23 dezembro 2013

TV NOSTALGIA – 76 ou o «PRODUTO ACABADO DA ALIENAÇÃO DA BURGUESIA»


Ao contrário das 75 precedentes, a Nostalgia TV que se evoca para este episódio não tem directamente a ver com os Jogos Sem Fronteiras (esses já foram canonicamente evocados no número 74 da série), antes com um certo género de crítica televisiva castiça de uma certa época revolucionária. A propósito desses mesmos Jogos Sem Fronteiras, a edição de Sábado, 19 de Junho de 1976, do jornal Página Um (considerado próximo do PRP/BR) publicava a crítica televisiva abaixo, intitulada A Fronteira do Absurdo:
Numa coluna que apresenta diariamente alguns dos programas televisivos merecedores de certo destaque, não mereceria, nem de longe nem de perto, referir o suprasumo da idiotice e da asneira que é o Jogos sem Fronteiras - 1º Programa, Sábado, às 21 e 50. Mas acontece que é esse o programa que a RTP escolha para apresentar ao público no dia, e à hora, de maior audiência. Aliás, o espectáculo repetir-se-á, visto tratar-se de uma série de sete jogos, concluindo com uma eliminatória.
Jogos sem Fronteiras, que o público português já conhece do ano passado, é um produto acabado da alienação da burguesia dos países da Europa Ocidental, que nem sequer consegue proporcionar um certo divertimento. Esta gincana de disparates realiza-se em várias cidades europeias; e a RTP, que falta totalmente nas manifestações de cultura popular, impinge-nos os divertimentos decadentes com que a burguesia europeia fomenta a alienação e o embrutecimento.
Entretanto, o 2º Programa (que nem todos os telespectadores conseguem captar) apresenta música de qualidade e clássicos do cinema português.
Que lógica é esta?

Foram anos em que prosperaram os críticos de televisão atestados de certezas do que seria melhor para o povo, intérpretes auto-assumidos do gosto popular, detentores de uma verdade que merece confrontação com esta volúpia actual com que o proletariado passou a consumir produtos (ainda mais aperfeiçoadamente) acabados da alienação da burguesia: exemplo do Big Brother ou da Casa dos Segredos. Nesse aspecto, a página da crítica – como muitas outras noutros jornais progressistas que interpretavam os gostos do povo naqueles tempos – torna-se muito mais caricatamente risível do que a puerilidade dos concursos dos Jogos Sem Fronteiras propriamente ditos…

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