07 fevereiro 2006

EFEITOS DE ESCALA

Na Física, existe uma Teoria para explicar a forma como se rege o infinitamente grande, a Teoria da Relatividade de Einstein e uma outra Teoria, distinta, a dos Quanta, de Max Planck, que explica o comportamento do infinitamente pequeno, à escala atómica.

Como o infinitamente grande é composto de uma quantidade infinita de infinitamente pequeno e aquelas duas teorias são profunda e estruturalmente distintas, uma delas, senão mesmo as duas, deve estar incorrecta.

Mas já John Maynard Keynes havia transposto o mesmo problema de escala para a área económica, quando formulou a famosa máxima: “Se devemos dez mil euros a um banco, temos um problema mas se devermos dez milhões de euros ao banco, o problema passa a ser do banco.”

Esta comprida introdução serve como justificativo para o facto da minha admiração ser muito mitigada quando se fala dos grandes empresários, ou entrepreneurs, como se diz em estrangeiro, e usou hoje o Martim na TSF referindo-se a Belmiro de Azevedo.

Quando, há umas semanas, gabei aqui os méritos do novel Grã-Cruz da Ordem do Infante, Sr. William Gates, fi-lo por outros méritos que lhe reconheço para além do facto de ser o homem mais rico do mundo, ponto final parágrafo.

Reconheço que há muito mérito deles quando se procede à descolagem e ao arranque das actividades iniciais com sucesso. É como a fase mais angustiante das viagens de avião. Agora quando já se é colossalmente rico e se vai em velocidade de cruzeiro os riscos que se correm são substancialmente menores.

Admitamos, para efeitos de exercício, que conhecemos um desses entrepreneurs com uma fortuna pessoal avaliada 100 milhões de euros. Fez uma série de operações que lhe correram mal e perdeu 20 milhões. Como o consideraremos depois disso, com uma fortuna pessoal de apenas 80 milhões? Alguém que vive na mais abjecta miséria? O que teria acontecido a qualquer outro desgraçado que tivesse perdido o mesmo montante?

Em sentido oposto, pelo mesmo efeito de escala, há muito menos concorrência entre as oportunidades de negócio que se colocam. São poucos os que dispõem dos montantes a investir ou da capacidade de mobilizar capitais que os grandes investimentos arrastam. A máxima de que o dinheiro atrai mais dinheiro é já muito antiga.

Enfim, eu na minha e eles na deles. Agora confesso não gostar que me venham acenar a bandeira portuguesa à frente do meu nariz, como me está a parecer que Belmiro anda a tentar fazer a propósito da OPA que a SONAE vai lançar sobre a PT.

Eu gosto de torcer pela selecção mas esta OPA não me parece nenhum jogo de futebol, nem um filme de cowboys e índios, com bons e maus, nem, já agora, uma espécie de Aljubarrota revisitada, com Belmiro contra os espanhóis, tanto mais quanto parece que há espanhois dos dois lados.

Eu bem sei que Belmiro é português, mas invocá-lo para tentar conquistar a opinião pública na sua pretensão de que o estado abdique da sua golden share de controle da PT (o estado cederia, mas seria para um entrepreneur português…) parece-me excessivo. Tanto mais porque o estado (se a reacção de Sócrates for genuína) parece também ter sido apanhado de surpresa com a intenção manifestada pela SONAE.

É normal que Belmiro de Azevedo tente forçar a decisão governamental. Mas foi para isso que eu votei num governo, num processo onde o meu voto e o voto de cada um conta tanto como o dele. Mas, se o governo decidir abdicar do seu controle sobre a PT, que o faça por razões políticas suas, não porque Belmiro de Azevedo acha que sim e que era agora. Ao governo, eu depois terei condições de julgar posteriormente.

Eu não tenho confiança em Belmiro de Azevedo, nem ele tem que me prestar contas. O facto de partilharmos a mesma nacionalidade não me leva, nem a ter de gostar, nem de desgostar dele. Há é uma estrutura eleita encarregue de promover o que pensa ser melhor para a sociedade. Que bem pode não ser o que Belmiro de Azevedo pensa.

É que, quanto a atitudes beneméritas de entrepreneurs portugueses, obras marcantes para o bem da nossa sociedade, quero lembrar que o nome que mais associamos à filantropia em Portugal é o portuguesíssimo nome de… Calouste Gulbenkian.