10 setembro 2010

VALENTINA TERESHKOVA E A GAIVOTA

Em Junho de 1963, Valentina Tereshkova (acima) foi apresentada ao Mundo como a primeira cosmonauta da história da exploração espacial. A questão do género dos tripulantes ainda não se colocara verdadeiramente em termos científicos na exploração espacial¹, mas o feito soviético revelou-se mais uma espectacular proeza em termos de relações públicas, no período mais quente da Corrida Espacial. De regresso à Terra, Valentina tornou-se um ícone, coberta de honrarias, uma comunista exemplar: em 1966 passou a fazer parte do Soviete Supremo da União Soviética, do próprio Presidium desse órgão de 1974 a 1989, além de integrar o Comité Central do Partido Comunista de 1969 até ao fim (1991).
É neste quadro de solidariedade proletária e ainda nos ecos do seu voo lendário de 12 anos antes que Valentina Tereshkova é convidada a visitar Portugal em Junho de 1975, no apogeu do PREC, a convite, não directamente do PCP, mas duma das organizações que orbitavam à sua volta (passe a metáfora astronáutica...), o MDM (Movimento Democrático de Mulheres). A operação de charme, cuidadosamente encenada, inclui um grandioso comité de acolhimento no aeroporto e reflectidas palavras de circunstância proferidas na ocasião pela heroína do cosmos: Os sovietes seguem atentamente e com amor o processo revolucionário português e desejam o maior êxito a este povo na construção do novo Portugal.
Dois dias depois, foi a consagração popular no Pavilhão dos Desportos. Com a presença de Álvaro Cunhal, Maria Lamas e de uma delegação do MFA, a convidada disse mais umas banalidades, mas a revelação do carácter especificamente pimba do nosso processo revolucionário estava reservada para o final da sessão quando se descobriu que, durante o seu voo histórico, Valentina recebera como nome de chamada Tchaika (Чайка)– Gaivota... Isso foi pretexto para que a assistência ao comício a quisesse brindar com o grande êxito musical do momento, a Gaivota voava, voava (abaixo), numa demonstração da supremacia dos laços de amizade do foleirismo proletário sobre o carácter científico do marxismo-leninismo...
¹ A prová-lo, a próxima cosmonauta no espaço, também soviética, só realizou o seu voo em 1982, dezanove anos depois do de Tereshkova.

1 comentário:

  1. Bonita canção... na versão revista:
    "Uma gaivota/voava, voava/f.d.p. nunca mais se cansava."

    ResponderEliminar