12 de Outubro de 1968. Há cinquenta anos, a Espanha concedia a independência à sua pequena colónia da Guiné Equatorial. A relação histórica da Espanha com a África subsaariana fora apenas um acidente e, por acaso, da nossa responsabilidade, portugueses, quando, em 1778, lhes havíamos dado uns territórios naquelas paragens à troca de outros na América do Sul. Numa das fotografias da cerimónia podemos ver os altos responsáveis espanhóis paramentados com aquelas fardas claras e bandas atravessadas no peito, que se tornaram tão simbólicas da Espanha franquista e dos regimes ditatoriais latino-americanos. Do outro lado, as novas elites, mais escuras, tanto nos fatos como na cor da pele, parecem muito compenetradas com a solenidade do momento. A presença dos primeiros torna-se depois discreta na fotografia que exibe a tribuna de honra, onde apenas se nota a presença de Manuel Fraga Iribarne, o ministro da obscura pasta da Informação e Turismo, que ficou encarregue de representar Espanha nas cerimónias.
Todo o processo de transferência desse frete é eloquente do que a Espanha franquista pensava da Guiné Equatorial e da importância da descolonização daquele novo país: descartada - evidentemente! - a possibilidade da presença do próprio generalíssimo Francisco Franco na cerimónia, a representação de Espanha competiria na ordem protocolar de precedências ao chefe de governo, o almirante Carrero Blanco, que se descartou transferindo a função para o seu ministro dos Assuntos Exteriores, Fernando María Castiella, que arranjou qualquer coisa urgentíssima para fazer em Washington DC precisamente nessa altura. Quando a música desse jogo das cadeiras parou, foi Manuel Fraga Iribarne que não se conseguiu sentar, e é assim que o temos a dar a cara pela Espanha franquista na entrega do poder ao futuro ditador Francisco Macías Nguema. Quanto à (mitigada) ressonância que o acontecimento teve então entre os espanhóis, vale a pena apreciar a primeira página de um dos jornais franquistas desse dia 12 de Outubro de 1968 - o Pueblo - em que a proclamação sobre o Dia Histórico que se viveria não aparece muito sustentada em palavras; em contraste e em imagens, a foto que o jornal escolhe para destaque é a de Franco - que, recorde-se, não quisera ir à Guiné - a cortar umas fitas de uns novos acessos a Madrid, bem ao jeito das cerimónias que por cá nós tão bem conhecíamos quando protagonizadas pelo presidente Américo Thomaz.
A propósito e cá por Portugal, na reacção a um gesto que não podia deixar de ser lido pela comunidade internacional como uma brecha na solidariedade ibérica (se até os espanhóis concedem a independência às suas colónias, porque é que os portugueses persistem em recusar-se a falar sequer do assunto?), o enfâse da notícia era dado ao facto de que uma guarnição militar de 3.500 homens permaneceria no país.
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