23 janeiro 2006

AMADEUS

Amadeus é um filme de Milos Forman, de 1984, a propósito da vida de Mozart e que arrasou a concorrência desse ano. Houve algo de justiça poética na atribuição do Óscar para melhor actor desse ano a F. Murray Abraham, que desempenhara no filme o papel de Salieri, batendo inclusive, nessa competição, Tom Hulce, que contracenara consigo fazendo de Mozart.

Quanto mais o tempo passa mais se reforça a intensidade posta pelo desempenho do actor na personagem de Salieri, um mau da fita que afinal não seria tão mau quanto isso. Reconhece-se que o Salieri da história possuía a qualidade e o mérito de poder avaliar e compreender todo o talento genial para a composição de Wolfgang Amadeus Mozart, ao mesmo tempo que a sociedade contemporânea se mostrava cheia de pretensões mas vazia de conhecimentos.

Atinge-se mesmo o limite de uma cena em que Salieri dá mostras da honestidade intelectual de não se deixar embevecer pelos elogios do imperador aos méritos das suas composições – o mesmo imperador que detinha os cordões da bolsa de que dependeria o bem estar de Salieri e de Mozart.

Será talvez impressão minha mas, tendo eu chegado à blogosfera há pouco tempo e tendo, na minha infância e por razões que agora não vêm ao caso, mudado de escola por três vezes, sinto na atmosfera da blogosfera algo parecido com a sensação longínqua dos recreios de escola nova para onde me tinha mudado.

Como acontecia naquela época, tendo eu tido o privilégio de apreciar todo o cenário de fora, parece haver aqui, no mundo dos blogs, uns grupos constituídos de antemão, muito satisfeitos e muito cúmplices entre si, numa reciprocidade de scratch my back, i´ll scratch yours*. Subitamente, há blogs que despontam para a notoriedade e para a "excelência", apadrinhados por um círculo mais íntimo sem que eu consiga perceber razões objectivas para tanto alarde – para exemplo, veja-se a recente chegada à Júlio César do veni, vidi, vici** de Constança Cunha e Sá.

Não sei se sempre assim foi mas, sem pretender ser um émulo de Salieri, começo a formar a opinião que estamos a formar nesta blogosfera um retrato parecido ao do meu recreio infantil de outrora. É que, na minha humilde opinião, há blogues que considero muito bons e há blogs despropositadamente badalados. A maioria dos blogues que eu considero muito bons nem são dos mais badalados e, de entre os mais badalados, poucos são os que considero muito bons.

Matematicamente, a intersecção daqueles dois conjuntos daria um cardinal inferior ao dos dedos de uma mão…Não sei se a blogosfera seria como é se não se soubesse quem escreve aonde. Mas também sempre foi verdade que os testes cegos*** aos produtos deram sempre resultados surpreendentes…

* Coça-me as costas que eu coço-te as tuas (exp. inglesa)
** Cheguei, vi e venci (loc. latina)
*** Testes onde se desconhece a marca comercial do produto testado.

2 comentários:

  1. É bem verdade que eu até embirro com a Constança Cunha e Sá, mas apenas a usei como um exemplo da publicitação meteórica de um blog que em circunstâncias diferentes, de um autor diferente ou de anonimato, não a teria.

    E isso é algo que considero risível (arrebanhar a notoriedade duma actividade colateral para propósitos de promoção numa outra – como quando o Vítor Espadinha quis ser toureiro) independentemente da qualidade daquilo que se venha a produzir. Ou seja, para exemplificar, neste estrito aspecto o autor Rodrigo Guedes de Carvalho está em pé de igualdade com o autor José Rodrigues dos Santos, independentemente da qualidade literária dos livros que editaram.

    A minha pena não se prende com a proeminência de Constança Cunha e Sá mas que muitos outros autores (também o seu caso) não disponham de um canal informal idêntico ao dela para dar notoriedade ao seu blog. E definitivamente, não de uma forma venal – a metáfora que usei de coçar as costas destina-se precisamente a excluir isso.

    Quanto à teia por que pergunta gostava de dizer-lhe que por afirmar estar convencido que algo existe não pretendo concluir que só aquilo exista. Parafraseando-o, você, por exemplo, quando pediu sugestões para o seu blog, ter-me-á parecido ver respostas de amigos seus, mas também de outros, anónimos ou simples conhecimentos blogosféricos como este humilde signatário.

    Agora, estou convencido que não quererá apostar contra mim que, se o Luís começar a aparecer regularmente na TV, o seu blog ficará automaticamente muito mais popular. E não será pelo melhoramento da qualidade dos seus textos ou das gravuras que inserir.

    Eu bem sei que a vida é como é e que há causas demasiado idealistas. Mas isso é uma das maravilhas da blogosfera: no meu blog posso ser como sou.

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  2. Confesso-lhe que tenho uma grande dificuldade em "me concentrar em matérias mais operativas" (seja lá o que isso for) e em encontrar interesse em "lutar por um espaço" (contra quê ou contra quem?).

    O general do filme "Good Morning Vietnam" acaba-o dizendo "And this is just radio". Parafraseando-o, isto são apenas blogues, não é preciso linha editorial, nem satisfazer os anunciantes porque nem sequer há ordenados a pagar.

    Permita-me retribuir-lhe o conselho: se quiser ser conhecido assim tanto como parece, faça "castings" televisivos, não perca tempo com blogs, para já. Depois de famoso, pode voltar.

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