A propósito da celeuma provocada pelo convite da TVI a uma personagem (Mário Machado), com algum impacto mediático, conotada com a extrema direita e que acima vejo a ser comparado a um "incêndio político", lembro-me de um episódio semelhante, ocorrido há apenas um ano e através de um convite dessa mesma TVI, a uma outra personagem (Arnaldo Matos), também com algum impacto mediático, só que oriunda do outro extremo do espectro político, da extrema esquerda. Não sei quantos ainda se lembrarão da aparição deste último no programa televisivo Governo Sombra, contracenando com os habitués do programa. Eu lembro-me e comecei logo por não gostar. Por várias razões, a começar pelo facto de ter Arnaldo Matos na conta de um façanhudo, sem ponta de espírito de humor. E lembro-me que não me senti só nesse meu desagrado que se confirmou com o programa (para quem o quiser rever). Recupero uma parte do comentário que Francisco Seixas da Costa escreveu então no seu blogue a respeito daquela iniciativa da TVI:
«Entrámos no último dia do ano com o programa televisivo "Governo Sombra" a ter como convidado Arnaldo Matos. O atual "dono" do PCTP-MRPP foi recebido com um tom visivelmente complacente pelos "residentes" do programa, ansiosos por lhe extraírem declarações chocantes e expressões radicais, à altura daquilo a que o velho político sempre habituou o seu auditório. Conhecedor do palco que pisava, Matos não se fez rogado e, no meio de elogios táticos aos anfitriões, esteve à altura da "performance" aguardada, chamando "nazis" aos gestores alemães da Auto-Europa e mostrando compreensão pelos ataques do Estado Islâmico. Foi notório o gozo com que continua a ser recebida a qualificação de "social-fascista" que o MRPP sempre aplica ao PCP. É que o MRPP continua a ser o "enfant chéri" (para ser simpático) de certos meios, que sempre o cobrem com uma espécie de juízo de inimputabilidade, que nos dias de hoje o coloca ao nível de uma caricatura de comédia.»
Suponho que o parágrafo sintetiza bem o mau gosto, a indulgência e o desconforto de um programa que se pretendia de humor e que o perdeu em grande parte. Ouvir Arnaldo Matos a relativizar os ataques terroristas dos jiadistas em Paris e em Londres foi chocante. E também não houve coragem de se lhe perguntar o que é que ele pensava de Estaline... Mas era uma questão de opiniões e o incidente ficou-se - e bem! - por aí: tratara-se de uma escolha assaz infeliz da TVI (e da TSF). Tanto assim que, de então para cá, já houve ocasião para que os habitués do "Governo Sombra" se desforrassem de um convidado que desconfio tenha sido pouco empático (veja-se o vídeo abaixo). Se me perguntassem agora que reservas teria para um programa com Mário Machado como convidado, seriam as mesmas que dispensara ao com Arnaldo Matos. Tudo o resto me pareceu comparável embora não tenha assistido inicialmente ao segundo. Só que a ressonância nas redes sociais se veio a revelar incomparável. Há um enorme e (para mim) incompreensível contraste entre aquilo que (não) aconteceu há um ano com Arnaldo Matos e o que está a acontecer agora por causa de Mário Machado: há um arrepiante clamor histérico, uma tal incongruência e uma tal dualidade de critérios que, pelo fanatismo e pela irracionalidade, me chocam mais do que todos os disparates que os dois radicais possam proferir. Sejamos claros: eu concordo com quase todos os que criticam Mário Machado e pelo que lhe criticam. Mas, mais do que a ressurgência do fascismo, assusta-me a veemência com que tantos se sentem na obrigação de, neste caso, se manifestarem e nos termos em que o fazem, quando nos outros se demitem de se manifestar. Quero aproveitar todo este barulho para destacar a insuportabilidade do silêncio no passado.
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