10 agosto 2017

«ALL THOSE YEARS AGO»


A propósito dos Campeonatos do Mundo de Atletismo que estão a decorrer em Londres e de alguns comentários nostálgicos que tenho ouvido a propósito, remetendo-nos para o período de há mais de 25 anos, em que as provas se disputavam também por blocos ideológicos, gostaria de responder a quem já se dispôs a esquecer os senãos dessa época, chamando a atenção para este gráfico abaixo. É um gráfico (na verdade são dois, um para mulheres e outro para homens) um pouco complexo, mas que se explica com alguma facilidade. Em abcissas estão as temporadas de atletismo desde os anos 60 e em ordenadas as várias disciplinas do atletismo (corridas de velocidade e meio fundo, saltos, lançamentos). Por cada ano existe um quadradinho que é progressivamente mais escuro em função da maior valia dos resultados alcançados nessa temporada. E depois há uma divisória central: o ano a partir do qual se passaram a realizar controlos anti-doping mesmo em períodos fora das competições (1989).

A medida foi adoptada nesse ano como consequência do escândalo da descoberta do doping do sprinter canadiano Ben Johnson nos jogos olímpicos de Seul em 1988. Concluíra-se que a descoberta só fora possível porque aquele atleta se lesionara e tivera que atrasar o seu processo de preparação (e de dopagem...), não conseguindo por isso chegar à altura da competição completamente limpo como já acontecera anteriormente (tornara-se recordista mundial dos 100 metros). Esta nova possibilidade de testar os atletas fora das competições terá dissuadido alguns atletas, terá apanhado outros, o que se torna evidente no gráfico acima, especialmente no sector feminino, é que as prestações desportivas da modalidade no seu conjunto (e de algumas disciplinas em particular) nunca mais foram as mesmas que haviam sido até aí. O facto de o bloco Leste, que tanto investia na promoção da sua imagem através dos resultados desportivos, ter colapsado por essa mesma altura, também ajudará ao panorama.

Eu próprio sou um nostálgico, mas confesso que aprecio mais o sentimento quando ele é balanceado com a necessária dose de rigor. Ouvir nos comentários televisivos evocações a esses tempos antigos do atletismo acompanhados de um juízo desculpabilizador quanto à limpeza dos resultados então alcançados é algo que não é justo e que me desagrada. As fraudes não foram detectadas à época, mas isso não serve de argumento de absolvição - já então o doping era considerado fraudulento e o método indiciário acima torna a sua prática mais do que provável. Ontem lembrei-me mais uma vez disso quando da disputa da final da corrida de 400 metros femininos (acima). Numa pista molhada (é certo), a norte-americana Phyllis Frances venceu-a em 49,92. Há precisamente 34 anos (10 de Agosto de 1983) a marca que ontem a tornou campeã mundial dar-lhe-ia para ficar num honroso 5º lugar, a 15 metros atrás da vencedora, na primeira edição dos campeonatos mundiais que se disputaram em Helsínquia...

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