02 janeiro 2019

MUDAM-SE OS TEMPOS, MUDAM-SE AS VONTADES

Há uns precisos (e preciosos) quarenta anos a separar os dois textos supra. O antifascista João Espada, que vemos como impulsionador de uma «comissão para a defesa da liberdade de informação» (em 1979) tornou-se, com os anos, num imensamente diferente João (Carlos) Espada, «conversador civilizado» e «re-descobridor das boas tradições demo-liberais» (para 2019). Confesso que, quando a canção de José Mário Branco se tornou um hit na sequência imediata do 25 de Abril (1974), não me apercebi então de como era perene e profundo o ensinamento contido no soneto de Camões, e de como seria capaz de se vir a virar no futuro com mordacidade revolucionária contra tantos dos revolucionários daquela altura...

Adenda: Uma das maneiras mais clássicas como se tenta por vezes baralhar a discussão a respeito das grandes circunvoluções político-filosóficas, como é o caso da protagonizada acima por João (Carlos) Espada, é misturá-las com os tradicionais taticismos da política, de que fui recuperar um exemplo acabado de ocorrer, a inflexão do antigo candidato presidencial americano Mitt Romney a respeito de Donald Trump, depois de dois anos da presidência deste. Não tem nada a ver. Espada era, em 1979, um comunista, a queixar-se (cinicamente) de uma falta de liberdade que só as Democracias lhes concediam. Está a queixar-se de algo que lhe concediam mas que ele não fazia tenção de manter caso ele e os seus alcançassem o poder.
Mas foi preciso ter mudado todos os alicerces filosóficos das suas convicções políticas para que ele viesse a defender tudo o que agora o vemos defender politicamente - o Churchill que hoje Espada tanto gosta de citar não era(é) propriamente um autor favorito entre os marxistas-leninistas como Espada era... Enquanto Romney deu apenas "corda" a Trump até à altura em que considerou que este se "espetou" para além de qualquer possibilidade de recuperação política para então se dissociar. Não é bonito, mas Romney não deixou de ser quem era. Espada sim. Pode alguém ser quem não é?

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