16 fevereiro 2006

COZINHA INDIANA (1)

É atribuível a Bismarck – o chanceler de ferro tem a reputação de ser uma mina de citações famosas – uma frase famosa, sobre a vantagem de quanto menos se souber como a política e as salsichas são feitas, tanto melhor.

O meu pai acrescentou àquele par, antes da época do política e culturalmente correcto, a cozinha indiana tradicional. Dizia ele, que a tinha experimentado em primeira-mão nos idos anos 50, que qualquer visita ao mercado local, seguida de uma ida às cozinhas com a constatação das condições de higiene em que tudo aquilo era confeccionado constituía um severíssimo desafio à capacidade de almoçar.

E, no entanto, a comida era saborosíssima, bastante condimentada, embora pouco variada, por causa do dilema religioso-gastronómico omnipresente na cozinha indiana: não se pode confeccionar carne de vaca, porque é um animal sagrado para os hindus, nem a de porco, porque é um animal impuro para os muçulmanos.

A excelente condimentação dos textos de José Pacheco Pereira, quer aqui no seu blogue, quer no jornal onde escreve, conjugada com a regular ausência de respostas quando me lembro de lhe colocar questões que até julgo pertinentes conferem ao todo um certo ar de cozinha indiana: pratos excelentes mas a sensação de que corro o risco de ficar muito desiludido se visitar a cozinha…

São pequenos episódios a roçar o bizarro, de que a cooptação do inefável Jorge Coelho para a Quadratura do Círculo é só um exemplo. Mas respeita-se a figura barbada e patriarcal de José Pacheco Pereira e o seu estilo, de quem não dá confiança à plebe. E é acima da plebe de blogues que o Abrupto paira.

É por isso estranho que se leia no Abrupto um post submetido ao tema Dez Leis do Abrupto Sobre os Debates na Blogosfera, escrito num estilo onde se mistura o irónico e o doutrinário mas onde parece querer ser-se cómico, duma forma ligeira. Ora José Pacheco Pereira até pode ter muitas virtudes, e eu até acho que as tem, mas aparenta ter um senso de humor de polícia de trânsito em vias de passar uma multa.

Terá esta sua recente inflexão no irónico/sarcástico alguma coisa a ver com a chegada à blogosfera do campeão do sarcasmo Vasco Pulido Valente? Se fosse só pelo Pacheco Pereira do serviço de mesas juraria que não, mas sabe-se lá o que se passa na cozinha