09 agosto 2011

MOÇAMBIQUE 1974 NUMA PERSPECTIVA DOS DEFENSORES DO PROJECTO NEO-COLONIAL

Talvez para me sentir equidistante resolvi escrever aqui algumas considerações a respeito do livro acima, A Cauda do Escorpião – O Adeus a Moçambique de Giancarlo Coccia, uma versão ampliada de um livro que foi publicado originalmente em inglês na África do Sul em 1976. Essa minha eventual procura de equidistância deve-se ao meu comentário final desdenhosamente crítico que aqui fiz a um outro livro sobre esse mesmo período mas que foi escrito por alguém que estava (e parece permanecer) do outro lado da barricada: Fernando Amado Couto, que foi o autor de Moçambique 1974 – O Fim do Império e o Nascimento da Nação. Começando pelo fim: os dois livros são total e igualmente facciosos.

Ao contrário da subserviência excessiva de Amado Couto no seu livro ideologicamente compacto, Coccia não mostra respeito algum pelas autoridades do seu lado no conflito, o que o pode tornar, parecendo menos engajado, mais credível ao leitor. Contudo, tendo sido o seu livro escrito praticamente em cima dos acontecimentos (Couto escreveu o seu livro em 2010 tolerando-se mais a mistura dos factos com as lendas) tornam-se muito menos aceitáveis os erros factuais perpetrados pelo jornalista italiano. São suaves, ao correr da leitura, mas fortes. Pires Veloso, talvez pelo papel que veio a desempenhar depois no PREC em Portugal, aparece promovido precocemente a Coronel logo em Abril de 1974 (p. 52)...

Sessenta páginas mais adiante, Coccia realiza uma operação com Comandos quando o Oliveira verificou o tambor da sua HK21, uma metralhadora ligeira de calibre 5.56… (p. 113). O calibre da arma em questão é 7,62 mm… Passa-se a tomar uma outra atenção a esses detalhes, que os jeeps são sempre (estranhamente) Land-Rovers e não Willys... E quando Coccia descreve a chegada do primeiro contingente da Frelimo a Nampula, precisando que vieram num avião BAC-111 da East African Airways (p.279) atinge-se o clímax... Na Wikipedia, nem aquela companhia aérea operou aquele avião, nem aquele avião foi operado por aquela companhia aérea

À terceira é de vez, que as peripécias de Giancarlo Coccia em Moçambique em 1974 merecerão a mesma credibilidade que as de Fernão Mendes Pinto na Ásia no Século XVI: são histórias de aventura porreiras mas desinteressamo-nos do que possa ser verdade. Neste caso percebe-se que o que é importante para o autor é a disputa ideológica que se travava em Moçambique e as suas aventuras servem como argumentos. Constate-se o facto de apenas uma meia dúzia das 65 fotografias do livro terem por tema a guerra colonial propriamente dita – das quais usei logo duas neste poste. 36 anos depois, estes dois livros comprovam que ainda se está bem longe de haver condições para uma análise equilibrada deste período da História de Moçambique.

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