21 setembro 2013

SETEMBRO DE 2013

Ao contrário das outras, acredito que as opiniões sérias e sobre assuntos sérios devem reflectir a evolução das circunstâncias. Por exemplo, se me imaginar com o mesmo esclarecimento mas tendo nascido duas gerações antes, estou convencido que teria sido inicialmente um apaziguador na década de 30 e procuraria arranjar explicações que acomodassem o expansionismo alemão. Ao contrário de Winston Churchill, que a História transformou num visionário que compreendeu desde sempre as intenções de Adolf Hitler, também a maioria das pessoas razoáveis – como, por exemplo, Anthony Eden – não apoiaram de início uma atitude hostil que facilmente poderia desembocar numa nova Guerra Mundial por causa da anexação da Áustria. O preço a pagar teria sido muito alto, tratava-se de uma decisão que não se tomava de ânimo leve. Essa opinião, a de que a Alemanha só podia ser travada pela força das armas, só se veio a robustecer progressivamente quando a Alemanha anexou os Sudetas, depois destruiu e ocupou a Checoslováquia até se tornar praticamente consensual quando Hitler se preparou para fazer o mesmo à Polónia em Setembro de 1939.
Dois anos (1938 e 1939) puderam representar muito tempo e muitas transformações no cenário europeu. Ou então esse mesmo período de tempo pode não representar nada, especialmente quando se está à espera que alguma coisa mude nesse cenário, como tem vindo acontecer com os portugueses de há dois anos para cá (2011-2013). Quando se olha para um gráfico mostrando a evolução das yields da dívida pública portuguesa a 10 anos (acima) apercebemo-nos que as taxas actualmente praticadas equivalem àquelas que eram praticadas há dois anos e meio atrás, em Março de 2011, antes do chumbo do PEC IV. Nesta perspectiva exclusivamente financeira, que os actores políticos nos dizem ser muito importante, a do regresso aos mercados, é como se estivéssemos de regresso à casa partida do Monopólio, só que não se recebem os 2.000$... Em todas as outras perspectivas porém, a económica e sobretudo a social, a sociedade portuguesa da actualidade já não tem nada de semelhante com a que existia há dois anos e meio. Há recessão, há muito mais desemprego e sobretudo, não há expectativas nem disposição para mais sacrifícios conhecendo-se os resultados alcançados e a iniquidade desses sacrifícios.
Este mês de Setembro de 2013 é um mês excelente para avaliações das políticas que foram prosseguidas até aqui pelo governo saído das eleições de Junho de 2011. Que foram um fiasco: de acordo com o próprio calendário governamental, seria o mês em que Portugal retornaria aos mercados, financiando-se autonomamente. Mais do que isso, podiam ter sido um fiasco apenas na execução mas foram-no não apenas aí mas também na avaliação da antecipação e repercussão das suas consequências, como se economia e finanças fossem um navio à deriva, sem timoneiro, com o ministro das Finanças a ser objecto do anedotário nacional – uma das raras instituições que pareceu não ter sido afectada pela crise – por causa dos seus falhanços encadeados. Defensivamente, o governo costuma argumentar que não havia alternativa ao caminho percorrido, o que até nem é verdade: o que sempre faltou às políticas alternativas foi razoabilidade e o que nos faltou a nós foi o desespero para as encarar seriamente. Desespero esse que, como a desconfiança com as intenções de Adolf Hitler referidas mais acima, se está a robustecer com o passar dos meses sem que se veja saída para a situação.
Setembro de 2013 é também o mês das eleições gerais na Alemanha que políticos consagrados como Luís Amado anteciparam que virá modificar o comportamento daquela em relação à Europa. As eleições ainda não tiveram lugar e as expectativas sobre o impacto das referidas eleições nas estruturas europeias já foram substancialmente rebaixadas. A Alemanha não se vai mostrar mais solidária, as instituições europeias tão pouco, a honra (sic) que Portugal obteria da nacionalidade do presidente da Comissão também não nos vai valer de grande coisa. Como se não bastassem os económicos e sociais, parece-me ter-se gerado na sociedade portuguesa um problema anímico, o cansaço de uma geração que dedicou todas as suas energias a um projecto político que agora, em tempos de verdadeira necessidade, se revela uma fraude. O cartaz acima, por exemplo, com um Soares exultante, pode ser agora apreciado ironicamente perguntando-lhe: Conseguimos o quê?... É perante estes cenários antagónicos que se esperaria que a política portuguesa estivesse a ser disputada por protagonistas defendendo causas distintas e fracturantes (abaixo)… mas não. No PSD e no PS é-se pró-Europeu por definição e se alguma os distingue é onde de um lado se pede 4,5%, do outro pede-se mais 0,5%
Paradoxalmente onde poderemos encontrar essa dicotomia nas soluções como ultrapassar o marasmo político-económico-financeiro que nos envolve, parece ser entre os economistas de vulto que nos visitam. Não professores euro-bambos como Wolfgang Münchau. Economistas a sério como Nouriel Rubini e Dani Rodrik. Enquanto o primeiro se mostra mais reformista, preconizando que nos batamos pela flexibilização das metas do deficit, o segundo mostra-se mais revolucionário, preconizando uma eventual saída de Portugal do Euro, para contornar um muito longo e muito lento período de recuperação da nossa economia que é antecipado por qualquer deles dois. Esta sugestão do abandono do Euro não é nova, já foi defendida por vários economistas, nomeadamente em livro (abaixo) por João Ferreira do Amaral. O grande problema da opção é que, como após uma declaração de guerra, ninguém tem a ideia do que pode vir a acontecer em consequência dela. O livro peca por isso, quando tenta convencer-nos do contrário: que se pode tentar gerir com segurança todos os múltiplos aspectos da fase de transição entre moedas. Seja como for, o fracasso das opções canónicas (troika) impostas até aqui e os constrangimentos que elas impõem para o futuro tornam implicitamente estas opções mais radicais mais atraentes.
Provavelmente, para que essas opções venham a ter capacidade de aceitação, terão que ser apresentadas de uma forma muito mais emocional do que o faz Ferreira do Amaral. Como Churchill, para regressar ao exemplo do início deste poste, que antecipando a fase mais dura, a do isolamento do Reino Unido durante a Guerra e em vez de minimizar os sacrifícios, apenas prometeu sangue, trabalho, lágrimas e suor, também o nosso eventual abandono do Euro poderia ser embrulhado num reavivamento de um nacionalismo que, não esqueçamos, já teve slogans como orgulhosamente sós… Tenho que reconhecer que, aquilo que me parecia, quando aquele livro foi publicado, que não passaria de uma ideia peregrina de alguns economistas mais arrojados e sem hipóteses de concretização pode estar, por força das circunstâncias e com a bênção de nomes como Dani Rodrik, a fazer o seu caminho de se transformar numa opção política a levar a sério. Não sei é se no PSD e no PS já deram por isso…

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