episódio após episódio.

Esse facto poderia ser o preâmbulo de inúmeras considerações do eterno conflito entre o que tem qualidade e o que tem audiência, mas creio que isso já se transformou numa conversa batida em que já se concluiu o que havia a concluir. A verdade é que uma reportagem com quase hora e meia de duração, sem intervalo e com uma narrativa que não foi previamente mastigada, feita de depoimentos por vezes contraditórios, não faz os gostos do povão

O grande erro da RTP terá sido ter decidido passar a série no horário nobre, o tal horário que afinal é popular. E isso faz-me lembrar um ditado. Ao contrário dos horários que são nobres mesmo quando populares, os ditados costumam ser todos populares mesmo quando são de evidente inspiração nobre. É o caso do ditado de que me estou a lembrar a respeito do insucesso d´A Guerra: de que serve deitar pérolas aos porcos?…

9 comentários:

  1. Até seria capaz de dar, de barato, uma desculpa para essa escolha, se não soubesse que, à boca das urnas, o procedimento adoptado é, exactamente, o mesmo...

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  2. Este é um nobre post para um nobre programa.

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  3. 650000 espectadores é um número
    que acho equivaler aos militares,
    ainda vivos,que por lá andaram.
    Talvez 50%vejam A Guerra,sobram
    325000,onde se inclui o meu amigo,
    sendo de facto um número diminuto
    para um programa de tal qualidade.
    O programa do J.Furtado deveria
    ser falado e promovido nas escolas,
    estou certo que não é,o que acho
    lamentável.Depois perguntam a um
    puto de 14 anos:sabes o que foi a
    Guerra Colonial?Recebendo como
    resposta:essa não vem na Playstation...

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  4. Paulo:

    Complementando as suas contas, o número por mim estimado - um dia, num poste, explicarei as contas que fiz - de veteranos metropolitanos e insulares das três Guerras rondarão os 450 a 500 mil assim desdobrados:

    Guiné - 110 a 120 mil
    Angola - 240 a 260 mil
    Moçambique - 115 a 125 mil

    Não sei quantos deles estarão ainda vivos e quantos poderão ter entretanto emigrado.

    Mas, para o cálculo das audiências especialmente interessadas, creio que haverá que contar com os sobreviventes dos cerca de 500 mil retornados de Angola e Moçambique.

    De qualquer modo, e tendo em conta que a referência de 650 mil foi um máximo, a audiência parece-me significativa, ainda que escassa, muito escassa...

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  5. Estamos a falar de uma audiência de um povinho semita, mais concentrado em vender amêndoas e figos no vão de escada alumiado pelo petromax do que em debater a sua memória. Se não lhes tocou no lombo...não aconteceu. Vide o respeito com que são lembrados os mortos de todas as guerras no 10 de Junho. Este povo tem vergonha dos seus heróis, ou daqueles que tiveram a última atitude corajosa em nome do seu país. Por isso, varrem-se para debaixo do tapete, ignoram-se... Por estas bendas "quem dá ao canastro...é mal recordado"

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  6. Errata: ler-se "bandas" em vez de "bendas"

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  7. Gostei francamente deste post. Explico. O primeiro parágrafo está uma pérola. O corpo do post está recheado de verdades, irritantes, mas verdades.
    E terminas com uma imagem verdadeiramente nobre e com pérolas... Fantástico.

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  8. Donagata, muito bem, considera a imagem verdadeiramente Nobre -fiambre, salsichas e outras carnes da mesma origem.
    Salvem-se as pérolas!

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  9. Oh Impaciente, desculpe lá! mas reparou bem na pose do bicho! É de nobre! Lá se é fiambre ou salsicha, isso já não sei.

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