09 setembro 2016

OS AVÓS E OS NETOS

Reconheça-se que há uma estranha semelhança entre aqueles clubes que se professavam do mais dogmático «marxismo-leninismo» nas décadas de 60 e 70 e estes blogues colectivos que se professam do mais desbragado «liberalismo» nestas duas primeiras décadas do século XXI. Claro que não me estou a referir à ideologia, mas isso também será o menos nestes fenómenos das modas intelectuais que o distanciamento nos mostra aparecerem em ciclos que cada geração que os vive considera serem pioneiros.
 
Os clubes dos avozinhos pretendiam passar-se por organizações políticas e até mesmo por partidos políticos, razão pela qual adoptavam siglas para se designarem, conforme se pode ver na metade superiora do quadro acima. O conhecimento detalhado de quem se designou por o quê e o que quis dizer aquela sigla pode ser fundamento, dada a complexidade, para a criação actual de uma cadeira num mestrado de Ciência Política. E porque os egos eram grandes, às vezes perdia-se o espaço para a coexistência e ocorriam grandes rupturas, pretexto para se dar livre curso à invectiva política, que essa sim, foi um contributo muito próprio para a literatura portuguesa dos finais do século XX, ele era o renegado Vilar, ele era a linha negra do traidor Saldanha Sanches.
 
Os blogues dos netinhos são mais civilizados. Quanto há dissidências (quem esquece a tragédia d'A Coluna Infame*, por ocasião do abandono de João Pereira Coutinho?...) elas são igualmente dramáticas mas mais urbanas. É uma consequência da evolução dos comportamentos dessa mesma elite urbana que produziu uns e produz agora estes outros. Passou a haver muito mais filhos únicos e as crianças tornaram-se mais egoístas. Os jovens pensadores preferem agora agrupar-se em espaços virtuais da internet a que dão nomes esotéricos e onde o colectivo do comunicado do comité central e da produção teórica de outrora - «liberalismo» oblige! - foi substituído por postes assinados individualmente, onde a competição pelo tremendismo é acirrada, roçando o nonsense.
 
Quanto maior é o tremendismo e quanto mais veementes são as profissões de fé à ideologia liberal, que, como outrora o «marxismo-leninismo», se bissecta em ideólogos (economistas) que o tempo se encarregará de valorar, maior é a segurança de não as levar a sério, imaginando aquelas outras que também conheci há uns 40 a 45 anos, de gente que agora passa por tão assisada, de acordo com o siso deste nosso tempo. Já ter visto este filme permite-me preconizar com grande segurança que dentro de uns 25 anos a esmagadora maioria de todos estes liberais estarão a ser outra coisa qualquer. É quase da natureza das coisas ser-se ou ter-se sido assim, assim como é da natureza das coisas irritar-se quem o foi ou quem o está a ser, quando isso é mencionado.
 
* A Coluna Infame (a seta central do quadro de baixo), é o blogue pioneiro e patriarca de todos os blogues liberais da blogosfera portuguesa. Era muito bem escrito. Vale a pena relê-lo, treze anos depois do seu encerramento.

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